São Paulo, quinta-feira, 15 de fevereiro de 2001
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DRIBLE A NEURA

Fuja do "Como é mesmo o seu nome?"

ANA PAULA ORLANDI - FREE-LANCE PARA A FOLHA

Durante um cruzeiro, a promotora de vendas Maria Regina Gonzalez, 58, viu-se metida em uma tremenda saia justa. Por mais que tentasse, não conseguia de forma alguma reconhecer o senhor que acenava efusivamente do outro lado do salão de jantar. "Fiquei encabulada e rezei para que não se aproximasse. Mas ele acabou chegando até mim. Com jeitinho, fui fazendo perguntas estratégicas e acabei descobrindo que era um antigo cliente. Para meu alívio, o nome dele foi dito pela esposa. Foi um sufoco."
Até mesmo donos de memória privilegiada para nomes e fisionomias correm o risco de passar por constrangimentos como o vivido por Maria Regina. Afinal, a convenção social dita que é falta de educação esquecer o nome das pessoas.
"Na maioria dos casos, esses lapsos geram desconforto tanto em quem esquece como naquele que é esquecido", diz Kátia Osternack Pinto, supervisora da divisão de psicologia do Instituto Central do Hospital das Clínicas (HC). "O esquecimento dá a entender que talvez você não esteja tão interessado na pessoa", acrescenta a terapeuta ocupacional Viviane Peixoto Salgado Abreu.
Há quem drible o problema com bom humor. Esquecido crônico, o gerente de compras Alexandre Araújo, 31, já trocou nomes de namoradas e atrapalha-se quando encontra conhecidos que não vê há tempos. "Não presto atenção em nomes, por isso tenho dificuldade de guardá-los", admite. "Quando esqueço ou troco o nome de alguém, dou risada e peço para que também me chame por outro nome. As pessoas não ficam com raiva, pois percebem que não faço por mal."
Esquecer nomes ou mesmo de onde é aquela pessoa que surge do nada no meio do supermercado é mais comum do que se imagina e atinge indivíduos de todas as idades. "O estresse é uma das principais causas desse esquecimento porque causa déficit de atenção. Atender telefone, navegar na Internet e anotar recados, tudo ao mesmo tempo, gera dispersão e sobrecarrega o sistema nervoso", diz Paulo Caramelli, neurologista do HC.
Além do estresse, outros fatores podem provocar o esquecimento. A depressão, por exemplo, prejudica a concentração. "Deve-se procurar um neurologista quando os lapsos se tornam diários e a pessoa percebe que está perdendo outras habilidades cognitivas. Em casos extremos, doenças como hipotireoidismo ou tumor cerebral podem se manifestar dessa forma", explica o médico.
Segundo Caramelli, a medicina não consegue ainda explicar por qual motivo alguns indivíduos possuem determinadas habilidades cognitivas mais desenvolvidas do que outras. Há pessoas que, mesmo submetidas a ambientes estressantes ou com intensa vida social, não vacilam na hora de dizer nomes ou números de telefone. "É uma característica própria de cada indivíduo, ninguém é absolutamente bom em todo os aspectos do funcionamento cognitivo. Talvez a pessoa perceba inconscientemente que tenha uma certa habilidade para nomes e acabe desenvolvendo-a mais ainda."
É possível evitar os famosos "brancos" exercitando a memória. "O ideal é que cada pessoa crie sua própria estratégia de memorização", diz a terapeuta Viviane. "Estabelecer vínculos e contextualizar nomes e situações faz com que a informação venha mais rápido à cabeça, reduzindo os lapsos", afirma Caramelli.


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