São Paulo, quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
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ROSELY SAYÃO

Crise e crescimento


[...] ESCONDER DA CRIANÇA QUE O PAI OU A MÃE ESTÃO SEM TRABALHO E APOSTAR QUE ELA ACREDITARÁ NÃO BENEFICIA NINGUÉM

No momento em que o desemprego atinge 31% dos lares do Estado de São Paulo, segundo pesquisa Datafolha, e em que a demissão cresce no país todo, é importante pensar sobre como lidar com a questão quando se tem filhos.
Conversei com uma mulher, mãe de dois filhos com idade entre sete e nove anos, cujo marido perdeu o emprego inesperadamente. Para poupar as crianças de preocupações, o casal lhes disse que o pai estava em férias. Mas logo o mais novo questionou a informação porque achou o pai "nervoso".
Outra família, com filhos adolescentes, decidiu se precaver diante da ameaça de desemprego e mudou o orçamento doméstico, o que atingiu diretamente os jovens. Estes, informados dos motivos da mudança e inconformados com as consequências, disseram que os pais estão "paranoicos" e que a crise só existe na cabeça deles.
Então, qual é a melhor maneira de lidar com essas situações delicadas e que atingem pais e filhos de diferentes idades? Toda criança tem o direito de ter informações verdadeiras sobre o que as toca. Por isso, esconder delas o fato de que o pai ou a mãe estão sem trabalho e apostar que elas acreditarão não beneficia ninguém. As crianças percebem de pronto quando são enganadas e é muito importante que mantenham um vínculo de intensa confiança com os pais para sua segurança e estabilidade, principalmente em momentos de crises.
Ao mesmo tempo, elas ainda não sabem lidar com algumas informações do mundo adulto, por isso detalhar os acontecimentos e as dificuldades pelas quais a família passa pode ter efeitos não muito positivos. A tarefa dos pais, portanto, é buscar a comunicação com os filhos de modo a não lhes dever a verdade sem, contudo, transmitir a eles a responsabilidade de carregar o peso da situação.
Não são os fatos em si geradores de estresse ou de crise, e sim o sentido que se dá a eles. Assim, qualquer situação que a família vive, por mais difícil que seja, pode se transformar em oportunidade de crescimento e aprendizagem. Situação de desemprego ou de ameaça de desemprego pode ser usada para o desenvolvimento e a construção da resiliência da família.
Essa palavra envolve um conceito bem interessante. Diz respeito à capacidade de a pessoa ou o grupo, ao enfrentar situações adversas, conseguir se reequilibrar e se recobrar rapidamente. Desse modo, a situação que a família vive pode contribuir para que todos descubram e/ou construam mecanismos pessoais e coletivos para manter e/ou recuperar a capacidade de reagir com eficiência e resistir às dificuldades e aos dissabores do dia-a-dia.
Aliás, crise é um excelente momento para repensar o tipo de vida que levamos. E talvez seja uma boa hora para os adultos colocarem como centro da vida a família como grupo que se organiza em torno de relações afetivas de confiança, de respeito mútuo e com papéis, responsabilidades e limites claros, entre outras coisas. Isso aliviaria muito os filhos, que poderiam, dessa maneira, sair do lugar central da família em que foram colocados.


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)

rosely.sayao@grupofolha.com.br

blogdaroselysayao.blog.uol.com.br



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