São Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2004
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drible a neura

Medo do resultado faz paciente adiar exame

KATIA DEUTNER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Quando soube que teria de refazer um exame de laboratório solicitado durante o processo de admissão em uma empresa, o auditor de seguros Alexandre Masso Masuda, 33, entrou em pânico. "Fiz até um testamento, deixando minha prancha velha para um amigo e a nova para outro", diz ele, que é surfista. Sua angústia só terminou ao receber o laudo, que indicava apenas uma gastrite moderada. "Meu medo não é o exame, é o resultado, é descobrir que eu não tenho mais chance, que é o fim."
Esse tipo de reação pode parecer exagerada, mas faz parte do cotidiano de muitas pessoas, que estremecem só de pensar em ir a um laboratório de análises clínicas. Como Alexandre, muitas vezes o medo está associado a fantasias sobre diagnósticos ruins. "Muitos têm medo por causa da doença em si ou pela dor que vão sentir; outros já pensam na família, como ela ficará sem eles", afirma o psiquiatra e psicoterapeuta Geraldo Massaro, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC), de São Paulo.
Transpiração excessiva, boca seca, taquicardia, respiração acelerada, tensão muscular, vertigens, tremores e distúrbios gastrointestinais são alguns dos sintomas que podem ser desencadeados pela fobia de exames. Às vezes, essas reações são tão intensas que interferem no resultado de alguns exames.
De acordo com um estudo britânico, realizado no hospital Royal Brompton, em Londres, aproximadamente 2% dos exames de diagnóstico por imagem realizados em 2000 precisaram ser refeitos porque os pacientes não conseguiram se manter imóveis durante o procedimento.
Às vezes, o pavor é tão grande que a pessoa desiste. Outra pesquisa feita em Londres, no hospital Saint Marie, indica que 5% dos exames não são executados por causa da fobia, que faz com que o paciente volte ainda com o pedido do médico nas mãos.
Outros adiam os exames o máximo possível. A administradora de empresas Andréia de Grande Souza Ferreira, 32, demorou mais de cinco meses para fazer um simples exame de sangue. "Nesse período, eu até senti sintomas de diabetes, mas não queria confirmar se tinha ou não essa doença. Eu achava que as pessoas passariam a me olhar diferente, que esse diagnóstico ia mudar minha vida", diz ela, cujo resultado foi negativo.
Segundo a psicóloga Silvia Maria Ismael, chefe do setor de psicologia do Hospital do Coração, de São Paulo, e presidente da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar, o medo de descobrir que há algo errado com a saúde desestrutura algumas pessoas. "Muitos falam: "Sabe como é, doutora, quem procura acha, e eu procurei". Eles se esquecem de que o tratamento preventivo é mais eficaz que o emergencial. Uma cirurgia de emergência, por exemplo, é muito mais complicada que uma programada."
Alheios ao apelo da prevenção e temerosos quanto ao resultado de seus exames, alguns só marcam consultas médicas quando a situação chega ao limite. O técnico gráfico Gil Nei Cláudio, 56, por exemplo, só procura ajuda de um profissional quando está com "muita dor". "Se a doença é indolor, não quero nem saber o que eu tenho. Também não acredito no tratamento. O corpo humano é uma máquina capaz de resolver tudo sozinha."
Há situações em que o temor não está associado à preocupação antecipada com o resultado. Quem sofre de claustrofobia, por exemplo, geralmente se sente mal ao fazer uma tomografia, porque precisa ficar confinado em um equipamento apertado, com abertura apenas em uma das extremidades. Já o medo da dor pode fazer o paciente adiar uma biópsia.

Conversa de consultório
Cabe ao médico dar o primeiro passo para acalmar o paciente, explicando por que está pedindo determinado exame, como o procedimento é feito e que tipo de resultado será obtido. "Alguns têm pavor de sentir dor ou desconforto. Quanto maior o número de informações sobre o procedimento e sobre o que o paciente vai enfrentar, menos medo ele terá", afirma Giuseppe D'Ippolito, coordenador do Serviço de Tomografia e Ressonância Magnética do hospital São Luiz (SP).
O paciente, porém, tem de fazer a sua parte, adotando atitudes que ajudem a reduzir a ansiedade e o estresse (leia mais ao lado). "O importante é acreditar no médico e não tentar prever se tem alguma doença", diz a psicóloga Silvia Ismael.
Ir acompanhado ou pedir para alguém -até um funcionário do laboratório- segurar a mão durante a realização do exame também ajuda a diminuir a tensão. "O contato físico minimiza o medo. É algo relacionado com a infância e com a sensação de conforto", diz D'Ippolito.
Em alguns casos, os exames podem ser feitos em casa, mesmo se a pessoa estiver bem o suficiente para ir ao laboratório. Em seu próprio ambiente, próximo dos familiares, o paciente sente-se mais calmo e protegido, afirma José Roberto Lino Filho, diretor de atendimento do laboratório Fleury (SP). Outra opção é, alguns dias antes do exame, fazer uma visita ao laboratório ou clínica para conhecer o local, o aparelho, o procedimento e o profissional que fará o atendimento.


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