São Paulo, quinta-feira, 12 de agosto de 2004
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foco nele

Inventor de multifocais crê na longevidade dos óculos

KARINA KLINGER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O francês Bernard Maitenaz, 80, está para o mundo óptico assim como Santos Dumont está para a aviação. Inventor das lentes multifocais, esse engenheiro mecânico, pouco conhecido pelo público leigo, não só transformou os óculos de grau em instrumentos de grande precisão como facilitou a vida das pessoas com presbiopia (conhecida como "vista cansada"). Até 1959, ano em que sua descoberta chegou ao público, quem sofria de presbiopia tinha de usar dois óculos, um para perto e outro para longe, ou ficava restrito ao uso das lentes bifocais e suas imperfeições.
Em visita ao Brasil no mês passado para participar de uma feira óptica em São Paulo, o francês deu entrevista ao Equilíbrio. Entusiasmado com o avanço da tecnologia no mundo, o pesquisador e pai das lentes Varilux, como são comercialmente conhecidas, aproveitou para falar sobre o passado e o futuro dos óculos e sobre invenções.
 

Folha - Como o sr. chegou às lentes multifocais?
Bernard Maitenaz -
Nunca me senti satisfeito com as lentes bifocais que têm uma quebra na imagem para que o paciente veja de perto e de longe. Era evidente que esse transtorno precisava ser corrigido. A primeira patente multifocal foi desenvolvida em 1951, mas ainda não estava perfeita. Foram anos de estudo até ela chegar ao público, em 1959. Na época, era difícil fazer graus mais altos. Então aos poucos o desafio passou a ser diminuir as aberrações e, em 1972, chegamos a 3,5 graus, que é o máximo que temos hoje.

Folha - Como serão os óculos do futuro?
Maitenaz-
A tendência é que as lentes estejam mais personalizadas, que além de precisas, estejam de acordo com os movimentos do olho e da cabeça de cada usuário. Uma lente parece algo banal, mas é um concentrado de tecnologia. Tem lente que é feita com nove camadas diferentes, uma parte tem a função anti-reflexo, outra garante seu endurecimento. Na Europa e nos Estados Unidos, já temos óculos que trazem as iniciais do portador na lente, além de uma série de marcações invisíveis para garantir a qualidade -peças que devem chegar ao Brasil em 2005.

Folha - Quais as limitações da tecnologia óptica?
Maitenaz -
Ainda sabemos muito pouco sobre a fisiologia ocular, portanto temos de lidar com certas distorções nas lentes. Os míopes [pessoas que têm dificuldade de enxergar de longe], por exemplo, costumam usar lentes que diminuem o tamanho da imagem. A gente tem de saber como o olho consegue abrir mão dessa distorção e procurar algo que faça com que se adapte melhor às lentes. Por outro lado, há três anos, se você quisesse montar uma lente para corrigir a presbiopia em uma armação pequena, o óptico desaconselharia porque não teria todos os campos de visão representados. Hoje, a tecnologia possibilita o uso de lentes menores.

Folha - Qual a importância da escolha certa da armação?
Maitenaz -
A armação é como uma janela, ela limita o nosso campo de visão e deve ser escolhida levando em consideração não apenas a moda. Elas não podem nunca comprometer a utilidade da lente.

Folha - Será que um dia conseguiremos nos livrar dos óculos?
Maitenaz -
Acredito que não. O que vai acontecer é que estarão cada vez mais adaptados, a ponto de quase não sentirmos que estamos usando uma armação. As cirurgias de correção de miopia, por exemplo, estão bem avançadas; suprimem o uso de lentes simples, mas fabricam futuros usuários que não poderão usar lentes de contato. O mesmo acontece com a presbiopia. A cirurgia ajuda, mas como a doença é progressiva, os óculos continuam tendo papel fundamental.

Folha - Com que projeto o sr. está envolvido no momento?
Maitenaz -
Após anos na presidência de uma empresa do ramo óptico, hoje eu faço parte apenas do conselho de honra do grupo. Mas sou membro e fundador da Academia de Tecnologia de Paris e participo da comissão de um importante prêmio francês, o Marius Lavet, que dá espaço para novos inventores apresentarem suas descobertas. No ano passado, impressionei-me com a descoberta de um engenheiro que criou um vidro com catalisador autolimpante. O orvalho ativa substâncias que fazem o vidro ficar limpo.

Folha - Nos anos 60, muitas pessoas não acreditaram em suas pesquisas, mesmo assim, o sr. nunca se cansou. Qual o segredo para não desanimar?
Maitenaz -
Acho que sou uma pessoa otimista. Penso que a vida é feita de períodos que se alternam. Ter coragem é sempre importante.


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