São Paulo, quarta, 30 de dezembro de 1998

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ARTIGO
Envelhecimento populacional no mundo


AYRES DA CUNHA
² Em 1991, a Organização das Nações Unidas lançou a Carta de Princípios para as Pessoas Idosas. preocupada com o crescimento rápido da população de terceira idade no mundo, a entidade alertava no documento para a necessidade de as sociedades se prepararem para o envelhecimento da população. Antecipadamente, também determinava que 1999 fosse o Ano Internacional do Idoso. Passaram-se quase oito anos desde então, e a pergunta é a seguinte: alguém está fazendo alguma coisa em relação ao assunto?
O envelhecimento populacional é uma questão mundial. Com a queda nos índices de natalidade e o aumento da expectativa de vida na maioria dos países, o tema já está se transformando em motivo de alarme nas nações mais desenvolvidas. Especialistas prevêem para breve o surgimento de estruturas sociais distorcidas. Isso significa sociedades com um grande número de idosos e uma quantidade insuficiente de jovens trabalhadores para mantê-los.
No Brasil, o envelhecimento também deve ser discutido e analisado com cautela. Em 2025, seremos o sexto país com a maior população idosa do mundo. Os efeitos dessa transformação social afetam dos programas de assistência médica ao sistema de ensino, dos planos de pensões aos orçamentos públicos.
Dados do IBGE de 1992 revelam que cerca de 13 milhões de brasileiros têm idade acima de 65 anos e que a expectativa média de vida é de 67,3 anos. Até o início do próximo século, as previsões indicam que a população brasileira deverá aumentar cerca de 56%. Enquanto o grupo etário de 0 a 14 anos deverá crescer 14%, estima-se em 107% o aumento do grupo de indivíduos com 60 anos ou mais. Isso significa que, no ano 2000, teremos uma população idosa crescendo oito vezes mais que a jovem e aproximadamente o dobro da população geral.
O mesmo fenômeno é sentido na carne por países europeus, cidadãos norte-americanos, nações de Terceiro Mundo. Os exemplos se multiplicam. A Itália tornou-se recentemente o primeiro país em que o número de pessoas com mais de 60 anos é maior do que o de pessoas com menos de 20. Em pouco tempo, Alemanha, Grécia e Espanha devem cruzar a mesma linha. No ano passado, o índice de fertilidade (número de filhos de uma mulher) do Japão foi de 1,39%, o menor de todos os tempos. Nos Estados Unidos, onde as comunidades de imigrantes contribuem para manter o índice de natalidade alto, os números ficam um pouco abaixo da média de 2,1 crianças por mulher -o necessário para impedir apenas que a população comece a encolher.
Mesmo no mundo em desenvolvimento, onde a superpopulação ainda é uma agravante das carências, o índice de crescimento demográfico desacelerou-se em quase todos os países. Desde 1965, segundo dados demográficos das Nações Unidas, o índice de natalidade no Terceiro Mundo caiu pela metade, de seis filhos por mulher para três. Só na América Latina, ele passou de 40 nascimentos por mil habitantes, na década de 50, para cerca de 30 nascimentos por mil habitantes, na década de 80.
Mas, como já se disse, a questão extrapola o campo da biologia e dos mecanismos assistenciais: ela é econômica, pois afeta também o sistema previdenciário.
Em 1935, quando a seguridade social norte-americana foi criada, a expectativa de vida era de 62 anos. Em 1965, quando foi lançado o Medicare, um seguro de saúde, ela já havia aumentado para 70 anos. Hoje, a expectativa de vida no país é de 76 anos.
Ressurge então a questão da aposentadoria, muitas vezes tomada como sinônimo de condenação de uma pessoa operosa à ociosidade. Em 1997, a seguridade social norte-americana custou 4% do PIB, montante que se eleva a 8% se incluídos os orçamentos do Medicare e do Medicaid. Mantidas as políticas atuais, essa proporção será de 13% do PIB em 2020, com crescimento de 63%, segundo estudos do Congresso norte-americano.
Voltando ao Brasil, é possível identificar, ao lado dos problemas estruturais causados pelo envelhecimento populacional, um outro fenômeno: a organização de pessoas mais velhas em grupos e escolas, com energia e disposição para cuidar-se, divertir-se e continuar produzindo.
A imagem da velhice no país, frequentemente associada a perdas, doenças e filas no INSS, está dando espaço, ainda que de forma tímida, a iniciativas do governo e de entidades para a criação de clubes, associações, cursos e serviços para a terceira idade. Os idosos hoje procuram exercer mais a sua cidadania. E estão crescendo em número.
Tudo isso nos faz chegar a algumas conclusões. A mais importante delas talvez seja mesmo a de que, se começarmos agora a trabalhar seriamente com a questão do envelhecimento populacional, temos grandes chances de contribuir para que as gerações futuras possam ter uma velhice mais saudável. Lembrar que nós seremos os velhos de amanhã pode ser um incentivo para que trabalhemos com mais afinco na questão. Além, é claro, de tomar como mote o fato de que 1999 será o Ano Internacional do Idoso.
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Ayres da Cunha, 60, médico, é deputado federal (PFL-SP) e presidente da Blue Life AssistênciaMédica.



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