São Paulo, quinta-feira, 25 de março de 2010
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Não penso no futuro

Desde 1997, quando lançou o livro "Depois Daquela Viagem" (ed. Ática, 279 págs., R$ 32), no qual relata sua experiência como portadora do HIV, Valéria Piassa Polizzi é um nome familiar para adolescentes e adultos que aprenderam com ela os riscos da infecção.
Adotado pelas escolas, o livro teve mais de 300 mil exemplares vendidos e foi traduzido em diversos países. Desde aquela época, a garota que recebeu a notícia de que não viveria mais do que seis meses no auge de sua juventude percorreu o Brasil dando palestras, viajou pelo mundo, casou, separou, escreveu outros dois livros e concluiu uma faculdade.
Aos 39 anos, Valéria convive com o vírus da Aids há 23 -foi contaminada nas primeiras relações sexuais, por um namorado. "Era uma doença de homossexuais masculinos, parecia muito distante da gente, meninas de classe média."
Soube que tinha o HIV por seu pai. "Diziam que vivia dez anos quem tinha muita sorte. A vida foi parando. Fiz três meses de faculdade e larguei. Pensava: "Não vai dar tempo de acabar"."
Pouco depois de voltar de uma viagem aos EUA, Valéria foi internada. O médico que a acompanhava havia indicado a hora de iniciar o tratamento, mas ela saiu do consultório e não voltou mais. ""Para que, se vou morrer de qualquer jeito?", pensava. Eu via o efeito colateral do AZT nas pessoas."
Aos 24 anos, passou um mês no hospital, com tuberculose renal, pela primeira e única vez.
Depois de um ano, o médico suspendeu o AZT, que parava de fazer efeito. Nessa época, começou a escrever o livro.
Após um intervalo de quase dois anos sem medicação, o coquetel foi lançado e Valéria voltou a se tratar.
As viagens constantes eram o único plano que ela se permitia fazer. "Não conseguia pensar a longo prazo. Era, no máximo, para o mês que vem."
Quando ela tinha 26 anos, o livro foi publicado. Valéria viajou pelo país inteiro dando palestras e ganhou uma coluna em uma revista voltada para adolescentes.
Alguns anos depois, conheceu o ex-marido, "que era soronegativo e continua sendo", na Nova Zelândia. Depois de ficar três anos na Áustria, onde ele morava, voltaram ao Brasil. "Estava com 33 anos, não morri e não fiz faculdade. Queria estudar e me formei em jornalismo." Agora, dedica-se à pós-graduação em criação literária.
Valéria tem problemas renais e faz exercícios físicos para combater a lipodistrofia, um problema de má distribuição da gordura corporal que também eleva o colesterol e os triglicerídeos. Toma antidepressivos, como a maioria de seus amigos soropositivos.
Com a carga viral indetectável "há muito tempo", ela encara o HIV como doença crônica. "Vida normal que a gente fala é conseguir trabalhar, estudar, mas eu tenho uma doença. Está controlada, mas está aqui."
Mesmo tendo ultrapassado os prognósticos mais favoráveis, Valéria ainda acha difícil fazer planos de longo prazo.


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