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Análise

Foro especial se converteu em escudo protetor de malfeitores

CARLOS PEREIRA
MARCUS ANDRÉ MELO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Até a emenda constitucional de 2001, o foro privilegiado era para muitos uma espécie de "licença para matar" ou "licença para roubar". Antes desse ano, cabia à Câmara aprovar a abertura de processo pelo STF, e na história republicana nunca o fez. Desde então, o ônus da (in)ação cabe ao tribunal.

Bandeira democrática, o foro especial buscou proteger agentes públicos e ocupantes de cargo eletivo de governantes autoritários. O constituinte de 1988 voltou-se para o passado -o regime militar e suas práticas. No entanto, o foro tem gerado efeitos perversos ao converter-se em escudo protetor de malfeitores.

Mais que isso, o foro tem atraído meliantes para a função política. Pesquisa acadêmica recente revelou que na Índia, nas eleições para o Lok Sabha (Câmara dos Representantes), em 2004, 1 em cada 4 candidatos eleitos tinha uma condenação na Justiça, proporção que atingiu 1 em cada 3 nas eleições de 2009.

No Brasil, 1 em cada 9 dos deputados federais eleitos em 2010 era réu em ações penais por suspeita de crimes diversos, dentre os quais estupro e homicídio.

Há casos de indivíduos que buscam a eleição e a reeleição como forma de garantir o foro privilegiado. Esse mecanismo dá a políticos um tratamento "político" e elimina os custos reputacionais de eventuais condenações em instâncias inferiores.

Em pesquisa recente, demonstramos que prefeitos envolvidos em crimes buscam reeleger-se como estratégia para ficar impunes, pois nos foros privilegiados as chances de punição são menores. Há perversão do mecanismo eleitoral que nas democracias deveria cumprir o papel de premiação do comportamento virtuoso e punição ao delituoso. O político autor de crimes sente-se atraído pela eleição, em vez de temê-la.

O ciclo se fecha quando consideramos que os incentivos à corrupção para prefeitos são tanto maiores quanto mais competitiva for a disputa: afinal, o desvio de recursos em uma eleição apertada pode garantir a vitória.

É preciso repensar o foro, restringindo sua aplicação a casos onde de fato produz resultados desejáveis.

CARLOS PEREIRA
É professor da FGV e pesquisador da Brookings Institution Fellow

MARCUS ANDRÉ MELO
É professor da Universidade Federal de Pernambuco

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