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força e gana
Romênia troca rigidez por diálogo e aposta em vontade
BERÇO DE NADIA COMANECI ENFRENTA DIFICULDADES PARA ENCONTRAR MENINAS DISPOSTAS A ENCARAR A ROTINA DA GINÁSTICA E PRETENDE USAR SUCESSO EM PEQUIM COMO PROPAGANDA
Daniel Mihailescu - 27.set.04/France Presse
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Ginastas treinam em Bucareste
DO ENVIADO A DEVA E BUCARESTE
"Vamos à Olimpíada de Pequim para buscar o
ouro. Se ficarmos em segundo
lugar, será bom? Talvez sim,
mas não para mim. Pois temos
condições de ser campeões."
A frase do treinador da seleção romena de ginástica Nicolae Forminte escancara o sentimento no país considerado a
pátria da ginástica artística,
único a figurar no pódio olímpico ininterruptamente desde
1976 e o que mais conquistou
medalhas desde então (63).
Apesar de manterem vivo o
mito de Nadia Comaneci, primeira atleta a tirar 10 na história do esporte, os romenos têm
ciência de que não ostentam o
poderio financeiro dos EUA
nem a profusão de ginastas da
China. Mas estão convictos: são
os campeões da vontade.
"Garanto a você que ninguém quer mais do que a gente
ganhar o ouro em Pequim", diz
Adela Popa, ex-ginasta que há
14 anos treina a seleção juvenil.
A gana para defender na China o título por equipes e manter a série de pódios olímpicos
que dura desde Montréal-76
ajuda a aplacar os impactos da
transição por que passam tanto
a ginástica romena como o país.
Enquanto a nação corre para
se adaptar 100% às regras da
União Européia, à qual foi promovida em 2007, a ginástica se
desdobra para evitar perdas devido à globalização e à mudança
de mentalidade das ginastas.
"Antes, respirava-se ginástica 24 horas por dia. Agora não.
Além de a criança não ter só a
ginástica como opção, para piorar, dependendo da idade, os
pais têm que pagar para que o
filho faça o esporte, o que não é
possível para muitas famílias",
diz o treinador Cotutiu Florin.
As maiores perdas se devem
à queda do regime ditatorial de
Nicolae Ceausescu, que ruiu
em 1989. Desde então, a ginástica deixou de ser obrigatória
na escola. Hoje paga-se de 30
a 80 por mês para praticá-la.
"Sem a ginástica na escola,
perdemos muito. Mas, devido à
tradição e aos bons treinadores, que trabalham bem a base,
conseguimos manter o alto nível das seleções", diz Alexandru Epuran, diretor esportivo
do Comitê Olímpico Romeno e
chefe da missão em Pequim.
Ele afirma que a ginástica é o
carro-chefe dos esportes olímpicos do país, apesar de o futebol dominar a preferência.
"A ginástica é a primeira no
coração dos romenos, mas não
o esporte número 1 do país. É
preciso investimentos", diz
Marius Urzica, dono de um ouro olímpico e duas pratas. Hoje,
ele é técnico e, para ampliar a
renda, tem se aventurado no
teatro. Os treinadores no país
ganham de R$ 780 a R$ 2.000.
A ginástica romena trabalha
com orçamento de 2,5 milhões (70% vindos do setor privado) no atual ciclo olímpico e,
nesse processo, viu os treinadores trocarem a severidade
pelo diálogo para superar crises -tais quais atleta posar nua
e escapadas da concentração.
"Hoje o que vale é a confiança. Não tem como evitar que a
ginasta deixe a concentração,
mesmo dentro do quarto. Elas
ganham muito dinheiro, acredite, e todas têm laptop e internet que permitem falar com o
mundo todo. Só dizemos: "Se
você quer ser campeã, como foi
Nadia Comaneci, o caminho é
esse'", diz Forminte, que chefia
a seleção auxiliado por cinco
técnicos, coreógrafo, médicos,
massagista e fisioterapeuta.
Comaneci é um ícone tão
presente que todas as pessoas
ouvidas pela Folha não souberam precisar o que era a ginástica no país antes de ela assombrar o mundo em Montréal-76.
