São Paulo, terça-feira, 31 de dezembro de 2002

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ENERGIA

Físico diz que irá assumir Eletrobrás e alerta para risco de racionamento caso não sejam revistos compromissos com o FMI

País pode ter apagão em 2005, diz Pinguelli

Folha Imagem
O físico Luiz Pinguelli Rosa, que diz ter sido convidado e aceitado ser presidente da Eletrobrás


MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO

O físico Luiz Pinguelli Rosa, 60, diretor da Coppe (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia), da UFRJ, disse ontem que aceitou o convite para ser presidente da Eletrobrás.
A estatal não é uma empresa produtiva, mas uma holding financeira, que agrupa as estatais federais geradoras de energia (Furnas, Eletronorte, Eletronuclear e Chesf) e é vinculada ao Ministério das Minas e Energia. A escolha de Pinguelli foi feita pela futura ministra, Dilma Rousseff.
Pinguelli defendeu que sejam desvinculados os investimentos do setor elétrico estatal dos compromissos com o superávit primário, acordado com o FMI. Segundo ele, se isso não acontecer, poderá haver novos apagões no país a partir de 2005.
Pinguelli disse ainda que não teme trombar com a futura equipe econômica por causa disso. Leia a entrevista telefônica concedida ontem à Folha:

Folha - O senhor sempre foi um forte crítico da política do atual governo para o setor elétrico. Qual é a herança que o senhor recebe ao assumir a presidência da Eletrobrás?
Luiz Pinguelli Rosa -
No fundo, todo o setor elétrico sofreu muito com a equivocada política de privatização, que não deu o resultado prometido. O setor não expandiu, as tarifas subiram e a qualidade, obviamente, não melhorou, tanto que houve um colapso em 2001. Essa é a nossa herança e deve ser revertida.

Folha - O sistema Eletrobrás é responsável por 60% da geração de energia elétrica do país. Qual é a sua principal meta ao assumir a presidência da estatal?
Pinguelli -
Nós vamos trabalhar em comum acordo com o ministério. A equipe é coesa. No meu caso, a intenção é tornar a Eletrobrás uma empresa dinâmica, que articule as suas controladas e que promova investimentos, não só com recursos próprios, mas atraindo parcerias com o capital privado, dentro de uma política de expansão do setor, para que daqui a dois, três, quatro anos o Brasil não sofra um novo apagão.
É preciso também revitalizar o Cepel [Centro de Pesquisas da Eletrobrás], intensificar as parcerias com as universidades e institutos de pesquisa do exterior.

Folha - Há um estudo recente da Eletrobrás mostrando que até 2012 o país não sofre risco de racionamento...
Pinguelli -
Isso está errado. Não sei que estudo é esse. Nós podemos garantir apenas dois anos, provavelmente, sem risco de apagão. Daí em diante, não.

Folha - No programa de campanha do PT para o setor de energia, do qual o senhor foi um dos coordenadores, havia uma previsão de R$ 8 bilhões de investimentos por ano provenientes do caixa das empresas públicas de energia. Será possível alcançar essa meta em 2003?
Pinguelli -
Nós queremos chegar a essa meta, que é perfeitamente razoável pela receita do setor. Naturalmente, isso não quer dizer que possamos atingi-la em 2003, porque estamos pegando um Orçamento feito pelo governo anterior e uma dificuldade econômica gigantesca.
Agora, é preciso também que as obras dadas ao setor privado sejam feitas. Muitas concessões de termoelétricas e hidroelétricas estão andando, outras não.

Folha - Como expandir a oferta de energia, se as estatais também estão proibidas de investir em função do compromisso com o superávit primário?
Pinguelli -
Obviamente que isso é um problema que nos afeta muito. Na Eletrobrás, vai ser, talvez, uma das primeiras tarefas nossas. Ou seja, teremos que advogar para o setor elétrico o mesmo status que a Petrobras já conseguiu. Pode ser que em 2003 os fatos consumados e a enorme dívida acumulada não permitam resolver esse problema. Mas, certamente, em 2004, nós vamos fazer o possível para que seja resolvido. É preciso que o setor elétrico seja desembaraçado dessa restrição imposta pelo FMI, para investir e evitar os apagões em 2005.

Folha - Essa desvinculação com o superávit primário não pode levá-lo a trombar com a futura equipe econômica?
Pinguelli -
Não desejo nenhuma trombada com a equipe econômica do futuro governo, mas a nossa posição, e eu entendo que a da ministra Dilma também, é de permitir que o setor elétrico se expanda. Logicamente, isso vai levar a necessidade de renegociar metas de investimentos das empresas elétricas estatais. Acho que não se trata de trombada, mas apenas de uma discussão salutar. Se todos tivessem o mesmo gosto, ninguém comeria quiabo.

Folha - Como base no IGP-M, o Copom prevê um aumento de 30,3% nos preços da energia em 2003. O senhor defendeu durante a campanha que o novo governo convocasse todas as concessionárias para repactuar as tarifas. Como presidente da Eletrobrás, como pretende influir na política tarifária?
Pinguelli -
Esse é um assunto a cargo da [futura] ministra [das Minas e Energia] Dilma [Rousseff]. Pelo o que eu sei, ela já está em contato com o próprio ministro da Fazenda para uma redefinição da política tarifária, tanto para combustíveis quanto para energia elétrica. Naturalmente, nessa revisão temos que rediscutir o que possa ser repactuado, para que o consumidor não pague tudo.


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