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OPINIÃO ECONÔMICA
Otimistas na balança
GESNER OLIVEIRA
Em uma semana rica em números macroeconômicos, o mercado se animou com as notícias sobre o balanço de pagamentos. O Banco Central passou a projetar uma diferença entre as exportações e as importações (ou o superávit na balança comercial) de US$ 7 bilhões neste ano e de US$ 9 bilhões em 2003. Por sua
vez, o déficit em conta corrente, resultante das contas de bens, serviços, rendas (juros e remessas de lucros e dividendos) e transferências
unilaterais, representou 3,2% do PIB nos 12 meses até julho deste
ano, contra 4,6% em 2001.
Os números da balança comercial superaram as expectativas
mais otimistas. Nos 12 meses até
julho, o superávit comercial chegou a US$ 6,4 bilhões. Mas é bom
não exagerar no otimismo. Esse
desempenho está associado a um
ritmo lento da economia -crescimento entre 1% e 2%, aquém do
previsto pela maioria dos analistas na virada do ano e depois de
uma depreciação do real diante
do dólar de mais de 25% em 2002,
já incluindo o mergulho dos últimos dias.
O desafio nos próximos anos será manter dentro de limites aceitáveis a necessidade de financiamento externo mesmo com a economia em crescimento entre 4% e
5%. Isso em um mundo repleto de
incertezas, no qual os fluxos de capitais estão sujeitos a fortes oscilações.
A atenção recai habitualmente
sobre a balança comercial que se
restringe aos bens tangíveis. Mas,
do ponto de vista do ingresso de
dólares, não há diferença entre
uma venda de aviões e a prestação
de serviços de engenharia civil no
exterior. É recomendável, portanto, analisar conjuntamente o comércio exterior de tangíveis e intangíveis (ou o saldo da balança
comercial de bens e serviços), especialmente porque os serviços tendem a se tornar cada vez mais importantes no comércio internacional.
A evolução do comércio de serviços também registrou melhor desempenho. As projeções do Banco
Central mostram uma queda do
déficit neste ano para US$ 6,1 bilhões, contra US$ 7,7 bilhões no
ano passado. Entre os principais
serviços que compõem o déficit
dessa conta, destacam-se os fretes
(US$ 3,0 bilhões no ano passado) e
as viagens internacionais (US$ 1,5
bilhão), além de outros, como royalties e licenças, aluguel de equipamentos, computação e informações.
A conta corrente contém ainda o
item de rendas, correspondente,
na nova metodologia de divulgação, à antiga conta de serviços de
fatores. Para essa rubrica, que inclui os juros pagos sobre a dívida
externa e os lucros e dividendos
que remuneram o capital estrangeiro que opera no país, o Banco
Central projeta uma ligeira queda
do déficit de US$ 19,8 bilhões no
ano passado para US$ 19,4 bilhões
neste ano.
O quarto e último componente
da conta corrente são as transferências unilaterais, incluindo as
remessas de brasileiros que vivem
no exterior, bem como eventuais
doações de outros países, sem contrapartida de bens e serviços. O resultado líquido dessa conta poderá aumentar de US$ 1,7 bilhão em
2001 para US$ 2,2 bilhões neste
ano.
Das quatro contas já destacadas, a política econômica tem
maior influência sobre o comportamento dos bens e serviços. As
rendas enviadas ao exterior dependem do estoque de dívida do
país que tem sua própria inércia e
de decisões de investidores estrangeiros. As transferências unilaterais têm peso limitado e não costumam variar significativamente
no curto prazo.
Em termos absolutos, o déficit
em conta corrente de 3,2% do PIB
corresponde a US$ 16,7 bilhões,
valor financiado atualmente pelo
fluxo de investimentos diretos estrangeiros, de US$ 20 bilhões no
mesmo período. O Banco Central
projeta um déficit em conta corrente em 3,14% do PIB no final do
ano, declinando para 2,67% já em
2003, abaixo do nível que o mercado espera para 2006.
As expectativas do mercado
também apontam para a possibilidade de novas reduções do déficit em conta corrente nos próximos anos, mesmo sem mudança
da política econômica. O quadro
mostra que a projeção média de
mercado, coletada pelo Banco
Central, é de queda da razão entre
o déficit em conta corrente e o PIB
para um patamar de 2,9% em
2006. Essa projeção foi obtida antes da divulgação dos dados de julho, devendo sofrer revisões para
valores ainda mais baixos nos
próximos dias.
A diminuição da dependência
externa do país não vai ocorrer da
noite para o dia. Para conciliar
bom desempenho do balanço de
pagamentos com crescimento sustentado, será necessário mais do
que aquilo que já foi obtido. Daí a
importância de um salto nas exportações e de uma virada no
atual déficit de serviços mediante,
por exemplo, o aumento da receita de contas como as de turismo e
de transporte internacional, entre
outras. Há, portanto, muito o que
fazer antes de celebrar uma redução do constrangimento externo.
Gesner Oliveira, 46, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-Eaesp, consultor
da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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