Mas as ginastas admitem sofrer mais do que a superstar. "O
esporte exige muito mais hoje.
Os elementos são mais complexos", diz Ana Porgras, 14, campeã juvenil européia, que vê a
família a cada três meses.
Ela e mais 12 atletas da seleção juvenil e 15 ginastas da
equipe adulta cumprem rotina
similar no CT de Deva, situado
ao pé da montanha que abriga
ruínas de um dos castelos da
Transilvânia. No CT, apelidado
de "Fortaleza" e que já superou
problemas (de morte de atleta
em 2001, vítima de aneurisma,
até uma sabotagem em 2004,
quando insetos foram "plantados" no centro, que acabou fechado), elas comem, estudam,
treinam sete horas por dia, exceto aos domingos, e dormem.
Chegar a Deva ou a Osneti,
cidade natal de Comaneci e que
abriga outro CT, não é tarefa
fácil. O centro faz seleções três
vezes por ano e tem sofrido para atrair crianças, a partir dos
quatro anos, à ginástica, apesar
de o esporte ainda ser visto como a chance de melhorar de vida -só patrocinadores chegam
a oferecer carro e 100 mil a
quem obtiver ouro em Pequim.
Por isso, os clubes (12 se destacam no país, entre eles o Dínamo de Bucareste) são decisivos -mas reclamam mais verbas. E dezenas de torneios ajudam olheiros a alimentar seleções e CTs, que contam hoje
com cerca de 300 ginastas. Só
os times adultos e juvenis terão
neste ano 25 campeonatos.
Repleta de ídolos, seja na TV
(como Andreea Raducan e Catalina Ponor, hoje apresentadoras), seja ensinando em ginásios ou universidades, a Romênia tem na ginástica o perfil
esportivo do país, calcado em
disputas individuais. "Levaremos delegação com até 120
atletas aos Jogos. Não somos o
Brasil [233 vagas], cheio de esportes coletivos. Por levar poucos atletas e dar muitos pódios,
a ginástica é vital", diz Epuran.
Quanto ao futuro, além de
crer que a parte artística terá
de ser valorizada pelo júri, Forminte resume, de novo, o sentimento romeno: "Precisamos só
de mais, bem mais, crianças.
Nossa atuação em Pequim será
vital para o futuro. Pois preparar uma atleta exige quase dois
ciclos olímpicos. Então, para
2016, temos que pensar hoje".
(CRISTIANO CIPRIANO POMBO)
RIVAL DE DIEGO HYPÓLITO DEIXARÁ PAÍS
Dono de seis ouros em
Mundiais e três pódios
olímpicos, Marian Dragulescu
sofreu com lesões
e, como Diego, só voltou
a treinar no mês passado.
Triste pelo salário de 600
euros que recebe por não
ter atuado em 2007, ele diz
que, se acertar a série no
solo em Pequim, ninguém
o vencerá. "Só penso na
Olimpíada. Mas, após o
Europeu-09, verei o melhor
lugar para trabalhar", diz
ele, assediado por europeus,
americanos e australianos
Nadia Comaneci
Ícone mundial da ginástica artística, a
romena Nadia Comaneci despontou aos
14 anos na Olimpíada de Montréal-76,
quando conquistou a primeira nota 10
da história, nas paralelas assimétricas
-foram sete no total. Dona de nove
pódios olímpicos (cinco ouros, três
pratas e um bronze) vive hoje nos EUA e
comanda uma academia com 1.200
alunos e 35 técnicos, a publicação de uma
revista, os trabalhos de uma produtora
(Perfect 10) e a venda de produtos
550
crianças, sendo 250 internas,
com idades a partir dos cinco
anos, estudam e praticam
alguma modalidade esportiva
(maciçamente a ginástica) no
CSS (centro escolar esportivo)
Cetate, em Deva, que abriga
o CT das seleções feminina
adulta e juvenil
2 mil euros
ou R$ 5.240 é o maior salário
pago às atletas da seleção
feminina romena, destinado
a medalhistas de ouro em
Mundiais ou Olimpíadas.
Prata rende 1.500 euros
(R$ 3.930), e bronze equivale
a 1.000 euros (R$ 2.620)
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