São Paulo, quinta-feira, 02 de abril de 2009
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NEUROCIÊNCIA

Suzana Herculano-Houzel

Primeiras impressões

Já deve ter acontecido com você: encontramos uma pessoa pela primeira vez e, imediatamente, "vamos com a cara dela" -ou, ao contrário, alarmes tocam sinalizando que devemos manter distância. Tais avaliações à primeira vista costumam ser surpreendentemente precisas e consistentes: uma vez soado, um alarme dificilmente se desliga, assim como uma primeira impressão positiva tende a se reafirmar.
Obra do cérebro, claro. Mas como ele pode tomar partido tão rapidamente? Além do mais, talvez você não se importe com a preguiça de um recém-conhecido se ele tiver outras qualidades, mas eu posso achar essa preguiça indesejável o suficiente a ponto de inviabilizar qualquer impressão positiva. Cada pessoa dá valor a características diferentes -mas o que pessoas diferentes têm em comum em sua maneira de fazer isso?
"A ativação de duas partes do cérebro" é a resposta do grupo da neurocientista Elizabeth Phelps, da Universidade Tufts, nos EUA. O grupo mostrou a voluntários várias listas de qualidades positivas e negativas que descrevem um desconhecido. Ao ver a lista, pessoas diferentes dão maior ou menor importância a qualidades diferentes -e, assim, umas formam uma primeira impressão positiva e outras, negativa do mesmo desconhecido. O que torna uma informação relevante para uns, mas irrelevante para os outros? Uma série de fatores relacionados a experiências prévias e valores pessoais, certamente.
Mas tudo isso deve convergir sobre o córtex cingulado posterior e a amígdala (do cérebro, não da garganta), ativados de modo consistente entre os voluntários quando eles formam suas primeiras impressões: quanto mais eles respondem a descrições positivas sobre um desconhecido, mais se gosta dele; quanto mais respondem a descrições negativas sobre a mesma pessoa, menos se gosta dela. Essas partes do cérebro, portanto, indicam a saliência de uma informação social -como um lembrete ao resto do cérebro que diz "isto é importante, leve em consideração!".
O mais interessante é que o cingulado posterior e a amígdala são estruturas que sabidamente fazem avaliações emocionais, muitas vezes inconscientes, e não racionais. Ou seja, com base em experiência prévia, eles formulam e dão sua opinião ao resto do cérebro -pouco importa se você acha aquilo racionalmente apropriado ou não. Resultado: gostamos ou desgostamos de alguém à primeira vista -e, então, ficamos tentando entender por quê...


SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora do livro "Fique de Bem com o Seu Cérebro" (ed. Sextante) e do blog "A Neurocientista de Plantão" ( www.suzanaherculanohouzel.com )

suzana.herculano-houzel@grupofolha.com.br



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