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Maratona na selva
Prova na floresta amazônica faz participantes enfrentarem
calor, umidade, picadas de insetos e até animais selvagens
RODOLFO LUCENA
EDITOR DE INFORMÁTICA
Quase 90 quilômetros
de calor, umidade, cipós chicoteantes, uivos e rugidos de animais selvagens, agulhantes picadas de insetos, escuridão, dúvidas e medo é o que
enfrentam hoje os participantes da Maratona da Selva, prova
de aventura e resistência disputada nos confins da Amazônia. A corrida, que começou no
domingo, tem mais de 200 km e
é disputada em etapas -a de
hoje, a mais longa, deve se desenrolar até amanhã.
Os competidores começam
atravessando um riacho de 300
metros. Carregando suas mochilas e calçando sapatos molhados, partem então para desbravar a mata, seguindo trilhas
e picadas que não são exatamente uma estrada de asfalto...
Quem não consegue terminar essa etapa ainda com luz do
dia (o que é a maioria) acampa à
noite protegido por guardas armados, pois passam pelo trecho
da Floresta Nacional do Tapajós (Pará) onde há a maior concentração de onças.
"Os pântanos são horrorosos.
Tem aqueles mangues, com
aquele cipó pendurado, aquela
coisa escura, bem tenebrosa.
No trecho mais longo, a gente
passa por um ponto muito próximo do local de que as onças
gostam. O que de dia seria uma
bela estrada, de noite se transforma num túnel de horror",
lembra a corredora potiguar
Jacqueline Terto, 42, que foi a
mais rápida mulher em 2008.
Não se trata apenas de ser rápido. Há que ser resistente e capaz de, literalmente, se autossustentar, pois cada corredor
tem de levar, como equipamento obrigatório, a comida que
imagina que irá consumir ao
longo de todo o trajeto.
Nos acampamentos montados pelos organizadores, onde
os corredores podem descansar
e tratar os ferimentos, eles recebem apenas água.
São condições que podem
derrubar qualquer "fera" do
atletismo. Já no primeiro dia,
em que o trecho a percorrer era
de 15 km, aconteceram as primeiras desistências, segundo
relato no site da prova (www.junglemarathon.com).
O percurso envolvia a travessia de pântanos e subidas e descidas bastante íngremes -em
contrapartida, os corredores
experimentaram, a distância, a
visão de uma grande jiboia e felinos selvagens.
Um corredor resolveu não ir
até o final e outro não conseguiu completar o percurso no
tempo determinado. Ao final
do dia, vários atletas tiveram de
receber atendimento médico
de emergência -três foram levados ao hospital mais próximo, em Santarém, a duas horas
e meia do acampamento.
Assim, não é difícil acreditar
no relato do analista de sistemas Márcio Villar do Amaral,
42, que foi o quinto colocado
no ano passado. Para ele, o trecho mais complicado foi exatamente a quinta etapa, que os
competidores percorrem hoje:
"Quando vinha descendo uma
ribanceira, as solas dos meus
pés descolaram, devido ao
grande calor e à umidade de
90%. Corri dois dias chorando
de dor ao pisar no chão; no último dia, urinei sangue".
Mas é provavelmente essa
exigência absurda de superação, além da curiosidade sobre
a selva amazônica, que faz com
que corredores de todo o mundo enfrentem o desafio, desembolsando quantias significativas -só a inscrição custa 1.600
libras (mais de R$ 4.300).
O valor paga uma noite em
barco antes da prova, transferências, acampamento na selva, água, auxílio geral e assistência médica durante a prova
e mais uma noite de hotel no final. Inclui também camiseta e
medalha da prova e o bufê de
gala, sem bebidas...
Mesmo assim, a Maratona da
Selva atrai mais de cem competidores vindos de 22 países
-China, Austrália, Nova Zelândia, Estônia, Suécia, Malásia e
África do Sul são alguns deles.
Muitos chegam sem a mínima ideia das condições que vão
enfrentar. "A prova vai ser
quente e cheia de criaturas estranhas, animais desconhecidos", previa na semana passada
Michael Wolfe, advogado de 31
anos que venceu, no ano passado, o campeonato norte-americano de 100 milhas (160 km)
em trilha.
"Eu nunca participei de uma
corrida por etapas e para mim
também é novidade ter de carregar todo o equipamento.
Mas, para mim, o ambiente é
que será o grande desafio. Correr vai ser a menor de nossas
preocupações. Não estou acostumado a um ambiente úmido,
pois venho de um clima frio e
seco; nunca fui a uma floresta",
completou.
Nikki Kimball, 38, também
norte-americana e apontada
como candidata ao título da
prova, concordava: "Vai ser diferente de tudo o que já enfrentei. O meu último treino, ontem
[segunda, 5/10], foi na neve.
Chegamos aqui com clima
quente e úmido, é uma mudança completa. Será mais uma
aventura do que uma corrida".
Chegar ao ponto de partida já
é uma experiência exótica -depois de aportarem em Alter do
Chão, famoso destino turístico
da região, os corredores encaram uma viagem de bote até
Itapuama, de onde saem para o
primeiro estágio.
Lá mesmo, por sinal, ocorreu
a primeira emergência médica
deste ano. Enquanto instrutores alertavam os competidores
sobre os perigos que iriam enfrentar, como serpentes, onças,
aranhas e plantas venenosas,
uma das voluntárias desmaiou
e feriu o rosto. A causa, provavelmente, foi desidratação, segundo relato no site da prova.
O que vale é que tudo termina no sábado, com muita festa e
comida nas areias brancas de
Alter do Chão.
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