São Paulo, quinta-feira, 20 de maio de 2004
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Adultos também sofrem com a hiperatividade

Transtorno nem sempre "some" na adolescência; portador deve ser tratado por toda a vida se os sintomas prejudicarem seu bem-estar

KARINA KLINGER
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Conviver com uma criança ou com um adolescente que não agüenta ficar parado por mais que alguns minutos, é dispersivo, fala pelos cotovelos e age impulsivamente não é fácil. Mas o problema pode ser ainda maior quando é um adulto que se comporta dessa maneira. Essas são características dos transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), que, ao contrário do que se imaginava, não se alteram com o término da adolescência e podem atrapalhar bastante e por toda a vida o cotidiano do portador e de quem está ao seu lado. Os sintomas permanecem os mesmos, mas o grau de cobrança aumenta, afirma o psiquiatra Mario Louzã, coordenador do Projeto Déficit de Atenção e Hiperatividade no Adulto (PRODATH), do Hospital das Clínicas (SP). Isso ocorre principalmente nos casos em que os transtornos não foram identificados precocemente. Espera-se que um adulto seja "maduro" e cumpra suas obrigações familiares e profissionais. O próprio hiperativo tem essa expectativa em relação a si mesmo. Em alguns casos, porém, sem o acompanhamento adequado, os portadores desse tipo de transtorno não conseguem estabelecer metas ou organizar-se e, além dessas dificuldades, têm de enfrentar críticas e preconceitos.

Auto-estima
Um estudo apresentado no último congresso da Associação Americana de Psiquiatria, realizado no início deste mês, quantificou as implicações dos TDAH na fase adulta. Após entrevistar 1.001 adultos portadores dos transtornos, os analistas do instituto de pesquisa norte-americano Ropert concluíram que os hiperativos apresentam dificuldades de relacionamento e sérios problemas de auto-estima, o que aumenta em três vezes o risco de sofrer de estresse, depressão e outros problemas emocionais. Essa associação entre TDAH e distúrbios psicológicos é constatada no dia-a-dia dos consultórios. De acordo com o neurologista João Radvany, do hospital Albert Einstein (SP), em mais da metade dos casos, o adulto que ainda não recebeu o diagnóstico de portador do transtorno procura ajuda médica por se sentir deprimido. "Com o tempo, descobre-se que o quadro depressivo foi provocado pelos TDAH." A pesquisa indicou outro dado preocupante: a maior suscetibilidade dos portadores de se envolverem com álcool e drogas. Mais de 60% fumam, e 52% já usaram algum tipo de droga. Dos entrevistados, apenas 18% concluíram curso superior, comparados com 26% dos americanos em geral. Nos Estados Unidos, um adulto tem, em média, 3,4 empregos em dez anos; entre os portadores dos transtornos, esse número sobe para 5,4. Além disso, 43% dos entrevistados declararam terem sido demitidos ou pedido demissão por causa dos sintomas dos TDAH.

Tratamento
Os resultados da pesquisa feita pelos norte-americanos não devem ser generalizados, porém levam a duas conclusões. Em primeiro lugar, um adulto que desconfie ser hiperativo deve procurar um especialista para fazer uma avaliação. Segundo: se o transtorno interfere no bem-estar do paciente, o tratamento deve ser feito por toda a vida.
"Essa questão é controversa. Afinal, não podemos deixar de notar que algumas crianças realmente melhoram após determinado tempo de tratamento", diz o psiquiatra Wimer Bottura Junior, que coordena um grupo de apoio para portadores de TDAH da Associação Paulista de Medicina. Os casos em que o transtorno melhora com o amadurecimento, contudo, são exceções.
O tratamento combina medicação e acompanhamento psicológico. "Em geral, trata-se os transtornos com medicação psico-estimulante, antidepressivos e terapia", explica o psiquiatra Fernando Ramos Asbahr, da USP.
Acredita-se que os TDAH afetem de 1,5% a 3% da população em geral. As causas ainda são desconhecidas; especula-se que o problema esteja associado a algum desequilíbrio químico cerebral que envolva neurotransmissores. O que já se sabe é que existe predisposição genética e que o problema é mais freqüente entre homens.


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