São Paulo, quinta-feira, 08 de março de 2007
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Outras idéias - Michael Kepp

Sexo é superestimado?

A s confissões ficam mais fáceis com a idade. Os idosos podem admitir que o sexo não é -e, em alguns casos, nunca foi- seu ponto forte porque estão velhos demais para ligar para o que os outros pensam. O ensaísta americano Gore Vidal, 80, começou um livro de memórias assim: "A única coisa que realmente gostava de fazer era ir ao cinema. Naturalmente, sexo e arte vinham antes do cinema, mas nunca foram tão confiáveis". Lima Duarte, 76, disse, em entrevista a Marília Gabriela: "Não sou bom de cama. Não sou atento e não gosto de ser servidor da mulher. Não sei mexer com as coisas na hora que tem de mexer".
Mas quem, ainda longe da terceira idade, tem coragem de afirmar que sexo não é muito a sua praia? Quando perguntei a brasileiros de diferentes idades o que na vida dá mais prazer, o sexo ficou, para a maioria, no topo da lista ou perto. Essa tendência me surpreendeu porque o sexo é mais importante em certos momentos da vida do que em outros. Será que todos -solteiros, recém-casados, casados de longa data- estavam no mesmo momento sexual?
Ou a maioria tem medo de admitir prazeres maiores, de música a gastronomia, pois o apetite sexual é um traço atraente? A mídia destaca a sexualidade dos entrevistados porque supõe que é a imagem que eles querem cultivar e porque sexo vende. A "Revista O Globo", um suplemento dominical, destaca a sexualidade nos perfis que faz, com perguntas como: "O melhor lugar para fazer amor?" ou "O barulho que você faz na hora do amor?". No penúltimo perfil, a manchete era: "Maurício Branco faz amor ao som de "Oh, Yeah!'".
Eu me confundo com a questão que levantei. Nem sei onde fica o sexo na minha lista de prazeres. Talvez porque o sexo, ao contrário da maioria dos prazeres, é um "pas de deux" que depende de quanto os envolvidos gostam da dança. Como comparar o prazer de satisfazer seu parceiro com a solitária e sensorial delícia de um vinho memorável? Meus namoros mais marcantes não foram os mais gostosos, mas sim os mais inusitados. De sexo a tênis, os prazeres não envolveriam momentos repetidos e previsíveis que ficam inesquecíveis por causa do inesperado? Um exemplo é a final da Copa de 2006. O que lembramos não é de como França e Itália jogaram, mas de Zinedine Zidane dando a cabeçada no italiano que disse preferir pegar a irmã dele do que a sua camisa no fim do jogo. Sexo é fonte de poder, de status e de auto-estima. Mas, como fonte de prazer, é superestimado. Afinal, o que as pessoas pensariam se você dissesse que prefere ver uma novelinha a namorar?


MICHAEL KEPP, jornalista norte-americano radicado há 25 anos no Brasil, é autor do livro de crônicas "Sonhando com Sotaque - Confissões e Desabafos de um Gringo Brasileiro" (ed. Record)

www.michaelkepp.com.br


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