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SAÚDE
Positivo e operante
25 anos após os testes do primeiro remédio para combater a Aids, três portadores
do vírus HIV contam como é ter a doença há mais de duas décadas
Marcelo Justo/Folha Imagem
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"Vida normal é conseguir trabalhar, estudar, mas eu tenho uma doença. Está
controlada, mas está aqui"
VALÉRIA POLIZZI
RACHEL BOTELHO
DA REPORTAGEM LOCAL
No princípio, era o
fim. Há 25 anos,
quando o primeiro
medicamento para
tratar pacientes com HIV começou a ser testado, o diagnóstico da doença equivalia a uma
sentença de morte. Desde que
surgiram os primeiros pacientes da epidemia, em 1981, o AZT
era a primeira e única esperança para os infectados.
Apesar da boa notícia, perderam-se muitas vidas até que o
remédio se tornasse acessível.
A distribuição gratuita no Brasil começou em 1991, mas, até
meados da década de 90, o tratamento era para poucos.
"Ou o sujeito tinha muito dinheiro e comprava de importadores ou contava com iniciativas isoladas de algumas prefeituras", lembra Esper Kallas, infectologista da USP.
Além disso, o AZT estava longe de ser uma panaceia. A dosagem prescrita na época, o dobro
da atual, provocava efeitos colaterais como anemia e intolerância gastrointestinal e deixava de agir após um ano, em média. "Houve grande resistência
ao tratamento [por parte dos
pacientes]. Na maioria dos casos, nem eu me convenci de seu
impacto", afirma o oncologista
Drauzio Varella, que tratou alguns dos primeiros doentes de
Aids do país.
Rosa Alencar, da Coordenação Estadual de DST-Aids, concorda. "O AZT teve um impacto
relativo porque não trazia melhora sustentada."
Até o grande salto no combate ao problema, que o colocou
no patamar das doenças crônicas em que se encontra hoje,
passaram-se dez anos. Em
1995, o desenvolvimento dos
primeiros inibidores de protease -drogas que agem em um
estágio avançado da multiplicação do vírus nas células de defesa- mudou todos os paradigmas de tratamento. "A evolução foi absolutamente inacreditável", afirma Varella.
Nessa época, o exame de carga viral possibilitou uma avaliação mais acurada da progressão
da doença, ajudando a definir o
melhor momento de iniciar o
tratamento. "Pela primeira vez,
conseguimos deixar pessoas
com a carga viral indetectável.
Muita gente hoje é sobrevivente desses dias", diz Kallas.
No ano seguinte, a lei de acesso universal aos antirretrovirais foi aprovada, alçando o
Brasil ao posto de protagonista
mundial na luta contra a Aids.
Segundo a Unaids, braço da
ONU para o tema, as mortes
decorrentes da doença caíram
18% desde o lançamento dos
coquetéis, mas a transmissão
está longe de ser interrompida.
No Brasil, onde 700 mil pessoas carregam o vírus, menos
da metade sabe que é portadora. "Aqui, 16% dos pacientes
morrem no primeiro ano porque o diagnóstico está sendo
feito tarde", diz Kallas.
Com a ameaça de morte mais
distante, os próximos desafios
incluem ampliar o diagnóstico
e minimizar os efeitos colaterais da medicação.
Se as conquistas nessa área
continuarem no rumo certo,
mais pessoas poderão viver
com o vírus pelos próximos 25
anos ou mais -assim como Hugo Hagström, Valéria Polizzi e
José Araújo, que falam de suas
vidas com o HIV a seguir.
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