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No país, até evangélicos têm santo
MAIS COMUNS, "CATOPÍRITA" E "ESPIRITÓLICO" TAMBÉM ILUSTRAM A MISTURA DE CRENÇAS ENTRE FIÉIS
DA REPORTAGEM LOCAL
O médium espírita Chico Xavier (1910-2002) escreveu mais
de 400 livros, vendeu cerca de
30 milhões de exemplares e
provavelmente é um dos maiores responsáveis pela difusão
do "catopiritismo" e do "espiritolicismo". Os termos soam estranhos, mas ilustram o sincretismo religioso do Brasil.
"Catopírita" é o católico que
freqüenta um centro espírita e
tem uma certa simpatia pelo
conceito de reencarnação, segundo o qual as almas evoluem,
passando de corpo em corpo no
correr da eternidade. Mesmo
essa idéia sendo diametralmente oposta à ressurreição
cristã, onde a pessoa deve voltar à terra, a exemplo do que
ocorre com Jesus tal como relatado no Evangelho.
"Espiritólico" é o espírita que
freqüenta as missas católicas,
batiza os filhos na igreja.
Ao todo, 44% dos católicos
acreditam totalmente na reencarnação, número que cai para
15% entre os evangélicos pentecostais e chega a 93% entre os
que se declaram espíritas.
No Brasil, porém, é possível
crer nas duas coisas -81% dos
espíritas e 95% dos católicos
acreditam que Jesus ressuscitou após morrer na cruz. Em
compensação, 48% das pessoas
que se declaram espíritas possuem algum santo de devoção.
Mesmo 8% dos evangélicos
pentecostais, conhecidos pelo
fervor ao credo que se caracteriza, entre outros itens, por
condenar a adoração de imagens, têm um santo.
Ary Dourado, presidente da
Associação de Editoras, Distribuidoras e Divulgadores do Livro Espírita, afirma que os neologismos ajudam a explicar por
que 4 milhões de livros espíritas foram vendidos em 2006
ainda que os membros deste
credo não passem de 3 milhões,
segundo o censo de 2000. "Há
muitos fiéis de outras religiões
que freqüentam os centros espíritas", diz Dourado. "Até
mesmo pastores das igrejas
evangélicas, embora mais discretamente. Isso acaba gerando um interesse muito grande
pela doutrina espírita."
Embora o conceito de céu e
inferno não faça sentido para o
espiritismo, 39% dos seguidores de Allan Kardec (1804-1869) crêem no céu, mesmo número dos que crêem no inferno.
País católico
No interior da Paraíba, descendentes de judeus obrigados
a se converter ao catolicismo
nos primórdios do país são um
exemplo de sincretismo. Seus
antepassados criaram uma sinagoga disfarçada de Igreja Católica. Hoje, querem ser reconhecidos como judeus, mas enfrentam resistência na comunidade: não abrem mão de práticas associadas ao cristianismo.
Uma das explicações para os
brasileiros se apegarem a conceitos conflitantes com as religiões que dizem praticar está
relacionada à antiga proibição
de visibilidade pública a outros
credos que não o católico.
A primeira Constituição do
Brasil (1824) firmava o catolicismo como religião oficial. A
proclamação da República, em
1889, permitiu a liberdade religiosa, mas as conseqüências de
se ter uma religião oficial já estavam dadas. A não-adesão ao
catolicismo criava obstáculo à
ascensão social. Hoje, livres,
21% das pessoas que têm religião já mudaram de crença.
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(LEANDRO BEGUOCI)
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