São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

s.o.s. família

rosely sayão

Festas de escola que não divertem nem educam

Os alunos já estão cansados das escolas repetentes. Os pais, se ainda não estão, precisam ficar. Afinal, todo ano é a mesma coisa, não é verdade? E agora, que mais um está para começar, os pais bem que podem ajudar a escola que seu filho freqüenta a passar de ano e deixar de se repetir.
No início do ano letivo, as escolas entregam a programação do ano. É bom verificar se há previsão de festas com a presença dos pais e apresentação dos alunos. Se houver, procure saber o que os alunos irão aprender com a atividade, qual a inserção dela no projeto pedagógico da escola e se os alunos serão consultados sobre o interesse deles em se apresentarem publicamente. Esse questionamento pode ajudar a escola que seu filho freqüenta a ficar um pouco melhor. Sabe por quê?
É que, desde a educação infantil até o ensino médio, as escolas têm o hábito de realizar festas -com apresentação de alunos ou não-, seja para fechar o ano com uma bela despedida, seja para comemorar o final de uma etapa ou uma data especial. A questão é que, em muitas escolas, o que poderia ser uma excelente oportunidade para a atualização da parceria família/escola acaba sendo um transtorno para pais, alunos e professores. Por quê? Porque essas escolas resolvem mostrar serviço aos pais com as tais festas, fazer marketing com elas. E, pelo jeito, funciona. Vejam o que me contou uma professora.
Ela trabalha com educação infantil, o que significa passar o ano com crianças entre dois e seis anos. A escola, com o apoio dos pais, decidiu fazer um show com apresentação das crianças, as quais ensaiaram para representar uma peça infantil. No dia marcado, tinha de tudo: criança chorando, aluno se recusando a colocar a fantasia, pais reclamando que professores não haviam sido competentes para convencer o filho a decorar o texto etc.
Como se não bastasse tudo isso, alguns pais se envolveram, durante a apresentação, em uma discussão porque um queria filmar, outro falar no celular e outro reclamar. Tudo em nome do filho.
Na verdade, nada do que acontece nesse tipo de festa é em favor da educação. Professores conscientes sabem que essa atividade não envolve nem diverte e muito menos contribui para a educação da criança, já que o objetivo é uma apresentação correta para o adulto ver.
Isso impede que a criança erre, que tenha escolha, que trabalhe sem pressão. Representar uma peça pode ser uma atividade muito produtiva, fonte de aprendizados diversos para os alunos, desde que o objetivo prioritário seja esse, e não o uso da criança para mostrar o que a escola é capaz de fazer. E, quando os pais se preocupam mais em fotografar e filmar em vez de curtir a apresentação do filho, aí é que colaboram mais ainda para que a escola se perca da função a que se propõe.
Em sua correspondência, uma leitora se queixa exatamente do fato de o aluno ser a menor preocupação de algumas escolas nessa situação. Ela conta que, na escola dos filhos, a apresentação que eles tanto se empenharam em ensaiar foi simplesmente cancelada sem nenhuma explicação, por telefone e na noite anterior à data prevista. O que fazer com a decepção dos alunos? A escola não se importou com o fato. E mais: a mãe testemunhou crianças pequenas se apresentando tarde da noite, quando normalmente já estariam dormindo, adolescentes atuando de modo a exaltar uma sensualidade precoce e alunos com pouca agilidade e desembaraço na dança colocados nas fileiras do fundo, quase escondidos da platéia. A leitora estava indignada e com razão.
Ainda há pais que pressionam a escola para que realize festas para os alunos exibirem seus talentos e suas habilidades. Mas a escola não tem essa função. Por isso, quando decide atender a essa demanda dos pais, acaba por perder um tempo precioso, que deveria ser dedicado ao aprendizado do aluno em atividades que até poderiam ser ricas, caso tivessem como foco o desenvolvimento do aluno, e não a exibição dele para os pais.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Como Educar Meu Filho?" (Publifolha); e-mail: roselys@uol.com.br


Texto Anterior: Água no farol, nem pensar
Próximo Texto: Poucas e boas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.