São Paulo, quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007
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Rosely Sayão

Política na escola


[...] A coleta seletiva de lixo, para muitas escolas, não passa de estratégia de marketing ou de ação politicamente correta


Uma professora que trabalha com crianças com menos de seis anos contou-me que, de vez em quando, fica espantada e preocupada ao observar como fica o espaço da escola logo após as crianças tomarem o lanche. "É muito grande a quantidade de lixo produzido", disse ela. Como cidadã que tenta ser uma consumidora consciente, ela fica aflita ao perceber a quantidade de embalagens acumuladas que vão ao lixo após o recreio. Isso sem falar nos alimentos que são desperdiçados.
Parece que muitos pais não sabem a medida da fome do filho ou, então, têm esperanças de que ele coma mais na escola do que em casa, por isso enviam um lanche enorme que a criança não consegue dar conta. Isso é desperdício, e fartura não é sinônimo de esbanjamento.
Neste início de ano, muitas mães assumiram a tarefa de preparar o lanche que os filhos levarão à escola. Pois é bom saber que, nesse trabalho aparentemente simples, muita coisa importante está em jogo: a educação alimentar da criança, os cuidados com sua nutrição e, também, a educação para o consumo responsável.
Após as reportagens a respeito do aquecimento global e de suas conseqüências, todos devem ter se preocupado, por pouco que seja, com a questão, principalmente os que têm filhos e netos. Alguns já tomaram, inclusive, pequenas mas importantes decisões. Uma conhecida contou que vai passar a usar apenas álcool como combustível para o carro, por exemplo. Outra disse que irá tentar montar um esquema de rodízio com outros pais para levar os filhos até a escola, e uma terceira vai passar a se ocupar com os filhos no uso de energia e de água.
Atitudes como essas mostram aos mais novos o quanto estamos -ou não- implicados com o futuro, deles e do mundo. Mas é preciso bem mais do que isso para que eles possam se tornar cidadãos conscientes e consumidores responsáveis. É preciso que esse tema faça parte do processo educativo, das conversas em família, da programação escolar.
Muitas escolas já fazem coleta de lixo seletiva. Essa é uma atitude que pode funcionar como uma estratégia educativa. Para tanto, precisa fazer parte de um projeto mais amplo, com ações e discussões integradas. Não adianta a escola ter os recipientes coloridos para separar o lixo e não conversar com os alunos a respeito da produção de lixo e do desperdício de comida na hora do lanche, por exemplo. E isso acontece. É que a coleta seletiva de lixo, para muitas escolas, não passa de estratégia de marketing ou de ação politicamente correta.
A produção excessiva de lixo e o desperdício não são apenas temas ligados à ecologia. É a noção de respeito e de amor à vida que está em jogo. Como seres humanos, temos a obrigação de agir de modo a não prejudicar o ambiente, entre outros motivos porque nossos filhos permanecerão por aqui depois de nós. Do mesmo modo, temos o dever de ensinar a eles que os recursos naturais não são inesgotáveis e que as atitudes de descaso em relação aos danos que ocorrem à natureza são irresponsáveis já que não somos capazes de substituir o que é destruído.
Os cidadãos e consumidores que se tornam conscientes em relação a essa questão não conseguirão, apenas com seu estilo de vida, transformar a atitude inconseqüente de governos e de grandes empresas que agem de maneira quase suicida. Mas essa consciência dá acesso a atitudes políticas que, em conjunto, adquirem considerável força de pressão.
É assim que se exercita a cidadania, é assim que se faz política.


ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)

roselysayao@folhasp.com.br

blogdaroselysayao.blog.uol.com.br


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