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ROSELY SAYÃO
Elogios em excesso
Muitas famílias têm
transformado a
educação dos filhos em um grande processo de barganha. Vale
quase tudo para conseguir que
as crianças e os adolescentes
obedeçam, esforcem-se, dediquem-se, cumpram com suas
obrigações e não façam o que
não deve ser feito: oferecer presentes -que, conforme a idade
do filho, chegam a ser bem custosos-, dar dinheiro, prometer
passeios, elaborar quadros de
incentivos inspirados no programa de TV "Supernanny" e,
principalmente, elogiar.
O elogio, em especial, virou
moeda de troca fácil nesse processo equivocado. O filho fez
um desenho? Dá-lhe elogio.
Fez a lição, arrumou a cama, estudou, tirou nota boa, tomou
banho no horário determinado
ou dormiu em sua própria cama? Dá-lhe elogio. Agora, quase tudo o que as crianças fazem
virou motivo para elogio.
Os pais acreditam que elogiar
o filho ajuda a criança a se ter
em boa conta e a enfrentar as
novas aprendizagens que surgem a cada dia e, portanto, que
se trata de um agente do bom
desenvolvimento e crescimento. Na verdade, elogiar em demasia -e é isso o que tem acontecido- atrapalha tal movimento. Por quê?
Em primeiro lugar, porque o
elogio está sempre ligado a algum resultado: um comportamento, uma aprendizagem ou a
finalização de alguma atividade. O elogio é a apreciação favorável de um produto considerado bom. Só que, para alcançar
tal resultado, a criança precisou
realizar um processo que exigiu
mais ou menos esforço ou persistência, e, para o crescimento,
isso é o que importa.
Do jeito que as coisas andam,
crianças têm recebido elogios
por coisas que não exigiram esforço nenhum. Além disso, é
preciso lembrar que nem todo
bom processo se converte em
bons resultados, não é?
Do modo como o elogio tem
sido usado, todo o procedimento é ignorado em nome do resultado. A criança aprende que
o importante é acertar, e não
aprender, e isso não pode ser
uma boa coisa. Afinal, para
aprender, é preciso reconhecer
a ignorância e correr o risco de
errar, e quem visa ao elogio não
quer correr tal risco.
Em segundo lugar, o elogio
freqüente torna a criança quase
dependente da aprovação dos
pais -do outro, portanto-, e
isso impede que se veja, que se
auto-avalie e que reconheça o
valor do que faz. O elogio em
excesso infantiliza.
Por sinal, podemos constatar
o quão infantilizado está o
mundo adulto justamente pela
busca do elogio. Muitos adultos, mesmo na vida profissional, têm feito de tudo para ganhar elogios e reclamam quando não os obtêm. Há algo mais
infantil? Afinal, do outro precisamos buscar reconhecimento
da nossa existência, e não aprovação, e essas duas coisas são
bem diferentes entre si.
Finalmente, o elogio não é da
ordem do afeto, o eixo fundamental da educação familiar. É
para garantir o amor dos pais
que a criança se deixa educar.
Por isso, muito mais efetivo para a criança é receber um beijo.
Ganhar um afago e perceber
com clareza o quanto os pais estão orgulhosos -ou não- são
manifestações de afeto que,
além de solidificarem as relações amorosas, também funcionam como excelentes recursos educativos. Deixar os elogios para situações especiais só
valoriza o seu uso.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como
Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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