São Paulo, quinta-feira, 23 de novembro de 2000
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O aparelho ajuda os jovens a manter contato com seu grupo
Adolescentes trocam cigarro por celular

RICARDO BONALUME NETO -
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os adolescentes britânicos estão trocando o hábito de fumar pela posse de telefones celulares, afirmaram dois pesquisadores na revista médica "British Medical Journal". A hipótese mostra que a queda acentuada no tabagismo desde 1996 foi paralela a um grande aumento na posse de celulares entre adolescentes e jovens de 15 a 24 anos.
"Não temos certeza da relação. Por enquanto é só uma hipótese. Sugerimos que essas duas tendências podem estar ligadas por causa do que sabemos sobre como fumar se encaixa na vida dos adolescentes, e nós achamos que os celulares podem ocupar o mesmo território", explicou à Folha um dos autores, Clive Bates, que dirige a organização não-governamental antitabagista ASH (Action on Smoking and Health). A palavra "ash" quer dizer cinza.
"Outros fatores, como o preço relativo dos celulares e do tabaco, estão provavelmente envolvidos. Nosso objetivo é debater e testar essa teoria", afirma Bates, que estudou o assunto junto com Anne Charlton, professora da Escola de Epidemiologia e Ciências da Vida da Universidade de Manchester.
Os dois afirmam que o celular preenche algumas das necessidades dos jovens que costumam ser associadas ao cigarro: "Estilo adulto, individualidade, sociabilidade, rebelião, pressão do grupo".
"As pressões de grupo para celulares, acredito, são mais fortes do que para cigarros. Se todos os seus amigos têm celular, mas você não tem seu aparelho, então será difícil se socializar e manter a vida social em movimento", diz Bates.
Um adolescente não-fumante pode ser membro de um grupo de fumantes; já um "sem-celular" corre o risco de ser excluído do grupo se não tiver como entrar em contato com ele.
Os dados coletados indicam que o percentual de fumantes adolescentes de ambos os sexos caiu de 13% para 9% de 1996 a 1999. Entre os de ambos os sexos com 15 anos, a queda nesse período foi de 7% (de 30% para 23%).
Já a posse de telefones móveis aumentou dramaticamente. Em janeiro de 1999, apenas 23% dos adolescentes de 15 a 17 anos tinham celular; esse percentual subiu para 60% um ano depois e chegou a 70% em agosto passado.
Bates acredita que a tendência não deverá se reverter. "Não há limite em quanto se pode gastar com um telefone. É mais provável que os adolescentes se concentrem em ser donos dos melhores aparelhos, mais avançados, com Internet, MP3, vídeo etc.", diz. À medida que fumar se torna fora de moda, ele acha difícil que adolescentes voltem ao hábito.
Os pesquisadores não sabem dizer se a tendência se repete em outros países. "Há indícios de que seja um fenômeno local. Mas os adolescentes britânicos sempre foram lançadores mundiais de moda. Como estamos falando de um instinto de rebanho de moda, o efeito pode ser imprevisível", conclui Bates.


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