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ROSELY SAYÃO
A difícil arte de ser criança
Um colega, professor
universitário, disse
que não gostaria de
ser jovem no mundo
de hoje. Penso sempre nisso e
concordo com ele. Agora, tenho
a mesma maneira de pensar a
respeito da criança. Como é difícil ser criança no mundo em
que vivemos!
Nos primeiros anos de vida,
quando deveria ser livre para
brincar, para se relacionar com
outras crianças -não necessariamente da mesma idade-,
para explorar o mundo com liberdade, sem hora marcada e
roteiro preestabelecido, ela
precisa bancar uma vida ao modo do adulto e do que ela deverá
se tornar no futuro.
Menores de seis anos têm
agenda apertada a cumprir,
obrigações dos mais variados
tipos, preocupações dignas de
adultos, escolarização precoce
e tudo o mais. Pouco resta de
tempo que possa ser usado para
a coisa mais importante desse
período: brincar sem compromisso. Não há espaço na vida
delas para o ócio, veja só.
Depois dos seis anos, mais ou
menos, a criança deveria se desenvolver: passar, progressivamente, a se responsabilizar por
suas coisas, assumir compromissos, encontrar soluções para situações problemáticas próprias de sua vida, aprender.
É o tempo de crescer, que
coincide com o início do árduo
aprendizado da leitura, da escrita e da aritmética. A vida na
escola, que nesse momento representa o mundo para a criança, é, portanto, a situação privilegiada para que ela cresça.
E não é que muitos pais têm
atrapalhado os filhos em seu
crescimento e, portanto, não
têm deixado que isso ocorra?
Esses pais têm o que julgam ser
um bom motivo: protegê-los de
injustiças, sofrimentos, frustrações e problemas. Na verdade, impedem que eles cresçam.
Crescer dói e, portanto, certos
sofrimentos são inevitáveis.
Há pais que reclamam dos
professores de seus filhos, por
exemplo. Ora são considerados
bravos em demasia, ora injustos em suas atitudes, ora rigorosos ou exigentes além da conta. Acontece que a criança dessa idade precisa aprender a lidar com as incompreensões do
mundo, com as pequenas injustiças, com as exigências e cobranças a ela dirigidas, entre
outras coisas. Crescer supõe
construir mecanismos para fazer frente a essas situações.
Lembro-me de um trecho de
um livro de Françoise Dolto
-transcrição de um programa
de rádio em que respondia a
pais aflitos- em que a psicanalista sugeriu que a mãe, cujo filho se recusava a ir para a escola
porque a professora era muito
brava, dissesse a ele que, se a
professora ensinava, não tinha
importância se era brava. Esse
é um modo de dizer que o filho
não pode se recusar a crescer,
que esse é seu destino.
Há pais que não querem que
filhos dessa idade enfrentem
dissabores e arquem com as
consequências de seus atos.
Permitem que drible os colegas
ou a escola quando precisam
prestar contas de alguma atitude ou dever. Há os que aceitam
desculpas esfarrapadas para os
mesmos erros repetidas vezes.
Precisamos ajudar essas
crianças a crescer, a seguir em
frente. Caso contrário, estaremos plantando um futuro infantilizado em suas vidas.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@uol.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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