|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Novas técnicas de reprodução assistida dão esperanças a casais
com problemas graves de infertilidade, e o futuro promete mais
Quase todo mundo pode ser pai ou mãe hoje
Zulmair Rocha/Folha Imagem
|
Cláudio Figueiredo, 38, a mulher, 38, Ormezinda, e os trigêmeos do casal, Gabriel, Yasmim e Lucas, que nasceram por meio de uma das mais recentes técnicas de reprodução assistida |
DANIELA FALCÃO
EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO
Gabriel, Lucas e Yasmin são trigêmeos de 1 ano com peso e altura adequados para a
idade, que fazem muito barulho e divertem os pais quando aprendem palavras novas. Mas a concepção deles não teve nada de comum. A começar pela história do pai.
Como acontece com um homem em cada cem, o analista de sistemas carioca Cláudio Figueiredo, 38, era incapaz de produzir
espermatozóides. Há dois anos, a medicina não oferecia nenhuma solução para o
caso dele, que hoje, pai de três filhos, já
pensa em aumentar a prole.
A paulista Rafaela Pinto, 1, também é
fruto dos avanços na reprodução assistida. Para a gravidez vingar, após cinco
tentativas frustradas, a mãe forneceu
seus óvulos para serem "turbinados"
com o citoplasma do óvulo de uma doadora jovem (leia nas págs. 12 e 13).
Quando Louise Brown, o primeiro bebê de proveta do mundo nasceu, em
1978, só mulheres com problemas tubários se beneficiavam da reprodução assistida. Hoje, quase todas podem ser mãe,
embora o caminho seja árduo e caro. Em
22 anos, as chances de uma mulher com
menos de 35 anos de idade engravidar
com auxílio médico pularam de menos
de 5% para até 50% por tentativa. Aquelas com mais de 40, com dificuldades extras por causa da idade dos óvulos, lucraram ainda mais. Técnicas como a transferência de citoplasma as colocaram quase
em condições iguais às das jovens.
Pesquisas em andamento prometem
acabar com o maior entrave à gravidez: a
não-produção de óvulos devido à idade
ou à retirada dos ovários. Pelo menos 20
centros de reprodução estão tentando
transformar células do ovário em óvulos
maduros, entre eles a clínica do andrologista Roger Abdelmassih, em São Paulo.
A meta é retirar partes do tecido ovariano
e congelar até a paciente resolver ter filhos. "A técnica beneficiará mulheres que
só querem ser mães depois dos 40 ou que
têm de se submeter a quimioterapia", diz.
Em março, dois dos cientistas que trabalham com Abdelmassih deram mais
um passo para vencer a esterilidade feminina: fabricaram um óvulo a partir da célula somática de uma paciente. Mas para
transferir o embrião para o útero é preciso saber como a gravidez evoluirá. "Fizemos parceria com a USP para testar a técnica em animais. Acho que em três anos
ela estará disponível", diz o médico.
Se as mulheres têm hoje muito mais
chances de ser mãe do que há dez anos,
os homens praticamente se livraram do
drama da infertilidade. Graças à técnica
desenvolvida pelo tcheco Jan Tesarik, homens que não possuem espermatozóides
podem ter filhos por meio da maturação
em laboratório das espermátides -células precursoras dos espermatozóides que
não são gametas masculinos completos,
mas carregam a carga genética do pai.
A descoberta mais importante, entretanto, aconteceu em 92, quando cientistas belgas criaram a Icsi, técnica que injeta o espermatozóide direto no citoplasma
do óvulo, solucionando o problema de
homens cujo sêmen contém espermatozóides fracos ou sem mobilidade. "Antes
da Icsi, para a fertilização in vitro dar certo, o sêmen coletado precisaria ter milhares de espermatozóides. Agora basta
um", explica Abdelmassih.
A Icsi ajudou também os que possuem
espermatozóide apenas nos testículos, e
não no sêmen -caso dos vasectomizados. Por meio de punção ou biópsia, os
médicos "capturam" alguns espermatozóides e injetam do um a um nos óvulos.
Avanços no laboratório
Os aperfeiçoamentos feitos nos laboratórios foram
tão importantes na batalha contra a infertilidade quanto a descoberta da Icsi e
do transplante de citoplasma. Medicamentos mais puros, usados para estimular a ovulação da paciente, possibilitaram
a coleta de óvulos de melhor qualidade. O
desenvolvimento de novos meios de cultura permitiu que os embriões ficassem
mais tempo in vitro antes da transferência para o útero, dando aos médicos a
oportunidade de selecionar com precisão
aqueles com mais chances de resultar em
gravidez. E equipamentos introduzidos
nos laboratórios aumentaram o controle
sobre as variáveis envolvidas, da temperatura e qualidade do ar às pipetas e plaquetas usadas para manipular óvulos e
embriões. "Essas mudanças foram decisivas para aumentar as chances de a gravidez dar certo. As novas técnicas são importantes, mas só servem para casos específicos", pondera José Gonçalves Franco Júnior, coordenador da clínica Sinhá
Junqueira, em Ribeirão Preto (SP), uma
das principais do país.
A vontade de Deus
Apesar de a
chance de um casal estéril gerar filhos ter
aumentado dez vezes de 78 para cá, está
longe o dia em que qualquer casal poderá
ter filhos biológicos. Há técnicas para
quase todos os problemas, mas elas não
garantem a solução de todos os casos.
"É muito difícil a mulher entender por
que as chances de sucesso são pequenas.
Quando a gente faz o tratamento, tem
certeza de que vai resolver o problema.
Uma vez achei que estava grávida, contei
para todo mundo. Saber que deu errado e
ter de lidar com a frustração foi horrível",
afirma Lúcia Pinto.
"É sempre um jogo de sorte. Não dá para entender por que em uma tentativa os
três embriões vingam e na outra, nenhum. Acho que é um pouco a vontade
de Deus", diz Valquíria Ferro, 33, professora de inglês que só conseguiu ser mãe
em 99, após cinco tentativas frustradas.
Texto Anterior: Pergunte aqui Próximo Texto: Descarte de embriões Índice
|