São Paulo, quinta-feira, 20 de maio de 2004
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s.o.s. família

rosely sayão

Dar dicas ao filho sobre sexo é imprudente

Tem sido bem difícil para os pais encontrar idéias coerentes e harmoniosas a respeito de como ser pai e ser mãe atualmente. Até pouco tempo atrás, esses papéis eram socialmente compartilhados. Mesmo considerando as diferenças de cada família e a concepção de educação de cada pai, era possível conceber um perfil de tais papéis. Hoje, buscar essa referência tem sido tarefa insolúvel, já que tantas teorias diferentes e suas interpretações colaboram para confundir ainda mais os educadores. Um bom exemplo foi o que ocorreu no "Domingão do Faustão" no Dia das Mães.
Para comemorar a data, artistas da emissora falavam sobre os cuidados e o carinho que receberam de suas as mães e a relação que tiveram com elas na infância e na juventude. Um jovem apresentador, estimulado pela própria mãe, que estava no ar, contou como ela o ajudara na época em que iniciou sua vida sexual.
Vejam só: aos 13 anos, em viagem com a família e a namorada, ao perceber que "ia rolar", correu para pedir ajuda à mãe, que correspondeu de imediato. Levou-o até o quarto, deitou-se na cama com ele e lhe deu uma aula, mostrando ao filho o que fazer na hora H, o que evitar, o ritmo que deveria seguir etc. E o apresentador comentou tudo isso com um único objetivo: o de mostrar, em rede nacional, o quanto o relacionamento com a mãe havia sido bom durante a adolescência.
O programa não passou despercebido por muitas leitoras, que escreveram comentando e pedindo uma conversa sobre o assunto. As reflexões seguiram direções bem distintas. Mães de adolescentes, principalmente, contestaram energicamente o papel de "instrutora de iniciação na vida sexual" descrito pelo apresentador. Já outras usaram a experiência do jovem para questionar a minha posição, já exposta aqui nestas conversas, ou seja, a de que a educação familiar deve ensinar o limite da privacidade e da intimidade aos filhos.
Uma mãe, em especial, até provocou: "Viu, Rosely, deu certo com o moço!". Muitas outras leitoras manifestaram dúvidas distintas a respeito do que ouviram. E agora?
Podemos levantar algumas questões que o fato suscita. Uma delas é, sem dúvida, a respeito da fronteira tênue e confusa entre vida pública e vida privada. Afinal, o que ensinar aos filhos sobre intimidade e convívio social em tempos de "reality shows" e culto à fama? Outra questão que pode ser discutida junto é o lugar de pai e de mãe diante do filho considerando a tarefa educativa.
Não há dúvida de que muitos pais perseguem uma meta na relação com seus filhos: a de serem amigos e confidentes deles, e a idéia que está na base desse tipo de comportamento é a de proteção. Mais próximos da vida dos filhos, os pais poderiam ter mais influência sobre eles -pelo menos, é o que imaginam.
A questão que está em jogo não é se essa atitude funciona ou não, e sim se educa. Vamos reconhecer: amigo não educa. Amigo dá conselhos e opina, por exemplo. Tem, no máximo, uma certa ascendência sobre o outro. Mas não tem autoridade. E, para educar, é preciso exercer a autoridade, mesmo que, para isso, seja preciso construí-la. Estabelecer uma relação de amigo com o filho é confundir papéis. E -é bom assinalar- ser pai amigo ou mãe amiga é diferente de ser apenas amigo.
Dar dicas sobre o comportamento sexual, principalmente no início dela é coisa de amigo, de pares, é cumplicidade. Da parte dos pais, essa atitude é, no mínimo, imprudente, já que impede o filho de buscar seus próprios caminhos e estabelece uma relação de lugares simétricos. Agir assim é querer manter o filho muito perto de si, em vez de colaborar para que ele viva com seus próprios passos.
Os pais já são um limite na vida dos filhos, já têm um estilo e não podem ser escolhidos, tampouco trocados, diferentemente de amigos. Atender ao apelo do filho de ser amigo/a dele é deixá-lo sem liberdade de escolha.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha), entre outros; e-mail: roselys@uol.com.br


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