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O envelhecimento dos pais é uma espécie de perda para os filhos
e gera muitos conflitos; saiba como encarar bem essa fase
Prepare-se para "saborear" os pais durante a velhice
KARINA KLINGER
DA REPORTAGEM LOCAL
Papéis se invertem, as relações ficam estremecidas, vem culpa, medo da perda, incompreensão, e assim por diante. Tudo porque começa a acontecer o inevitável: o
envelhecimento do pai ou da mãe. E os filhos, em geral, não conseguem lidar com essa realidade. Mas é possível "saborear a velhice" de um parente querido. Para tanto, como diz a psicanalista Delia
Catullo Goldfarb, "é preciso começar, bem antes, a trabalhar a questão na cabeça".
Segundo psicólogos e geriatras, o processo de envelhecimento, que já é complicado para quem passa por ele, é
algo grande demais para ser engolido de uma vez só pelos filhos ou por quem for a pessoa mais próxima do
idoso. "Os filhos sempre esperam que os pais os acompanhem. A gente cresce com a sensação de que os pais
irão nos proteger até a morte. Quando isso se desfaz, é
difícil aceitar", diz Suzana Medeiros, coordenadora do
Programa de Pós-Graduação de Gerontologia da PUC-SP.
Como o envelhecimento é uma etapa inevitável, para
lidar da melhor forma com ela, é preciso ficar atento ao
relacionamento e às mudanças que vão ocorrendo no
comportamento do outro -pais devem perceber que
filhos deixam de ser crianças, por exemplo, assim como
jovens devem entender que, com o tempo, paciência de
pai não é mais a mesma. Pois esse é o caso de Terezinha
Aparecida Siqueira Nunes, 65.
Professora aposentada, ela diz que nem todos os seus
quatro rebentos perceberam que seu dinamismo não é
mais o mesmo. "O meu filho mais velho não tem paciência, ele acha que estou cheia de manias e que deveria fazer mais coisas", conta, acrescentando que os filhos, hoje em dia, se intrometem muito na vida dos pais. "Eles
acham que têm autoridade. Existe um confronto que
não acontecia na minha época de filha."
Para Medeiros, "é preciso pensar a velhice como mais
uma etapa, não como uma doença grave. Foi dada ao velho uma imagem única de que ele é sempre resmungão e
conservador. Isso não é a realidade. Cada um tem uma
personalidade singular".
Aos 67 anos, o técnico de construção Maurício José
Tosi vive uma situação rara para a idade: voltou a morar
com a mãe. "Tivemos brigas no passado, mas hoje tento
compreender sua situação. No começo foi difícil, nunca
tive de dar satisfação a ninguém. No primeiro fim-de-semana em que viajei, ela ficou doente. É chantagem emocional, mas acho comum, ela fazia o mesmo com minha
irmã", lembra.
O filho reconhece que os atritos, que foram graves na
juventude dos dois, agora acontecem por razões bobas.
Uma das últimas discussões, por exemplo, foi por causa
de comida congelada. Com o tempo, Tosi fez descobertas importantes, que asseguram um bom relacionamento com o idoso. Uma delas: "Só é necessário paciência.
Ela é uma criança, mas não é minha filha. O que faço é
procurar sempre melhorar suas condições físicas e seu
bem-estar".
A troca de papéis -filho virar pai ou filha dar uma de
mãe- deve ser totalmente descartada. Mas, se ela ocorre por parte do idoso, que se comporta como filho, não
há como evitar, basta ter consciência de que esse comportamento é comum, especialmente entre os idosos
mais dependentes.
E é também a partir do envelhecimento dos pais que
os filhos se deparam com a questão da finitude. "O problema não é o envelhecimento com saúde, que permite a
manutenção da independência e da autonomia, mas
quando existem doenças que criam dependência, e os filhos devem trocar de papel de forma radical. Deixam de
ser protegidos e cuidados para serem "cuidadores'", afirma Goldfarb. "Mas, com o tempo, descobre-se que há
outras formas de carregar no colo. É preciso reinventar a
vida a cada momento", conclui Medeiros.
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