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Análise
Brasil é o único gigante emergente com meta de redução de emissões
China e Índia só vão assumir compromissos ambiciosos, como necessita o planeta, se os países ricos avançarem muito
MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA
Constitui uma tarefa complexa comparar as metas nacionais de combate ao aquecimento global anunciadas nas
últimas semanas e meses. Mas
não é impossível, se o exercício
de numerologia for tomado
com um grão de sal. De toda
maneira, apesar da margem gigantesca de erro, é seguro afirmar que o Brasil é o único país
emergente importante a adotar metas comparáveis às de
países desenvolvidos.
São muitas as referências
empregadas, como anos-base
(1990, 2005, 2020). Dados oficiais também se referem a anos
desencontrados. Estimativas
de emissões atuais variam de
maneira selvagem. A burocracia da mudança do clima não
facilita a vida de ninguém.
No caso da China, podem-se
encontrar cifras tão díspares
quanto 6 bilhões e 8,6 bilhões
de toneladas de CO2-equivalente (unidade padronizada de
medida para gases do efeito estufa) para 2005. No caso dos
Estados Unidos, variam de
5,98 bilhões a 7,08 bilhões. Um
dos dois é o campeão de emissões, hoje, mas qual?
Para complicar um pouco
mais, há duas maneiras de
apresentar os compromissos.
Países desenvolvidos adotam
metas de corte absoluto, em
geral sobre os níveis de 1990
(os EUA são exceção, preferem
2005). Países emergentes, como China, Índia e Brasil, favorecem o chamado desvio de
trajetória: fazem promessas de
corte em relação àquilo que estariam emitindo no futuro, se
seguissem no ritmo atual.
Uma forma de tentar contornar as dificuldades é buscar
uma fonte com o máximo possível de dados uniformes. Uma
delas é a Edgar (sigla em inglês
de Base de Dados sobre Emissões para Pesquisa Atmosférica Global, mantida pela agência
ambiental holandesa, PBL).
Dela saíram as estimativas de
emissões em 2005 apresentadas na tabela acima.
No caso de Estados Unidos,
União Europeia, Rússia e Japão, os percentuais de comparação entre 2020 e 2005 já foram calculados pela mesma
PBL. Bastou aplicá-los aos totais de emissões. Para incluir
China, Índia e Brasil, a conta é
mais tortuosa.
China e Índia apresentaram
compromissos de redução de
intensidade carbônica, ou seja,
o CO2-equivalente emitido por
unidade do PIB. Respectivamente, cortes de 45% e 24% até
2020, no máximo. Foi preciso
estimar quanto cada um estaria emitindo em 2020, caso
mantenham a mesma intensidade de 2005, para então aplicar a meta de redução e chegar
à diferença percentual.
O caso brasileiro é especial
em três aspectos. Primeiro, por
ser o único da tabela em que os
dados de emissões incluem
mudanças do uso da terra (leia-se: desmatamento). Como a
destruição de florestas representa mais da metade das
emissões e das metas de redução nacionais, tal contribuição
-que não pesa tanto no perfil
de outros países- não podia
deixar de ser computada.
O Brasil se destaca dos companheiros de Bric, em segundo
lugar, por ter acabado de anunciar um inventário com as
emissões de 2005. Ainda que
preliminar, é um dado oficial, e
não um chute: 2,2 bilhões de
toneladas de CO2-equivalente.
Mais do que Índia e Japão.
Apenas 11 dias antes, o governo federal havia anunciado
a intenção de reduzir entre
36% e 39% o que se projeta como emissões de 2020 (2,7 bilhões de toneladas). Em números redondos, chegar a 1,65 bilhão de toneladas, ou 25% menos que em 2005.
É um compromisso comparável ao da União Europeia
(-24%), além de bem mais ambicioso que o dos EUA (-17%).
A terceira peculiaridade brasileira é o fato de suas metas serem muito melhores que aquelas com percentuais alarmantes de crescimento líquido sobre 2005 embutidos nas propostas chinesa e indiana (120%
e 73%, respectivamente).
Impasse político
Já se calculou que, para não
ultrapassar o aumento da temperatura média global de 2C,
considerado perigoso, a emissão de CO2 em 2020, no mundo
todo, precisa cair para 44 bilhões de toneladas. Mais da
metade disso estará sendo lançado só pela China e pela Índia,
duas das nações mais pobres,
mais populosas e que mais
crescem no mundo.
O Brasil tem a gordura do
desmatamento para queimar.
Eles, não. Só vão ceder mais
que isso, como necessita o planeta, se os países ricos também
avançarem muito em suas próprias metas de redução, em
fundos para financiar ações de
mitigação e adaptação nos países pobres e na cessão de tecnologias para permitir-lhes
uma guinada urgente na trajetória de desenvolvimento.
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