|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DIA DO VOTO
Petistas não aparecem no Rio, e Leblon vê "Lula não!"
Presidente gera desencanto em velhos militantes, mas tem defensores fiéis
Há uma semana, pessoas com camisetas pretas em protesto ao governo, que são vendidas a R$ 5, estão por todo o bairro carioca
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Joselita de Souza passou 35
dos seus 74 anos envolvida em
movimentos sociais. Atuou na
Pastoral da Terra e foi petista
de primeira hora.
Ontem, preferiu ficar em casa a votar pela quinta vez para
presidente naquele que conheceu ainda metalúrgico.
"A gente acreditava numa
coisa e surgiu outra. Lula foi
fiador de pessoas que não mereciam. E hoje você não deve
confiar nem na roupa que veste. Se ele quer continuar, tem
que trocar de roupa. Desde a
cueca até a meia", aconselha
ela, moradora de Aimbé, bairro
pobre de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
Sentada em frente à sua casa,
Joselita tinha sobre a cabeça
uma placa de propaganda de
Lula e Jandira Feghali.
Também não votaria na candidata do PC do B ao Senado,
pois é católica da Comunidade
Nossa Senhora de Fátima e ouviu falar que Jandira é a favor
do aborto. "Foi uma pessoa conhecida que pediu para eu colocar essa placa aqui. Mas, à noite, eu vou arrancar essa madeira e fazer um tear", planejava a
dona-de-casa.
O desânimo de Joselita ecoava o de toda a capital fluminense e até mesmo do Estado do
Rio, contrastando com a fervura das eleições municipais
ocorridas dois anos atrás.
Ontem, o calçadão desocupado do centro de Nova Iguaçu
não lembrava os conflitos de
2004, quando o petista Lindberg Farias derrotou antigas
forças políticas, que se uniram
sob o apoio de Anthony Garotinho -até o teatral ex-governador do Rio de Janeiro esteve
discreto nestas eleições.
"Só vi passar um cara com
bandeira. E ela estava enrolada", lamentava Ronaldo de
Souza, 40, gerente da padaria
Lisboeta, vazia ontem, lotada
dois anos atrás.
Já em Bairro Botafogo, outra
área pobre do município, um
grupo formado por três militantes do PT e dois do PC do B
fazia campanha coberto de adesivos e broches.
Na cabeça da professora
Charlene Crespo, 25, uma bandana com o rosto de Che Guevara e a confiança de que, apesar dos acertos que vê no primeiro mandato de Lula, o segundo será melhor.
"Pior do que está não vai ficar", brincou ela, referindo-se
aos escândalos que quase fizeram sua mãe, a agente de saúde
Teresa Crespo, 46, optar por
Heloísa Helena durante a campanha. "Vontade deu, mas passou", declarou Teresa, do PC do
B como a filha.
"E, se a gente não vier, quem
vem para a rua?", justificou seu
ânimo Talita Lopes, 24, uma
das petistas do grupo.
Eliete Lins Oliveira, 56, não
pôde ir, por causa do movimento de seu restaurante. O nome
do presidente Lula, no entanto,
estava em plásticos colados na
geladeira e nas suas conversas
com os fregueses.
"Por que mudar? Faz dez
anos que a carne não estava tão
barata. Só os ignorantes acham
que Lula não melhorou o país",
defendia a empresária.
A cor do protesto
Há meninas do Leblon, na
zona sul carioca, que não concordam com a comerciante de
Nova Iguaçu.
O bairro da novela "Páginas
da Vida" se tornou o epicentro
do movimento "Lula não!". Há
uma semana, começaram a
aparecer pessoas usando camisas pretas com a frase. Os criadores cobraram apenas R$ 5,
para que ela vendesse bastante.
"É importante a gente levar a
eleição para o segundo turno e
mostrar que não aceitamos a
corrupção. Comprei a camisa
para marcar posição", bradava
a advogada Flávia Coelho, 26,
que votou no tucano Geraldo
Alckmin depois de quatro eleições cravando Lula.
"Ele foi muito cruel com os
aposentados e os funcionários
públicos, sem falar de toda a
corrupção", fazia coro a fonoaudióloga Martha Moraes,
também 26 anos.
Para a psicóloga Maria Augusta Villela, que comprou a camisa em um bar, Lula é o "autoritarismo". "Precisamos falar
isso e tentar fazer com que Lula
não se reeleja, em nome da democracia. Lutamos tanto para
nos livrar dos militares!"
A advogada Kátia Cunha
também usava uma camisa preta, mas com outros dizeres:
"Fora, corruptos! Eu voto nulo!". "É a decepção total. Fiz
campanha para Lula e tudo
mais. Mas, enquanto não tiver
opção, não voto mais, não quero mais participar", afirmou.
A militância voluntária do
PT apareceu pouco nas ruas do
Rio. Contra ou a favor de Lula, o
que mais se via em esquinas
que já foram palco de aguerridas campanhas eram pessoas
tremulando bandeiras pela diária de R$ 30.
Um bom retrato do (des)ânimo desta eleição estava sobre a
porta da 29ª seção da 215ª zona
eleitoral, na Escola Municipal
Manoel Bonfim, em Del Castilho (zona norte).
Era o trabalho de uma turma
de EJA (Educação de Jovens e
Adultos) reproduzindo fotografias de deputados envolvidos em escândalos: "Cuidado...
Eles são corruptos!".
Colaborou RAPHAEL GOMIDE, da Sucursal do Rio
Texto Anterior: Aqui e lá fora Próximo Texto: São Paulo, em clima de 0 a 0, vê voto sem festa Índice
|