Ministro se diz otimista em relação a uma aprovação rápida pelo Congresso, apesar de calendário apertado

"Poupança" também terá a função de reserva para impedir a retração da economia em tempos de crise, afirma Mantega

Lula Marques - 29.mai.08/Folha Imagem

ENTREVISTA EM NOVO ESTILO
Guido Mantega (Fazenda) fala a jornalistas no ministério, em Brasília; agora, marca no chão indica onde o ministro deve permanecer nas entrevistas e suporte o protege de microfones

DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou ontem a elevação da meta de superávit primário do governo de 3,8% do PIB (Produto Interno Bruto) ao ano para 4,3%, como a Folha já havia antecipado há duas semanas.
A economia adicional de cerca de R$ 13 bilhões alimentará o chamado Fundo Soberano do Brasil, que, segundo Mantega, em sua última versão, tem como principal objetivo ajudar a segurar a crescente inflação.
"A elevação dos preços é um fenômeno mundial, devido aos alimentos. Temos uma inflação menor que a de outros países, porém é preciso garantir que ela ficará sob controle. Essa é a prioridade do governo", afirmou Mantega, em São Paulo.
Em entrevista coletiva na qual formalizou a criação do fundo, Mantega disse que oficialmente a meta continua a mesma. Mas afirmou que, na prática, o aperto fica maior. "Vamos chamar o superávit de poupança: a poupança está passando de 3,8% para 4,3%. Quando o fundo for criado, contabilmente, o nome [dessa economia extra] será outro, não será superávit. O superávit já está correndo na faixa de 4,3% e vai seguir [nesse nível]", explicou. Segundo a Folha apurou, é essa a porcentagem que a administração Luiz Inácio Lula da Silva está considerando a partir de agora.
O superávit primário é o montante que sobra ao governo após o pagamento de suas despesas sem contar gastos com os juros da dívida pública.
Saindo de circulação, a parcela que fará parte do fundo é dinheiro que deixa de ser gasto, o que contribuiria para conter as pressões inflacionárias.
O projeto de lei que cria o fundo será enviado ao Congresso no começo da próxima semana. Se tramitar em regime de urgência urgentíssima, como quer o governo, o prazo para aprovação seria de 45 dias. Porém, ele dificilmente sai nesse tempo, porque em julho os congressistas entram em recesso. No segundo semestre, costumam se licenciar para as eleições municipais. E se não for aprovado? "Não acredito nessa possibilidade, vamos ser otimistas", disse Mantega.
Questionado sobre o nome do fundo, que não possui as características típicas de um fundo soberano, Mantega disse que cada nação estrutura o mecanismo de acordo com seus interesses. "Embora se chame fundo soberano em todo lugar, as finalidades e a maneira de operação são diferentes. Aqui no Brasil estamos fazendo um fundo híbrido, que tem atuação fiscal e anticíclica."
Enquanto isso, o superávit maior continua sendo feito de qualquer maneira. Em 2008, até abril, o governo obteve superávit nominal (após o pagamento dos juros da dívida) de 0,76% do PIB, ou R$ 6,8 bilhões, um feito inédito. "Se a economia for aumentando, o fundo também pode crescer, sem prejudicar os projetos prioritários do governo."

Poupança anticíclica
Além de contribuir no controle da inflação, diz Mantega, o fundo constituirá uma reserva da qual o governo lançará mão em momentos de crise para impedir uma retração forte da economia. "Trata-se de guardar nas vacas gordas para usar nas vacas magras."
Até lá, os recursos não ficam parados. Podem ser aplicados para adquirir títulos emitidos no exterior pelo BNDES, que empresta o dinheiro para empresas brasileiras.
Antes tido como propósito essencial do fundo, a compra de dólares para segurar a taxa de câmbio ficou relegada a segundo plano. "Isso pode ser feito oportunamente, quando necessário", afirmou o ministro da Fazenda.
Da mesma maneira, dependendo das circunstâncias, podem ser comprados títulos do governo no mercado interno. "Diminuiria a dívida em poder do público, ela ficaria com o fundo", esclareceu Mantega.