|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
foco nele
Prêmio Nobel estuda gás "multifuncional"
KARINA KLINGER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Desde que descobriu como o organismo produz o óxido nítrico (NO), gás que
mantém a integridade do sistema circulatório e garante proteção contra as
doenças cardiovasculares, o cientista
norte-americano Louis Ignarro, 62, que
ganhou o prêmio Nobel de Medicina em
1998, vem se aprofundando no estudo
dessa substância.
Além de constatar que pacientes obesos, com diabetes, câncer, mal de Alzheimer e úlcera têm baixas quantidades de
NO no organismo, Ignarro chegou à conclusão de que é possível estimular a produção desse gás pela alimentação, de
uma maneira natural. Existem micronutrientes, como vitaminas e aminoácidos,
que estão associados à formação do NO.
"A arginina é um aminoácido encontrado na carne, no peixe, no amendoim
etc. Mas, por meio da dieta, não é possível
consumir as quantidades ideais de arginina para que haja maior produção de
NO. Por isso resolvemos desenvolver um
suplemento alimentar", explica o cientista. Em junho de 2003, ele lançou o suplemento no mercado americano. O produto pode chegar ao Brasil ainda neste ano.
Ignarro, que trabalha na Universidade
da Califórnia (UCLA), ressalta que, para
manter o coração em dia, a melhor maneira é prevenir-se. Segundo ele, a mudança de hábitos -o que inclui prática
regular de exercícios físicos, dieta equilibrada e distância do cigarro, entre outras
atitudes saudáveis- deve começar o
quanto antes. "Eu e minha mulher mudamos nossos hábitos de vida há anos."
Leia a entrevista concedida no mês passado, quando ele esteve no Brasil.
Folha - Qual a importância do NO na vida
das pessoas?
Louis Ignarro - Quando as pessoas descobrirem a sua multifuncionalidade, poderão prevenir-se de uma série de doenças, como obesidade, diabete, úlcera,
câncer, hipertensão, colesterol alto e infarto. Não provamos ainda como o gás
age exatamente em todos os órgãos, mas
sabemos que, em altas quantidades, ele
deixa o organismo mais auto-suficiente.
Folha - O que já se conhece sobre a ação
desse gás no corpo?
Ignarro - Apesar de ser um gás, é importante deixar claro que, assim como acontece com o oxigênio, o NO aparece associado a outras moléculas e, consequentemente, na forma de uma substância no
organismo. Até agora, temos certeza de
que ele diminui o crescimento das células
do tecido muscular no interior das artérias, além de ser um potente vasodilatador. Isso é importante porque, tanto na
aterosclerose como nas doenças cardiovasculares, existe um supercrescimento
desses tecidos arteriais que provoca um
bloqueio na fluidez do sangue.
Folha - Como o organismo produz esse
gás?
Ignarro - Ele surge a partir do aminoácido arginina, que é convertido em NO em
todo o organismo. No cérebro, por exemplo, existe uma produção alta de NO, que
age como um neurotransmissor importante para a memória e para o aprendizado. Algumas pesquisas mostraram que
pacientes com mal de Alzheimer têm níveis reduzidos de NO no cérebro. Conseguimos provar também que o NO retarda o crescimento de tumores e estamos
tentando entender como isso é possível.
Folha - Como é possível incentivar a produção de NO?
Ignarro - Os laboratórios farmacêuticos
estão tentando desenvolver drogas para
esse fim. Fiz pesquisas para mostrar que é
possível encontrar uma maneira natural
de estimular o organismo, tomando arginina, aminoácido presente nos alimentos, e vitaminas antioxidantes, como as
vitaminas C e E. Infelizmente ainda não
descobrimos uma dieta com alimentos
comuns, como a carne, rica em aminoácidos, que garanta, por si só, a produção
do gás.
Folha - Esses novos medicamentos serão
usados apenas para prevenção?
Ignarro - Se a pessoa já tem a doença, só
podemos tratar. Se conseguirmos estimular a produção de NO de forma natural, por meio de uma suplementação específica, será ótimo. A maioria das doenças está associada a fatores genéticos. Por
exemplo, 90% das complicações cardiovasculares são hereditárias. Assim, se você tem um histórico familiar, pessoas que
tiveram ataques cardíacos, aterosclerose
e hipertensão na família, pode prevenir-se estimulando a produção de NO.
Folha - Algumas pessoas produzem
maior quantidade de NO que outras?
Ignarro - Algumas pessoas apresentam
um estresse oxidativo maior e têm uma
menor quantidade de NO. Isso acontece
com pessoas com colesterol alto. As artérias produzem uma quantidade menor
do gás. Pesquisas demonstraram também que quem sofre de úlcera quase não
produz NO na mucosa do intestino. Obesos também produzem quantidade menor desse gás. Em nosso laboratório, estamos tentando estabelecer uma conexão também entre pacientes com diabetes. Quanto mais gordura a pessoa tem
no corpo, maior o estresse oxidativo, ou
seja, existe mais oxigênio para reagir
com o NO e ele se torna mais instável.
Folha - Quais são os seus projetos atuais?
Ignarro - Vou lançar um livro sobre o
assunto para a população leiga. Estou
também preocupado com a saúde das
mulheres e tentando desvendar por que
o estrógeno as protege contra ataques
cardíacos. Já descobrimos que esse hormônio estimula a produção de NO. E faz
isso com eficácia.
Texto Anterior: Poucas e boas Próximo Texto: Quem é ele Índice
|