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Mini chefs
Em aulas de culinária especiais, crianças 'aceitam' novos alimentos, treinam coordenação motora e se divertem
GABRIELA CUPANI
DE SÃO PAULO
JEANINE LEMOS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Até pouco tempo atrás, cozinhar era uma atividade para lá de rotineira e desprovida de qualquer glamour. As crianças aprendiam o ofício
-e pegavam o gosto pela coisa- ao lado de mães e avós.
Hoje não se fazem mais
avós como antigamente e
muitas mães nunca pisaram
numa cozinha- ou não têm
tempo para isso.
Mas, de uns tempos para
cá, cozinhar virou moda. A
febre chegou às crianças:
ateliês e cursos infantis de
culinária se multiplicam e os
colégios aderiram à onda.
A Escola Wilma Kövesi de
Cozinha, uma das pioneiras
em São Paulo, oferecia quatro turmas infantis por ano
em 2004. Hoje são seis, com
18 alunos, com igual procura
de meninos e meninas.
"Muitas mães não querem
as crianças na cozinha por
causa dos perigos e da sujeira", diz Vera Xavier, gerente
do Atelier Gourmand.
Quem procura esses cursos não são apenas as mães
desesperadas, preocupadas
que os rebentos cheguem à
idade adulta sem saber a diferença entre forno e fogão.
Hoje, a missão dessas aulas está muito mais ligada à
promoção de uma relação
mais saudável dos pequenos
com a alimentação.
"A intenção é ultrapassar o
ensino das receitas e introduzir uma cultura do alimento,
estimular a conscientização
de que é importante se alimentar bem. E muitas mães,
hoje, não têm tempo para isso", diz Marisa Furtado, da
escola Madame Aubergine.
"As aulas ajudam a derrubar preconceitos", diz a professora Betty Kövesi.
Quando é a própria criança que prepara a comida,
caem muitos mitos e ela fica
com vontade de experimentar sabores novos, segundo a
nutricionista Silvana Cintra.
"As aulas são uma forma
de educar os pais, e estimulam que eles também se interessem mais pela alimentação", explica ela.
POTINHOS
Esse é o caso da professora
Camilla Guimarães, 33 anos,
mãe de Maria Beatriz, 9, e de
Alice, 2. Depois de desenvolver diabetes gestacional na
segunda gravidez, ela teve de
modificar sua relação com a
comida. "Não queria que minhas filhas tivessem problemas de saúde relacionados à
má alimentação", diz.
"Quando era criança, minha
mãe nunca cozinhava. Tudo
o que comíamos eram potinhos. Acho que vem daí meu
problema com a comida. Por
isso quero uma experiência
diferente para minhas filhas", conta Camilla.
A mais velha ainda não está totalmente convencida,
mas já arrisca dizer que gosta
do cheiro do alho e da cebola.
A advogada Camila Junqueira Franco, 36, mãe de
Isabel, 4, e Luiz Antônio, 2,
não consegue fazer a filha comer legumes -exceto quando estão na sopa.
Com o curso, pretende
despertar a curiosidade em
relação aos vegetais e mudar
o discurso da menina de que
"salada é coisa de adulto".
Até aqui, vem dando certo.
A menina ainda não desenvolveu o gosto por abobrinhas, mas quando brinca
de supermercado já coloca
no carrinho de brinquedo cenouras e tomates.
Para a especialista em nutrição pediátrica Denise
Haendchen, do Mini Gourmet, os resultados positivos
desses cursos também ocorrem pela relação especial das
crianças com a professora.
"A tendência é que utilizem a alimentação como
uma forma de barganha com
os pais, até porque essa é
uma das poucas coisas que
conseguem controlar."
Além do orgulho de ter feito a comida e do estímulo de
ver os amigos provando, não
há pressão nem negociação.
Outros benefícios são o desenvolvimento da criatividade, da coordenação motora e
até de noções de matemática.
No entanto, usar as aulas
para ensinar conteúdos de
forma regular não é consenso. "Sou contra o viés utilitarista. Essas aulas não devem
ser vistas como estratégia para chegar a um conhecimento sobre matemática ou nutrição, por exemplo", diz a psicóloga Rosely Sayão, colunista da Folha.
Para Sayão, elas podem
servir de apoio dentro de disciplinas, como laboratório.
"Na educação infantil, são
uma ótima estratégia para se
conhecer melhor, desenvolver os sentidos, socializar",
exemplifica a psicóloga.
"Elas percebem cheiros,
texturas, gostos", diz Paula
Bacchi, orientadora do Infantil e Jardim do Colégio
Santa Maria, em São Paulo.
"Nada contra fazer uma
oficina nas férias, mas a prática regular dessa atividade
deveria acontecer em casa, e
não em cursos. A cozinha de
casa tem o poder de agregar e
ali a criança tem o sentido de
pertencimento, aprende tradições alimentares", lembra
Sayão.
As mães modernas vão ter
que se preparar para arregaçar as mangas também -e
relevar toda aquela farinha
espalhada pelo chão.
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