São Paulo, terça-feira, 11 de janeiro de 2011
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Novas senhoras

Brasileiras e europeias encontram seu caminho entre as tentativas de rejuvenescer e a aceitação das marcas que o tempo traz

ANNETTE SCHWARTSMAN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A francesa Catherine Deneuve e a brasileira Suzana Vieira, além da profissão de atriz, têm em comum a idade -67 e 68 anos, respectivamente- e a exposição na mídia. Mas qual das duas está envelhecendo melhor?
A antropóloga Mirian Goldenberg, 52, acha que é mais fácil envelhecer na Europa do que no Brasil, onde a cultura obriga as mulheres a parecerem mais jovens.
"As brasileiras envelhecem antes que as europeias, cultural e subjetivamente, apesar de, na aparência, serem jovens por mais tempo."
Para a terapeuta familiar Tai Castilho, 67, a mulher mais velha no Brasil é vista como carta fora do baralho.
"Na Europa, além de haver mais respeito, as mais velhas são consideradas belas."
Segundo Goldenberg, nossa cultura valoriza menos a maturidade do que a jovialidade e a carne dura.
"Muitas mulheres percebem a aparência como veículo de ascensão social e como capital no mercado de trabalho, de casamento e de sexo".
Assim, é difícil a passagem do tempo não ser entendida como perda de capital.
Ainda comparando brasileiras e europeias, Goldenberg garante que as alemãs que entrevistou para suas pesquisas não se preocupam tanto com a aparência.
Segundo a dermatologista Meire Gonzaga, 38, excluindo as francesas, que dão muita importância à estética, não se observa o mesmo nos outros países europeus.
"As alemãs não se cuidam nem quando são jovens nem quando envelhecem."
Por aqui, a questão é outra. O Brasil é o segundo país no mundo em número de cirurgias plásticas e o terceiro consumidor de cosméticos, atrás de EUA e Japão, sem contar os tratamentos como aplicações de laser, botox, ácido hialurônico etc.
Para Gonzaga, o objetivo dos procedimentos menos invasivos não é deixar o paciente parecendo mais novo, mas atenuar linhas que deixam o rosto mais pesado.
Mas há quem não se contente com a mera suavização de sinais ou mesmo com os resultados das plásticas.
"As cirurgias têm limitações, você não consegue 100%, e sim 90%. Só que alguns pacientes não se satisfazem com 90%, e querem sempre mais e mais", diz o cirurgião Antonio Carlos Herrmann de Andrade, 51.
"A medicina pode colocar uma prótese de 1.500 g na sua mama, mas um bom cirurgião jamais faz isso."
Para pôr mais lenha nessa fogueira de vaidades, vale introduzir outra questão polêmica: há quem diga que o envelhecimento não é um processo natural, e sim uma doença a ser combatida.
Esse é o caso da dermatologista norte-americana Zoe Diana Draelos, que garante que o segredo para retardar os efeitos do tempo está em como cuidamos do corpo.
Sua receita inclui fugir do sol entre as 10h e as 15h, aplicar na pele substâncias que previnam o dano oxidativo (a destruição das células por radicais-livres), controlar o açúcar e o peso e adotar uma dieta de vegetais e frutas -com muito chá-verde, mirtilo, framboesa e amora, ricos em antioxidantes.
Além de controversa, essa teoria, na visão da gerontóloga Myrian Spinola Najas, 51, adota uma vertente muito dermatológica para se justificar. "Todos os órgãos envelhecem juntos, a pele é só uma das manifestações", diz a professora da Unifesp.
Ela explica que procura conscientizar os pacientes de suas limitações e tratar de uma "beleza" não só física, mas global. "A meta é ver uma pessoa de 75, 80 anos com massa muscular, caminhando firme."
Najas diz que é difícil fugir da questão da vaidade, que, ao contrário da pele e dos órgãos, não costuma esmorecer com a idade.
Ela cita como exemplo a enorme dificuldade em fazer com que as idosas brasileiras usem andador ou bengala.
"Na Europa, elas não estão nem aí, acham importante ter segurança. Já as brasileiras preferem não sair de casa do que usar um dispositivo desses, principalmente na faixa dos 70, 75 anos", conta.
Para ela, isso reflete a dificuldade que temos em aceitar o envelhecimento. "Precisamos quebrar esse tabu."
Outra ideia que assola as mulheres maduras é o conceito de que homens grisalhos são charmosos e as mulheres, descuidadas.
A historiadora Marina de Mello e Souza, 53, cabelos brancos desde os 26, ignora essa "proibição" há mais de dez anos. Ela diz que só sente olhares maldosos por parte de algumas mulheres -e que os homens elogiam. "Acho que elas se sentem um pouco denunciadas pelos meus cabelos brancos", brinca.
Tabus, tratamentos, cirurgias, comparações -tudo isso para tentar responder a uma pergunta: como envelhecer dignamente e feliz?
"Creio que é tendo um projeto próprio que não começa aos 50 anos, mas muito antes, e percebendo o envelhecimento como uma continuidade desse projeto, e não ruptura", diz Goldenberg.
Quem sabe a geração dos anos 60, que reinventou a sexualidade e abriu as portas para novas formas de casamento e família, não vai inventar também uma nova maneira de envelhecer?


Texto Anterior: Neuro - Suzana Herculanog-Houzel: Uma neurocientista no trapézio
Próximo Texto: Para francesas, ritual de beleza é tradição
Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.