São Paulo, terça-feira, 31 de outubro de 2006

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Ação pró-diversidade foca em educação

Proporção de mulheres em posição de gerência aumenta, mas participação de negros em cargos de chefia muda pouco

Empresas ainda resistem a informar a quantidade de afrodescendentes em seus quadros até na publicação de seus balanços sociais

JULIANA GARÇON
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um número crescente de grandes empresas, especialmente subsidiárias de multinacionais, está adotando ações afirmativas -a principal aposta é em incentivos à capacitação- para ampliar a diversidade racial e de gênero em seus quadros. Os resultados, porém, ainda são pouco visíveis.
Pesquisa do Instituto Ethos e do Ibope, realizada no segundo semestre de 2005 com 119 das 500 maiores empresas do Brasil e publicada neste ano, aponta o "afunilamento hierárquico" para mulheres e negros -há menos indivíduos desses grupos quanto mais alta é a instância do poder.
Em comparação com 2003, a presença delas subiu de 18% para 31% em cargos de gerência e de 6% para 9% nos níveis executivos. As mulheres representam 42,7% da população economicamente ativa do país.
Os negros, que compõem 46% dos trabalhadores, continuam com a mesma fatia de cargos de gerência (alta de 8,8% para 9%) e quase a mesma em posições executivas (de 1,8% para 3,4%). Mas 24% das empresas se abstiveram de dar informações sobre a proporção de negros em posições funcionais, o que revela dificuldade em lidar com o tema.
O Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas), que tem um banco de dados com 1.200 balanços sociais, verificou que mais de 35% das empresas deixaram de responder à questão sobre o contingente de negros (em 2000, cerca de 70% fugiam do assunto). "E olha que esses números são divulgados por empresas que adotam a prática do balanço social e se dizem socialmente responsáveis", diz Claudia Mansur, coordenadora do Ibase.
"O problema não seria a cor, mas a falta de qualificação", avalia o analista de crédito Fabiano Wanderley de Miranda, 24, selecionado para um programa da multinacional DuPont no fim do colegial. "Fui escolhido pelo desempenho escolar e pela afrodescendência", conta o jovem, que se declara pardo. Fez estágio durante a faculdade, paga pela companhia. Formado, enfrentou o processo de seleção tradicional e foi contratado como analista de sistemas. Depois, conseguiu vaga na área financeira. "Ganho 12 vezes mais do que há seis anos."
A DuPont conseguiu elevar a população de negros em seu escritório central de 2% em 2002 para 7% hoje. "Há negros em posições iniciais de gerência", diz Regina Burt, diretora de RH. "É só uma questão de tempo para haver na diretoria."
A "pedra" que o jovem contornou foi mensurada no mês passado pelo Ipea: a média de estudos de brasileiros brancos é de 7,7 anos, contra 5,8 para os negros. Daí o foco em programas de qualificação para estimular a carreira de negros.
"A atenção para esse tema evoluiu em todo o Brasil, mas a questão ainda está muito no discurso e muito pouco na prática", afirma Mansur.
"O número de empresas preocupadas com o tema cresceu, mas poucas têm ações afirmativas e muitas alimentam práticas tradicionais no recrutamento", diz Oded Grajew, presidente do conselho executivo do Ethos. As multinacionais foram pioneiras nessa abordagem, diz Grajew, por influência das matrizes, principalmente nos EUA, onde essa agenda já foi estabelecida.

Na marra
O esforço para ampliar a diversidade nos quadros das empresas também surge como conseqüência de um puxão de orelha dos órgãos públicos.
O MPT criou, em 2002, uma coordenadoria para combater a discriminação no trabalho. Desde então, foram instaurados cerca de 2.000 representações e inquéritos sobre discriminações por raça, cor, gênero e idade. O MPT estima que 20.772 trabalhadores foram beneficiados. Como o aperto da fiscalização favoreceu a situação de pessoas com deficiência -a inserção desse grupo saiu de 3,5% (2003) para 13,6% (2005)-, a controvérsia sobre as cotas ganhou relevo.
Para Maria Tereza Leme Fleury, socióloga e professora da FEA-USP, o mecanismo não é a solução. "Introduzir uma política de cotas nas empresas brasileiras traria resultados limitados. É preciso alinhar a diversidade às demais políticas e à estratégia da empresa para que os resultados sejam positivos para todos."
É o caminho seguido na DuPont, conforme Burt: "Espelhando melhor a sociedade, conseguimos entendê-la e atendê-la melhor".


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