São Paulo, quinta-feira, 08 de fevereiro de 2007
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entrevista

Filhos em primeiro lugar

Empresário carioca lança livro que propõe a cordialidade entre ex-cônjuges para que seja priorizada a saúde psicológica das crianças e reúne dicas para a boa educação dos filhos por casais separados

TATIANA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL

O empresário Marcos Wettreich, 43, estudou em Harvard e se tornou conhecido por empreendimentos como o iBest e o spa Nirvana no Rio de Janeiro. Mas foi a carreira de pai separado que o fez revisar conceitos e notar que é possível aplicar técnicas de negociação à quase sempre conturbada realidade de um divórcio. No recém-lançado "Manual de Mães e Pais Separados - Guia para a Educação e a Felicidade dos Filhos" (ed. Ediouro, 166 págs., R$ 24,90), ele dá dicas de como construir uma relação cordial com o ex a fim de priorizar a saúde psicológica das crianças. Por telefone, Wettreich falou à Folha sobre o tema.

FOLHA - O que técnicas de negociação têm a ver com o sucesso na criação de filhos de pais separados?
MARCOS WETTREICH
- Quando um casal se separa, as emoções se tornam exageradas, há muitos sentimentos na mesa. Mas esse é o momento de combinar como será a vida a partir dali. O fato é que as vidas dos dois não serão independentes, pois existem os filhos. As crianças são um bem compartilhado. E, em prol delas, é preciso negociar.

FOLHA - Negociações empresariais ocorrem em ambientes de pouco envolvimento afetivo. Como fazer isso acontecer numa separação?
WETTREICH
- Negociar nada mais é do que tentar entender como funciona a mente do outro e se estruturar a partir disso, sabendo aonde quer chegar. O tempo todo estamos negociando. Clientes e fornecedores que se encontram por acaso e tomam uma bebida no clube estão negociando. Mesmo sem decisões imediatas, a negociação permeia todas as relações.

FOLHA - O que é uma relação de ganha-ganha para separados?
WETTREICH
- É a relação em que ambos sentem que estão ganhando. Para isso, o foco tem de ser o bem-estar do filho, e não os desejos, as ansiedades e as expectativas de cada um. Numa separação, uma das partes pode até não estar interessada em se separar. Se ela for priorizar isso, aonde vai chegar? Na relação ganha-ganha, nenhuma das partes tem necessariamente 100% do que quer, mas ambas percebem os benefícios.

FOLHA - No livro, o senhor cita os "trigger points", pontos de gatilho que ativam reações de dor e comportamentos agressivos. Como é possível amenizar a ação deles?
WETTREICH
- As pessoas tendem a ser reativas, a ver agressão mesmo onde não há. Esses gatilhos são mais latentes quando alguém está ferido, e a ferida é freqüente nas separações. É importante não manter o "pé atrás", não pensar que tudo que o ex faz é para arruinar sua vida. Sempre achamos que quem briga é o outro, mas muitas vezes o viciado em conflito é você.

FOLHA - Leva muito tempo para construir essa cordialidade?
WETTREICH
- É uma variável. Convido quem está se separando a lembrar que já amou aquela pessoa e que houve um tempo em que as diferenças eram acertadas -ou seja, há afinidade. Se os dois têm personalidade positiva, a tendência é que se tornem amigos. Pelos filhos, constroem uma boa relação. Haverá momentos em que terão mais paciência um com o outro, em outros, menos. Mas a amizade intrínseca ao casamento pode ser mantida.

FOLHA - Como os pais ajudam os filhos na adaptação pós-separação?
WETTREICH
- Colocando as necessidades da criança acima dos seus desejos. Se você faz com que a sua criança fique bem, esse bem dará um retorno enorme. Definirá o caráter dela e a qualidade do amor que sentirá por você no futuro. Mas, na separação, o casal fica tão absorvido nas suas questões que esquece que a criança está ali sofrendo junto. A confusão da criança traz questionamentos do tipo "Onde é que eu vou morar? Quem é que vai me alimentar?". Muitas das dicas que o livro traz são puro bom senso, mas a emoção às vezes estraga a percepção do que é óbvio.

FOLHA - Que práticas você citaria como inadmissíveis numa separação com filhos?
WETTREICH
- Falar mal do ex-cônjuge para a criança ou na frente dela. Isso só gera, na criança, dúvida e rancor. E, no futuro, pode levar ao distanciamento dela de um dos pais. Dividida, ela acaba sendo forçada a agir com falsidade: pode mentir para um dos pais para não perder o afeto dele. Além disso, é preciso não demonstrar culpa pela separação. Se o pai ou a mãe fica cabisbaixo, o filho tende a se sentir responsável.

FOLHA - Como deve ser conduzida a educação pelos pais separados?
WETTREICH
- É interessante manter regras comuns de educação. Combinar, por exemplo, horários de dormir e de comer que sejam respeitados nas duas casas. Estabelecer se pode falar palavrão ou não. Numa carta de intenções, os pais podem combinar essas regras.

FOLHA - O livro é baseado na sua experiência?
WETTREICH
- Mais do que minha experiência, estudei as separações. Li muitos livros de psicologia, que trazem o porquê de certas coisas, mas não desenvolvem o lado prático de como evitá-las. Eu tenho uma relação excepcional com a minha ex-mulher e comecei a aplicar técnicas de negociação na nossa relação intuitivamente.


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