São Paulo, domingo, 31 de outubro de 2004

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RECEITA ORTODOXA

Integrantes de administrações passadas dizem que gasto baixo atrapalha crescimento e reclamam dos juros

Ex-ministros criticam pouco investimento; Tesouro vê "desafio"

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os investimentos públicos foram o "patinho feio" de mais de 20 anos de história econômica do país, concluiu o secretário do Tesouro, Joaquim Levy, em coro com outros economistas ouvidos pela Folha e que ocuparam posições de destaque nessa história.
"Os investimentos foram esmagados, pagaram a conta, são o patinho feio", resumiu Levy na sexta-feira sobre os resultados do levantamento feito pelo Tesouro. "O retrato mostra o tamanho do desafio", completou o secretário.
Principal arquiteto do aumento da meta de superávit primário (economia de gastos destinada ao pagamento de juros), ele acredita que o caminho do governo Lula é melhorar a qualidade dos gastos de investimento, "um enorme esforço de fazer mais com menos".
Se os investimentos são o "patinho feio", os pagamentos de aposentadorias e pensões são, para Levy, o elefante no meio da sala das contas públicas. "As pressões que vão se refletir no aumento dos tributos partem não dos juros, mas de despesas primárias, sobretudo o pagamento de benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social)", avaliou.
Para o comandante da economia nos governos militares, Delfim Netto, o retrato de compressão dos investimentos públicos mostrado pelo Tesouro é "um escândalo, que lamentavelmente reflete uma realidade que dificulta terrivelmente o nosso crescimento". Deputado pelo PP, Delfim foi ministro da Fazenda entre 1967 e 1974, época do "milagre econômico", quando o Brasil registrou taxas recordes de crescimento. Nos primeiros anos da série produzida pelo Tesouro Nacional, já no governo João Figueiredo, ele ocupou o Ministério do Planejamento, quando a inflação disparava.
Em março de 1987, a inflação disparava novamente quando Luiz Carlos Bresser-Pereira assumiu o Ministério da Fazenda no governo Sarney. Ele deu nome ao segundo plano de congelamento de preços no período.
Crítico da política econômica desde os primeiros anos do governo Fernando Henrique Cardoso, quando comandava o Ministério da Administração, Bresser avalia que o levantamento do Tesouro, ainda que sujeito a distorções, é um retrato do tamanho da crise que o país vive. "Os juros são escandalosos, e os investimentos são uma penúria", disse.
Ministro do Planejamento durante os dez anos que antecederam a série do Tesouro, o economista João Paulo dos Reis Velloso, diretor do Inae (Instituto Nacional de Altos Estudos), chama a atenção para o fato de o aumento "impressionante" da arrecadação de tributos no período não contribuir para o desenvolvimento. "Os investimentos são irrelevantes", disse. Reduzir outros gastos seria a saída. (MARTA SALOMON)


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