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Quadros de Leopoldo Lima estão 'esquecidos'

Obras com destino incerto fazem com que memória seja apagada

Questionador, artista é tratado por amigos como idealista e sonhador por não ter vendido suas obras

DE RIBEIRÃO PRETO

"A porta é deste tamanho porque meu mundo é pequeno e poucos conseguem entrar nele." A frase, escrita em madeira por Leopoldo Lima, resume -de maneira simplista- a personalidade enigmática do artista plástico.

"A fumaça do pirógrafo ardia os olhos. Mas ele não levantava nem para se alimentar enquanto a obra não estivesse pronta", lembra o amigo Edson José de Senne, 74.

Ambos pertenceram ao grupo de amigos que, na década de 1960, se reunia diariamente na antiga padaria Americana, na região central de Ribeirão Preto.

Na praça 15 de Novembro, Lima estendia um varal e expunha as suas obras.

Ele retratava o sofrimento humano. O girassol, para ele símbolo do amor, sempre aparecia nos trabalhos.

E lá, entre a dor humana, Lima fazia seu autorretrato -ele aparece na maioria de suas criações, em maior ou menor destaque. O artista, no entanto, se recusava a vendê-las e dizia que "cada obra era parida com dor".

Rejeitava o luxo e a riqueza. Como consequência, a mulher e seus cinco filhos passaram por sérios problemas financeiros.

A casa, na rua André Rebouças, era de chão batido e os móveis, todos de madeira, eram feitos por ele.

Em sua autobiografia, "729 - O Varal Biográfico Embananado", escrita sem pontuação e paga com a venda do quadro "Decadência", Lima faz um desabafo sobre si e deixa transparecer também a relação com sua família.

"A mulher na falta de dinheiro ia para a casa de sua mãe não resistia à fome nunca dividimos as necessidades", diz trecho da obra.

Em seguida, Lima afirma que as lamentações continuaram com os anos. Ele relata ter roubado sapatos para os filhos e comida para ele em "momentos de necessidade", mas escreveu não ter se acostumado com o roubo.

"No auge do desespero, a mulher dele começou a vender suas obras. Ele chorava, se arrependia. Aquilo doía muito", disse Senne.

O talento de Lima se tornou conhecido além das fronteiras de Ribeirão. Em 1974, a convite do então prefeito de Osasco, Francisco Rossi de Almeida (1973-77), foi morar no município com o objetivo de levar a arte ao local.

HISTÓRIA APAGADA

Ele convidou o artista plástico Waldomiro Sant'Anna, 59, para ir junto. Moraram numa favela vazia e ofereceram atividades artísticas, dando origem à Vila de Artistas.

Hoje, o destino da maior parte de sua obra é incerto. Amigos lamentam o fato de elas estarem perdidas. "Sinto como se a história dele estivesse sendo apagada", diz Sant'Anna. (GABRIELA YAMADA)

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