São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 2002
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Espermatozóide requer mais atenção do homem

Antônio Gaudério/Folha Imagem
Celso Serebrenic e os trigêmeos nascidos por FIV; ao fundo, Ivanilde espia a cena



A infertilidade masculina responde por 40% do total de casos, mas há métodos eficientes de preveni-la e combatê-la


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Quando o assunto é infertilidade, a natureza dá aula de democracia sexual. Entre os casais com dificuldades para conceber -de 15% a 20% do total de casais-, 40% dos problemas são do homem, 40%, da mulher, e 20%, decorrentes da incompatibilidade entre os parceiros. Apesar disso, a preocupação da ciência com a infertilidade masculina é recente. As principais razões: preconceito e desinformação.
Os homens ainda se sentem feridos em sua masculinidade quando não podem gerar filhos de forma natural. Embora seja mais simples começar a pesquisa por ele quando um casal está enfrentando dificuldades para conseguir um bebê, na maioria das vezes é a mulher que procura ajuda -até porque ela faz consulta médica com regularidade.
As pesquisas estão avançando, e a tecnologia já oferece meios para que praticamente todos os homens com problemas de fertilidade tornem-se pais. Até mesmo nos cerca de 20% dos casos em que os médicos não conseguem fechar um diagnóstico, o bebê chega por meio de técnicas de reprodução assistida. Mas nem as evidências estatísticas são capazes de tirar o foco da mulher.
No congresso da Sociedade Européia de Reprodução Humana e Embriologia, realizado na semana passada em Viena, com a participação de mais de 4.000 médicos, a maioria dos trabalhos apresentados versava sobre infertilidade feminina.
Na literatura médica brasileira, somente agora a infertilidade masculina ganhou um livro, o primeiro escrito no país e na América Latina sobre o tema. "Durante muito tempo, confundiu-se infertilidade com impotência. Isso afastava os homens dos consultórios. A confusão ainda existe, mas já é bem menor", diz o urologista Nelson Rodrigues Netto Júnior, um dos autores de "Infertilidade Masculina", junto com Paulo Augusto Neves, ambos da Unicamp.
Para o médico Agnaldo Cedenho, diretor do setor de reprodução humana da Unifesp, o problema é mesmo cultural, e os homens deveriam cuidar da saúde reprodutiva da mesma forma que as mulheres. "Não se trata de opinião, mas de números. Temos um grupo de 360 rapazes de 16 anos sendo acompanhados para um estudo científico. Entre eles, 27,5% têm varicocele, que são varizes no escroto, uma das principais causas da infertilidade. Um exame clínico simples detecta o problema, que pode evoluir sem apresentar sintomas, e o homem só vai se dar conta quando, adulto, quiser filhos e não conseguir engravidar a mulher", diz Cedenho.
Entre seus pacientes, ele destaca o caso da jovem que tomou pílula anticoncepcional durante dez anos de casamento e, quando suspendeu o uso, não conseguia engravidar. "Descobrimos que o problema era do marido. Ou seja, a mulher tomou hormônios um longo tempo para evitar filhos sem necessidade. O homem, não se preocupando com sua saúde reprodutiva, também não se preocupa com o planejamento familiar. Toda a responsabilidade acaba caindo sobre a mulher."
O empresário Mário Mohamed, 38, descobriu que tinha poucos espermatozóides e de baixa qualidade quando sua mulher, Adriana, 37, decidiu engravidar antes de se submeter a uma cirurgia para a retirada de oito miomas, que poderiam deixá-la estéril. Mohamed adora falar sobre seus quadrigêmeos, mas prefere que Adriana fale sobre a técnica de reprodução assistida que os socorreu.
"Nosso problema era tempo. Os miomas estavam crescendo, e eu tinha de engravidar rápido. Por isso decidimos pela fertilização in vitro. Foram três tentativas", conta ela. Mohamed diz que não se sentiu atingido em sua masculinidade. Tomou os medicamentos prescritos pelo seu médico, Roger Abdelmassih, e não escondeu que o casal usaria a tecnologia para realizar o sonho de ter bebês.
Também há casos em que o homem descobre sua infertilidade antes de pensar em filho. Quando tinha 28 anos, o comerciante Fábio Nascimento, hoje com 34, levou uma bolada nos testículos. Um mês depois, começou a urinar sangue. O médico, por meio de exame, constatou que a produção de espermatozóides dele era zero e que, portanto, ele era infértil. "Fiquei abalado. O mundo desaba, você se sente o pior dos homens, um impotente. Pensei: "Tenho uma saúde excelente, boa aparência física, mas sou oco por dentro'", diz Nascimento. Hoje ele comemora a gestação da mulher, que, graças à ciência, está grávida de quatro filhos.
E quando é hora de procurar ajuda médica? Os padrões internacionais indicam que após um ano de tentativas infrutíferas, sem usar nenhum método contraceptivo e mantendo relações ao longo do ciclo da mulher, pode-se falar em infertilidade conjugal. E começar a pesquisa pelo homem é mais fácil.
Mas é preciso lembrar que a infertilidade é um problema do casal. "Uma mulher com alta taxa de fertilidade pode compensar uma eventual baixa fertilidade do companheiro, e vice-versa", lembra o urologista Jorge Fragoso, do laboratório Fleury.
Nos casos em que o homem não tem espermatozóides -um em cada cem-, recorre-se à técnica Icsi, que "salvou" o administrador de empresas Celso Serebrenic, 54, e a mulher, Ivanildes, de 34 anos. No último exame que Serebrenic fez antes de conseguir os trigêmeos -Giovana, Paulo Henrique e João Vitor-, nenhum espermatozóide foi encontrado. Por meio de punção, o médico retirou as células do testículo e, com a técnica Icsi, foram gerados os embriões.
As técnicas de reprodução assistida têm um índice de sucesso de 30% a 40% e também têm sido procuradas por mulheres que se submeteram à laqueadura, assim como por homens que se arrependeram da vasectomia. Nesses casos, é possível fazer a chamada "recanalização", uma microcirurgia com índice de sucesso de até 80%, com a vantagem de que a gravidez se dá pelo método natural. "Observamos que a reversão funciona muito bem para vasectomizados com até dez anos de cirurgia", diz Cedenho.
Quem pretende ter filhos deve levar em conta também que a fertilidade é declinante. "O auge da fertilidade da mulher ocorre aos 30 anos, é boa entre 30 e 35, regular dos 35 aos 37, e ruim após essa idade. Os homens apresentam alterações no espermograma (exame que avalia os espermatozóides) entre os 40 e 45 anos", diz Sandro Esteves, da Clínica Androfert, especializada em infertilidade masculina.



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