São Paulo, quinta-feira, 13 de julho de 2000
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drible a neura

Não deixe o medo de voar cortar suas "asinhas"

DINAH FELDMAN
FREE-LANCER PARA A FOLHA

O medo confunde-se com a própria história da aviação e, por incrível que pareça, foi um dos motivos que levou à criação das equipes de bordo. "Ser "bandejeiro" é a última função do comissário", diz Reginaldo Ferreira, comissário-instrutor da Escola de Aviação Congonhas (Eacon), de São Paulo. Tudo começou na década de 30, quando a enfermeira norte-americana Ellen Church se ofereceu para cuidar dos passageiros que passavam mal durante as viagens. Mais tarde, foi criado o primeiro grupo de comissárias, composto por seis enfermeiras, cuja função era zelar pelo bem-estar físico e psicológico dos viajantes. Com o tempo, o papel do comissário de bordo foi ampliado. Hoje, ele atua também como técnico em segurança de vôo e, durante o treinamento, aprende a identificar passageiros com medo. "Um pânico generalizado pode derrubar um avião", diz Ferreira. O curso para comissários de bordo possui uma disciplina específica sobre o tema, chamada Fator Receio de Voar (FRV), que ensina como transmitir informações capazes de tranquilizar os passageiros. Mais ainda: mostra como o serviço de bordo pode fixar as pessoas no lugar e distrair sua atenção.

Lanche para distrair
Em outras palavras, o objetivo principal do serviço de bordo é atenuar o medo de voar, oferecendo diversão e conforto aos passageiros. Por isso são servidos lanches e refeições até em vôos curtos. Não é para aplacar a fome dos passageiros, e sim para mantê-los mais relaxados e parados em seus assentos. Até a escolha de filmes, revistas e jornais para o programa de entretenimento traduz uma preocupação em divertir para garantir a segurança. "A orientação dada aos comissários é eliminar o terror e os desastres na programação que possam gerar medo nos passageiros", afirma Rosana D'Orio, psicóloga clínica e membro da chefia de equipamentos na Gerência de Comissários da Varig em Guarulhos (SP). Nos últimos dois anos, a Divisão de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Dipaa) do Departamento de Aviação Civil (DAC) não registrou nenhum acidente com aviões de grande porte. Dados como esse, porém, não diminuem o medo de voar. "Sentir receio é uma atitude natural e frequente", afirma Tito Paes de Barros Neto, supervisor e pesquisador do Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (Amban). O medo só se torna um problema se é exagerado. Nesse caso, passa a ser considerado fobia de avião e chega a prejudicar a vida da pessoa. As consequências da fobia vão desde sentir mal-estar durante o vôo até se negar a voar. Passar por um vôo tenso ou por um acidente pode deixar sequelas nos passageiros, mas não é a causa do medo. Segundo a psicóloga Rosana D'Orio, a pessoa pode desenvolver a fobia sem nunca ter entrado em um avião, somente ouvindo histórias ou lendo reportagens sobre desastres aéreos. "O que provoca o medo é o sentimento de não ter o controle do avião. O passageiro sente que seria melhor se estivesse no comando, como no carro, onde ele pode parar quando quiser", explica D'Orio. Muitas vezes, o medo pode ser atenuado com um pouco de conhecimento. "Já consegui contornar uma situação de medo, trazendo o passageiro até a cabine. Mostrei o painel, os comandos e expliquei como trabalhamos", lembra Pedro Goldenstein, comandante da Varig. O medo de voar pode estar associado a outras fobias, como medo de altura ou de lugares fechados. "Tive um paciente que veio de Manaus para fazer o tratamento em São Paulo. Viajou por cinco dias de caminhão, ônibus, barca e até pau-de-arara porque se sentia fechado dentro do avião, assim como em elevadores. Não era medo de voar, mas de ficar confinado", conta Barros Neto. Até aspirantes a pilotos são obrigados a desistir da carreira, civil ou militar, por causa do medo de voar. "Se a pessoa tem um equilíbrio psicológico tênue, alguns fatores podem desencadear a fobia, como o acidente com um colega", afirma Marco Antonio Montenegro, médico de vôo da Marinha e membro da Academia Internacional de Medicina Aerosespacial. Leia, na página ao lado, 12 dicas para reduzir o estresse durante um vôo.



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