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BENJAMIN STEINBRUCH
Que Deus proteja o Brasil!
Escolhido pelos grotões, Lula
tem obrigação de exigir do BC juros em sintonia com os de outros países emergentes
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HÁ QUATRO anos, quando Lula foi eleito presidente,
transmiti esperança neste
espaço. Lembrei que o Brasil precisava entender as mensagens das urnas, que haviam levado pela primeira vez ao posto mais alto da nação
um retirante nordestino, ex-vendedor de amendoins e ex-engraxate
no porto de Santos, que havia sofrido na pele o drama da desigualdade
brasileira e havia conquistado seu
espaço com trabalho político que
começou sectário e depois adquiriu
virtudes da tolerância e do diálogo.
A esperança tinha uma razão de
ser. Representante da elite operária, Lula poderia encarnar com
mais facilidade os dois principais
anseios nacionais, do desenvolvimento e da melhoria das condições
sociais. Eleito com apoio maciço
das classes médias, o ex-líder sindical abandonara posições radicais do
passado e parecia muito mais identificado com o setor produtivo do
que com o financeiro.
Quatro anos se passaram e Lula
está reeleito para mais um mandato. Só que agora, com seus 58 milhões de votos, ele não tem mais
apoio tão amplo das classes médias.
Sua responsabilidade é muito
maior do que em 2002, porque são
os grotões que depositam maior esperança na figura do presidente.
Em seu primeiro mandato, Lula
foi bem-sucedido em algumas áreas
e decepcionou em outras. O sucesso
deu-se nas ações de inclusão social
nas regiões pobres, exatamente de
onde o presidente tirou mais votos
para a reeleição. A decepção, muito
martelada na campanha eleitoral
da oposição, deu-se na adoção de
políticas conservadoras que mantiveram o país em semi-estagnação
durante quase todo o último quadriênio. Decepção veio também da
gestão da coisa pública, estampada
nos vários casos de corrupção cuja
apuração precisa continuar para a
punição de culpados.
Nesse aspecto, a mensagem das
urnas é que a população, embora
alertada pelo persistente discurso
da oposição durante a campanha
eleitoral, decidiu relevar os problemas da ética e da corrupção. É possível supor que o eleitor considerou
que Lula, sobre o qual não pesa até
agora responsabilidade direta nos
escândalos, mesmo abalado pelas
denúncias, terá ainda mais condições do que seu oponente para
atender aos anseios de inclusão social e de desenvolvimento econômico.
Aí está, portanto, a razão da
maior responsabilidade do presidente no segundo mandato. Os programas sociais do primeiro foram
importantes porque atenderam às
necessidades básicas de 11 milhões
de famílias e tiraram da pobreza extrema milhões de pessoas. Agora, o
desafio será começar a incluir esses
brasileiros entre os cidadãos de verdade, não apenas com subsídios e
ajuda emergencial (Bolsa Família)
do governo mas também com emprego e renda para que eles possam
sustentar suas famílias por meio do
próprio trabalho.
Essa transformação só virá se Lula tiver, em seu segundo mandato,
uma obstinação que não teve no
primeiro: a de adotar uma política
claramente desenvolvimentista,
para incluir o Brasil entre os emergentes cuja economia mais cresce
no mundo.
Os investimentos em educação,
saúde, habitação e infra-estrutura
geral não podem mais continuar relegados a segundo plano, enquanto
por capricho ortodoxo mais de R$
150 bilhões são gastos por ano para
cobrir encargos da dívida pública.
O Lula escolhido pelos grotões
tem a obrigação de exigir do Banco
Central uma política para colocar
os juros internos em sintonia com os
de outros países emergentes. Não
podemos continuar com as taxas
reais mais altas do mundo, criando
despesas para o governo e receitas
para o setor financeiro. Todo o esforço para a produção de superávits
primários, que têm girado em torno
de 4,2% do PIB, está indo para o lixo,
porque nenhum centavo desse superávit tem sustentado investimentos públicos. Tudo é direcionado para pagar os custos de uma política de
juros equivocada.
De qualquer forma, por mais que
estejamos decepcionados e aborrecidos com episódios de corrupção e
atentados à ética, por mais que tenhamos nos frustrado com a falta de
garra para promover desenvolvimento econômico, temos a obrigação cívica de trabalhar pela governabilidade deste país de todos nós. Que
Deus proteja o Brasil.
BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do
conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de
São Paulo).
bvictoria@psi.com.br
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