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foco nele
Monge beneditino explica a meditação cristã
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O inglês Laurence Freeman, 51, jamais
pensou em seguir a vida monástica. Jornalista, aos 25 anos foi fazer um retiro espiritual e estudar a ordem beneditina, a
mais antiga das ordens cristãs, criada em
1512. Mas o que era uma experiência prevista para durar apenas seis meses mudou totalmente a vida do ex-estudante de
literatura inglesa de Oxford. Ele entrou
para a ordem e hoje vive no mosteiro
Christ the King, em Londres.
Líder espiritual da Comunidade Mundial de Meditação Cristã, que possui 27
centros de meditação em todo o mundo,
Freeman já viajou para diversos países e
encontrou-se várias vezes com o dalai-lama. No mês passado, esteve no Brasil para divulgar a visão do cristianismo sobre
meditação. Leia a entrevista abaixo, concedida no mosteiro de São Bento (SP),
onde ele ficou hospedado, e na qual ele
fala sobre meditação, seus encontros
com o dalai-lama e o perdão.
(ANA PAULA DE OLIVEIRA)
Folha - Qual a importância da meditação?
Laurence Freeman - A meditação é universal, existe em todas as religiões. Ela
une a cabeça ao coração. O silêncio, a
tranquilidade e a simplicidade são elementos que permitem o encontro com a
presença de Deus de uma maneira que
tenha significado, forma e propósito para
tudo o que vamos fazer e para tudo o que
somos.
Folha - Por que os católicos estão se interessando mais pela meditação?
Freeman - Há alguns anos, houve uma
retomada cristã muito grande, uma fome
de espiritualidade, e isso eclodiu também
com diferentes formas de chegar a Deus.
Folha - Quando o senhor ouviu sobre a
meditação cristã pela primeira vez?
Freeman - Com um professor que me
ensinou a meditação na prática e ensinou
também que ela não está limitada aos
monges, pode ser praticada por todos.
Folha - As pessoas costumam rezar orações prontas, como o pai-nosso. Qual a diferença entre rezar e meditar?
Freeman - A oração é útil também. Mas
existem diferenças. A prece vem do coração. A meditação é a união com Cristo.
Isso é conseguido segundo a prática do
silêncio, da tranquilidade, habilitando o
dom da contemplação.
Folha - Como é feita a meditação cristã?
Freeman - Em um lugar tranquilo, duas
vezes ao dia, de manhã e à noite, por 20
minutos, sente-se em um lugar com as
costas retas, mas confortável, porém não
muito senão você acaba relaxando demais e dormindo (risos). Feche os olhos e
repita o mantra "maranatha". Pronto,
você já está meditando.
Folha - Por que "maranatha"? Não pode
ser outra palavra?
Freeman - "Maranatha" significa, em
aramaico, "venha, Senhor, venha, Senhor
Jesus". O importante é a repetição da palavra. Se não disser a mesma palavra repetidamente, a concentração se esvai.
Mesmo repetindo o mantra, muitas vezes
sua mente voará, dispersando-se e passando a pensar em problemas e no que
vai fazer amanhã. Quando isso acontecer,
volte-se novamente ao mantra. Tente se
concentrar nele e sentir a contemplação
com Deus. É simples, mas não é fácil.
Folha - Que lição o senhor tirou de seu encontro com o dalai-lama?
Freeman - Aprendi sobre o diálogo e a
olhar a realidade sob outro ponto de vista. As pessoas têm medo de conversar e
debater sobre outras religiões porque
não têm fé e conhecimento suficientes
em sua própria convicção. O medo faz rejeitar o outro, e só o diálogo quebra o ciclo.
Folha - Qual a importância do perdão?
Freeman - O perdão é essencial para a
vida. Todos, em algum momento, experimentam a violência, a dor, a injúria e sentimentos ruins. E, se essa pessoa não perdoa quem a feriu, esse sentimento a destrói, aos poucos, sem ela se dar conta. O
perdão é necessário, não é luxúria. Jesus
nos ensinou a lidar com a violência usando de compaixão e de não-violência.
Folha - Se é tão vital perdoar, por que
não perdoamos?
Freeman - As pessoas se sentem culpadas por não poderem perdoar simplesmente porque não entendem a essência
do perdão. Existem alguns estágios para
conseguir perdoar de coração. Se você
me machucou, eu sinto ira, raiva, ódio.
Eu quero destruí-la. O primeiro estágio é
o da aceitação, assumir que estou tendo
esses sentimentos. O segundo é o estágio
da mudança: quero mudar, pois não
consigo mais dormir direito, minha alegria de viver já não é a mesma. Daí vem o
terceiro passo do processo, que é o esforço (muito grande) de imaginar por que a
pessoa fez o que fez para mim. Jesus disse: "Se te fiz algo errado, me diga. Se não, por que fez isso?". O problema maior é
que nem sempre existe uma resposta para certos atos. Em seguida, é necessário
observar que você está mudando, que o
veneno que a perturbava está indo embora. O quinto passo é transformar o veneno em compaixão. O sexto é a reconciliação; afinal, só você é responsável pelo
perdão, porém ambos serão responsáveis pela reconciliação. Não é possível se
reconciliar sozinho, o outro tem de estar
envolvido. Somente passados esses estágios é possível meditar, com o coração
aberto, sem mágoas.
Folha - Meditar pode acabar com os problemas?
Freeman - Não imediatamente. Mas a
meditação abre a mente para novas percepções, que talvez não fossem percebidas.
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