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Neuro

SUZANA HERCULANO-HOUZEL - suzanahh@gmail.com

Institucionalizar, não!

Crianças que começam a vida em orfanatos mostram redução na massa cinzenta cortical do cérebro

Está certo que oferecer algum tratamento a crianças sem família deve ser melhor do que deixá-las abandonadas à própria sorte, sem nenhum tipo de apoio. Mas, como mostra um estudo publicado recentemente, o simples fato de receber cuidados de uma instituição não basta para assegurar à criança um desenvolvimento normal.

Estudos anteriores haviam comparado o desenvolvimento cerebral de crianças criadas inicialmente em orfanatos romenos e depois adotadas por famílias de outros países como EUA e Reino Unido com o de crianças nativas desses países e nunca adotadas. Os resultados eram inconclusivos: ora havia diferenças, ora não -talvez porque a comparação correta seria entre crianças romenas institucionalizadas e depois adotadas com outras crianças também romenas nunca institucionalizadas.

O estudo que faltava foi feito por Margaret Sheridan e seus colegas, do Hospital Infantil de Boston. O grupo examinou crianças romenas de cerca de oito anos que haviam sido institucionalizadas quando tinham entre seis e 31 meses de idade. Aos oito anos, algumas dessas crianças permaneciam no orfanato, enquanto outras haviam sido adotadas por famílias romenas por um total de uns seis anos, durante os quais receberam atenção individual de suas famílias, em vez de dividirem a atenção dos cuidadores do orfanato com cerca de outras 11 crianças.

Mas, em termos de desenvolvimento cerebral, pouco pareceu importar. O estudo mostrou um volume da substância cinzenta cortical, onde ficam os corpos dos neurônios, cerca de 10% menor nas crianças que foram institucionalizadas no começo da vida, não importa se depois foram adotadas ou não, em comparação com crianças criadas por suas próprias famílias desde o começo.

Uma redução semelhante acontece na substância branca cortical das crianças institucionalizadas -aquele conjunto de feixes que interligam zonas diferentes do córtex e fazem o cérebro funcionar como um todo integrado. De fato, o estudo mostrou que o amadurecimento funcional do córtex cerebral também fica para trás nas crianças institucionalizadas, mesmo que adotadas.

Está certo que há orfanatos e orfanatos -e os romenos não são conhecidos como particularmente bons. Mas fica a suspeita de que para crianças terem alguma chance de um desenvolvimento normal elas devem ser criadas desde sempre no seio de uma família, jamais em uma instituição.

SUZANA HERCULANO-HOUZEL é neurocientista, professora da UFRJ, autora do livro "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com

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