São Paulo, domingo, 03 de fevereiro de 2002

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CONTRATAÇÃO AFIRMATIVA

Empresas despertam para o tema diversidade

Fernando Moraes/Folha Imagem
José Marcos de Oliveira,de origem humilde, foi tentar a sorte no Canadá e hoje é diretor da Norte


EDSON VALENTE
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O preconceito é inconstitucional, mas sua prática ainda persiste, mesmo que de um modo velado, no mercado de trabalho.
Muitas companhias, sobretudo multinacionais, estão mais atentas para evitar a discriminação e acenam com medidas em prol da diversidade de seus quadros, como fixar cotas para certos grupos ou priorizar a contratação de profissionais das chamadas "minorias" (como negros e deficientes).
Na opinião de Iêda Novais, 51, diretora-presidente da Mariaca & Associates, a fórmula das cotas é simplista. "Há um desequilíbrio educacional muito grande. Às minorias devem ser dadas condições mínimas de desenvolvimento de sua empregabilidade", afirma.
"O problema é mais complexo", diz Nelmara Arbex, gerente de gestão de conhecimento e relações internacionais do Instituto Ethos. "Envolve posição ética das empresas e cultura do país."
Arbex sustenta sua tese com números. De acordo com dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), realizada pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), só cerca de 17% dos empregados com escolaridade superior a 15 anos e que moram em áreas urbanas do país não são brancos.
Já uma pesquisa do Instituto Ethos, feita em parceria com o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), a OIT (Organização Internacional do Trabalho), a Unifem (Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher) e a FGV-Eaesp (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas), mostra que o percentual das minorias que chega aos altos cargos é mais reduzido: 6%.
Os dados, coletados em 89 grandes empresas, apontam maioria masculina e branca na direção.

Herança
Em um primeiro momento, nas seleções, as companhias buscam quem é tecnicamente melhor. "Mas os empates são resolvidos pela análise do "capital sociocultural'", explica Ricardo Bresler, 34, vice-coordenador dos cursos de graduação da FGV-Eaesp.
Assim, ganharia a vaga quem tivesse bons contatos e desenvoltura na exposição de idéias -perfil obtido, por exemplo, por herança familiar e formação, mais acessível às classes altas.
A presidente da Comissão do Negro e Assuntos Antidiscriminatórios da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Maria da Penha Guimarães, 55, concorda.
"Só as cotas não resolvem", diz ela. "Serviriam como uma política temporária de compensação. O verdadeiro problema começa já na estruturação das pré-escolas."
Casos pontuais mostram que mesmo quem não nasceu "em berço esplêndido" pode chegar à cúpula de empresas -que têm ou não essas ações afirmativas.
De origem humilde, José Marcos de Oliveira, 38, estudou em escola pública e, após começar filosofia na Universidade de São Paulo e engenharia química nas Faculdades Oswaldo Cruz, largou tudo para morar no Canadá.
Ele saiu com US$ 600 e disposição. Trabalhou em jardinagem e construção civil para pagar um curso de telecomunicações e hoje é diretor de vendas para contas estratégicas da Nortel. "Foi preciso conhecimento para contrapor o "estado de minoria" do negro."



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