São Paulo, domingo, 06 de abril de 2008

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caminho tortuoso

Aprovação não garante pagamento de recursos

INICIATIVAS DO GOVERNO ESTIMULAM REDE DE INFLUÊNCIAS E BUROCRACIAS NA DISTRIBUIÇÃO DO DINHEIRO QUE SAI DE LEI DE INCENTIVO, APOIO DE ESTATAIS E PROJETOS DO MINISTÉRIO

EDUARDO OHATA
CRISTIANO CIPRIANO POMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os irmãos Marcio e Marcel Wenceslau atingiram sua principal meta: chegaram à Olimpíada. O primeiro é titular, e o segundo, seu reserva.
Estrelas do taekwondo, ganharam também o direito de receber ajuda do Bolsa-Atleta.
Garantia de tranqüilidade na preparação para Pequim?
Na teoria, sim. Mas até hoje eles não viram a cor do dinheiro. Esperança de pódio na China, tornaram-se exemplo de como, apesar do inédito aporte de verba estatal, a burocracia ainda emperra a chegada dos recursos aos principais personagens do esporte, os atletas.
"Estávamos concentrados em Minas [com a seleção] e não pudemos enviar a documentação em tempo hábil. Tem que ter carta da federação, da confederação etc. Fizemos as solicitações, mas, por serem entidades distintas, as coisas se dão em ritmo variado", diz Marcel.
Sem a verba, a dupla cogita arrumar emprego para bancar treinos. "Mas temos esperança. Merecemos", diz Marcel, que receberia R$ 2.500 mensais.
A burocracia, tida cansativa, mas necessária, pelos que lidam com a verba pública, não é exclusiva do Bolsa-Atleta.
Envolve a maior gama do dinheiro que vem do governo, tendo como ponto de partida o Ministério do Esporte, que distribui o orçamento de mais de R$ 1,4 bilhão entre seus programas (são seis, como o Bolsa-Atleta e o Segundo Tempo), suas secretarias (são três) e os comitês de candidatura (à Olimpíada e à Copa do Mundo).
Além do ministério, o esporte recebe aportes via Lei Piva, lei de incentivo fiscal e estatais.
Apesar de Orlando Silva Jr. responder pelo ministério, são outros atores que ditam o destino da verba. Na liberação para captação via incentivo fiscal, por exemplo, o martelo é batido por comissão rotativa com três membros da pasta e três do Conselho Nacional do Esporte.
Alcino Reis Rocha, 36, do ministério, preside o grupo. Inundado em calhamaços de projetos, o Esporte pediu ao Ministério do Planejamento 30 funcionários para a área (hoje tem menos da metade).
Só assim, diz Rocha, cumprirá a auto-imposta meta de publicar projetos aprovados em até 30 dias. Hoje, a demora supera dois meses. ""É muita coisa. Temos que ver se está tudo certo. E, para a lei "pegar", ir pessoalmente orientar atletas."
Até agora, pela lei de incentivo, foram aprovados para captação R$ 78.976.318. Um dos que mais se beneficiaram foi o São Paulo, com três projetos, que somam R$ 13 milhões, entre os 11 aprovados na primeira leva -coincidência ou não, dirigente do clube era da comissão na época da aprovação.
Outro setor-chave do ministério é a Secretaria de Esporte de Alto Rendimento, presidida pelo ex-nadador Djan Madruga. Estão sob sua responsabilidade desde o Bolsa-Atleta até o envio de atletas sem recursos para torneios no exterior e a promoção de eventos, como o Mundial de judô no Rio.
O secretário defende ações nas esferas municipal e estadual para a verba atingir diretamente o atleta. Admite que a União tem relação mais estreita com entidades nacionais.
""A preocupação é chegar ao atleta e ao técnico. Só quem está no topo da pirâmide obtém recursos. Percebemos isso e planejamos mudanças."
O governo também está presente nos grandes mecenas do esporte, as estatais. Juntas, Petrobras, Banco do Brasil, Eletrobrás, Caixa Econômica Federal, Correios e Infraero injetaram de 2004 até agora quase R$ 536 milhões, mais que duas vezes o valor da Lei Piva.
Graças ao dinheiro do BB, o vôlei cresceu, e o banco ganhou uma vitrine de marketing.
Fora da esfera governamental, o Comitê Olímpico Brasileiro, presidido por Carlos Arthur Nuzman, é agente poderoso. Nos bastidores, sugerindo, fazendo gestões, negociando, por exemplo, o modelo dos projetos de lei de incentivo via Petrobras -em captação com ajuda do governo, foi o maior beneficiado, com R$ 27 milhões para o período Pré-Pequim.
Na linha de frente, definindo o quinhão de cada confederação e o ritmo da entrega das verbas da Lei Piva às modalidades. O COB orienta como esse dinheiro, principal recurso para alguns, deve ser gasto e avalia as prestações de contas.
Já o controle de todo o processo está centrado em um órgão do governo, o Tribunal de Contas da União, que já privou dirigentes de tocar no dinheiro.


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