São Paulo, sábado, 2 de maio de 1998

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COMPORTAMENTO
Melancolia crônica não é normal e deve ser tratada

Diagnóstico de depressão e de distimia, males comuns na terceira idade, não são feitos devido à imagem da velhice como a fase da tristeza
Tristeza não é uma consequência da velhice. O idoso que apresenta um quadro persistente de apatia em relação à vida está doente. Ele pode estar com distimia ou depressão, doenças que têm cura.
Distimia é uma tristeza prolongada. Os sintomas são semelhantes aos da depressão: o paciente está sempre melancólico, sem interesse por nada, não tem prazer em comer, passear ou se divertir. As atividades rotineiras passam a ser um estorvo.
Perda ou excesso de sono, mudança na alimentação, redução da capacidade de raciocinar e idéias suicidas são situações recorrentes. A postura corporal também pode se tornar mais arqueada.
Na depressão, um quadro mais grave, predominam queixas físicas, sem que exista nenhuma doença específica.
Segundo estimativas de especialistas, tanto a depressão quanto a distimia atingem de 10% a 15% da população em todas as idades.
No entanto, João Toniolo, 39, diretor-clínico do Centro de Estudos do Envelhecimento da Universidade Federal de São Paulo, acredita que a distimia aumenta a partir da terceira idade.
Baseado na sua experiência clínica, Toniolo estima que a ocorrência seja pelo menos o dobro do registrado, podendo chegar a 40%.
Essa subavaliação entre os mais velhos, de acordo com Toniolo, se deve à dificuldade de diagnóstico e à intensidade dos sintomas.
Enquanto na depressão as evidências são mais claras, a gradual evolução do desânimo do distímico mascara a enfermidade.
Num primeiro momento, ele fica mais abatido devido, por exemplo, à aposentadoria. Em seguida, sofre novos estímulos negativos, como a perda de amigos e parentes próximos. Cresce sua debilidade emocional.
Nesse ponto, ele pode atingir um patamar do qual dificilmente retornará sem ajuda médica.
Outra dificuldade em determinar a doença está no preconceito de que a velhice é triste. As pessoas não imaginam que o avô que se queixa o tempo todo ou passa o dia em casa pode estar doente. É comum culpar a idade.
Segundo Toniolo, a depressão e a distimia dependem também de uma propensão genética. Históricos depressivos e casos de suicídio na família aumentam as chances de a doença se manifestar.
Os homens de classe média e alta são as principais vítimas da depressão. Ao perderem status profissional e financeiro, deixam de ser os provedores da casa. A falta de um papel social os leva à depressão.
As mulheres que vivem na casa dos filhos também são mais vulneráveis. Ao se mudar, a idosa em geral entra em atrito com a pessoa responsável pela casa e perde seu papel de "matriarca". A sensação de inutilidade a deixa deprimida.
A psicóloga Elvira Wagner usa um ideograma chinês para explicar a situação: para representar a paz, os chineses desenham uma mulher embaixo de um teto; para simbolizar a guerra, colocam duas mulheres sob esse mesmo teto.

Prevenção e tratamento

O uso de antidepressivos associado à orientação psicológica é necessário na maioria das vezes. Em casos graves de depressão, pode ser indicado tratamento com eletrochoques.
A prevenção é mais simples. Estar ocupado, fazer exercício, ter uma atividade intelectual e manter um círculo de amigos ajudam a evitar a depressão e a distimia.
João dos Santos, 92, viúvo, e Angelina Pires, 68, divorciada, por exemplo, namoram há seis anos e dançam todo dia em matinês de vários salões da cidade.
Desde que aprendeu a dançar, aos 60 anos, Pires não perde um baile. "Já fizemos muitos amigos e até fomos viajar juntos", conta.
Mas receitar atividades para quem já está deprimido ou distímico não funciona. Com a perda do interesse pela vida, o doente sequer sai de casa. (ANDRÉ SOLIANI)
(LÚCIA RODRIGUES)



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