São Paulo, quinta-feira, 02 de agosto de 2001
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

foconele

Relembrar a vida melhora a
auto-estima

MIRNA FEITOZA - FREE-LANCE PARA A FOLHA


"À medida que o ser humano envelhece, ele precisa saber que sua vida teve algum significado, que não transcorreu em vão."


Aos 83 anos, James Birren já se aposentou três vezes, mas preferiu seguir a vida com o que mais gosta: aprender coisas novas com suas pesquisas. Em 1977, ele criou o método da autobiografia orientada, voltado para pessoas de meia e terceira idades. Professor da Universidade da Califórnia -onde é diretor associado do Centro de Estudos do Envelhecimento-, Birren é um dos mais renomados especialistas em envelhecimento da atualidade, com mais de 250 publicações sobre o assunto, entre livros e artigos. Nos últimos dias, o professor norte-americano esteve no Brasil pela primeira vez e deu palestras em São Paulo e no Rio de Janeiro sobre seu método, que já ajudou cerca de 900 pessoas a passar a vida a limpo.

Folha - O que é autobiografia orientada?
James Birren - É um método que ajuda as pessoas a recordar acontecimentos de suas vidas, organizando-os em uma autobiografia que pode ser usada em família ou de outras formas. O método tem por finalidade evocar e guiar a memória, levando os participantes a examinar suas lembranças a partir da perspectiva do presente.

Folha - Como funciona o método?
Birren - As pessoas discutem questões sobre temas básicos da vida, e essas questões evocam a memória delas. A cada semana, elas escrevem duas ou mais páginas sobre um tema, como família, trabalho, dinheiro, saúde, caminho espiritual. Depois, os grupos são divididos. Um de 25 pessoas, por exemplo, é dividido em grupos de cinco, e os participantes compartilham suas histórias.

Folha - Quais são os benefícios da autobiografia orientada?
Birren - Revisar ou relembrar a vida é um processo essencial à trajetória dos adultos idosos. À medida que o ser humano envelhece, ele precisa saber que sua vida teve algum significado, que não transcorreu em vão. O método aumenta a auto-estima por meio da autodescoberta e do reconhecimento de ter sobrevivido a milhares de problemas, e é preciso lembrar que a auto-estima é um dos elementos mais importantes para a longevidade humana. O método possui outros benefícios psicológicos e físicos explícitos: esclarece paradoxos, contradições e ambivalências da própria vida; restaura o sentido de auto-suficiência, a identidade pessoal e o bom humor; cria novos relacionamentos sociais duradouros; estimula a atividade mental; diminui a depressão; baixa a pressão; faz o coração bater menos acelerado.

Folha - Em que momento da vida a autobiografia é recomendada?
Birren - O método é usado por aposentados ou pessoas que estão para se aposentar. Em meus grupos, as idades variam de 40 a 90 anos. Pessoas de meia-idade se interessam pela autobiografia orientada quando os filhos saem de casa ou a carreira se estabiliza. O método também é útil em momentos de transição, em qualquer fase da vida, para dar às pessoas uma perspectiva de onde elas estiveram, onde estão e aonde elas gostariam de chegar em breve na vida. Parafraseando o filósofo dinamarquês Kierkegaard, "você vive sua vida progressivamente, mas a entende retrospectivamente".

Folha - Que autobiografia foi mais especial para o senhor?
Birren - Algumas autobiografias de veteranos de guerra são assustadoras. Eu conheço um veterano que teve sua laringe removida. Ele usa uma caixa de voz, na qual datilografa suas palavras, e esse aparelho as reproduz para o grupo com uma fala monótona.

Folha - As pessoas podem mentir nas autobiografias?
Birren - Se as pessoas mentem para elas mesmas, elas podem mentir nas autobiografias. A verdade é largamente substituída. Digo aos grupos que o que eles dizem deve ser verdadeiro, mas eles não têm de dizer toda a verdade.

Folha - Há situações em que é melhor esquecer o passado?
Birren - Na maioria das vezes, o passado se torna melhor quando trazido para o presente, mas muitos acontecimentos dolorosos do passado podem ficar enterrados. As pessoas têm consciência de quando uma coisa está pronta para vir à superfície para ser compartilhada.

Folha - O senhor já começou a fazer sua autobiografia?
Birren - Sim, sou membro de um grupo de homens que estão fazendo suas autobiografias.

Folha - E já pensou em se aposentar?
Birren - Tenho 83 anos. Fiz pesquisas nas áreas de psicologia e psicologia do envelhecimento em toda a minha carreira. Já me aposentei três vezes, mas me divirto mesmo aprendendo novas coisas com meu trabalho. Espero publicar dois novos livros neste ano.

Folha - O idoso vive melhor hoje em dia?
Birren - Sim, existe uma revolução internacional da idade a caminho. As crianças, que costumavam ser a maior parte da população, e as pessoas mais velhas, que costumavam ser a menor parte, estão mudando de posição. Estudos de centenários mostram que há pessoas acima dos cem anos vivendo sozinhas e sustentando a si próprias. Nós nos demos o presente da vida longa, mas há incerteza sobre como usá-lo. A autobiografia orientada é um passo em direção à geração de novos pensamentos sobre a vida longa e sobre como vivê-la bem.

foco nele

Nome: James Birren
Idade: 83 anos
Profissão: professor universitário e pesquisador
O que faz: orienta pessoas de meia e terceira idades a fazer suas autobiografias
Filosofia de vida: ser otimista em relação ao futuro, devido à capacidade do ser humano de se adaptar, mesmo com tantas condições ameaçadoras, e de criar novas soluções



Texto Anterior: Pergunte aqui
Próximo Texto: Planos cobrem shiatsu e RPG
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.