São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2006

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Patrícia Chalaça

Arquiteta constrói novo significado para abrigo

Reformas melhoram dia-a-dia de crianças que vivem longe da família

GABRIELA ROMEU
ENVIADA ESPECIAL A RECIFE (PE)

Era uma casa com chão quebrado, goteira no teto, parede manchada _de engraçada, não tinha nada. Ninguém devia morar ali, mas, no lugar, cada colchão abrigava uma criança.
É a Casa de Carolina _e também de João, Marcelo, Ana, Rita, entre tantos outros meninos e meninas que compartilham quarto, dividem roupas e disputam colo em um abrigo público de Recife (PE). Todos vivem ali, longe da família.
O termo abrigar, usado aqui como sinônimo de "acolher e proteger", segundo definições do Aurélio, ganhou outro significado no dicionário da arquiteta Patrícia Chalaça, 36, presidente do Projeto Casa da Criança, que promoveu uma transformação naquela moradia. "Abrigar significa ‘carinho’. Melhor, ‘carinho de mãe’", diz.
E essa palavra foi a mola propulsora do nascimento da Casa da Criança, em 1999. O sonho de acolher meninos descalços surgiu na infância de pés no chão na praia de Maracaípe, em Pernambuco, quando brincava com filhos de pescadores.

Conflitos
"Algumas coisas me conflitavam: por que eu tinha uma vida tão diferente da daqueles meninos que dividiam o dia entre vender ‘casquinho’ [feito do crustáceo aratu] à beira-mar e caminhadas de quilômetros até a escola?" Na infância abastada, ao circular pelas ruas de Recife no carro guiado pelo motorista particular da família, não deixou de "olhar o que ocorria do outro lado da janela".
Fez mais: abriu a porta para ver como era lá fora. E encontrou a Casa de Carolina, com quase cem crianças. Então, reuniu arquitetos, engenheiros, pedreiros, decoradores e empreiteiros. Buscou cimento, pedra, cal, tijolos, tinta, azulejo. Mobilizou mais de 500 empresas. Em 45 dias de trabalho intenso, reformou o abrigo.
"Parece utopia, mas reformamos a casa sem um real no banco. E é assim até hoje".
Da Casa de Carolina para cá, durante sete anos, sua arquitetura social mudou 28 instituições em 15 Estados e no Distrito Federal. Com olhar brilhante, Patrícia fala apressadamente sobre projetos que planeja
realizar. À noite, quando o sono chega, os sonhos continuam à espreita. "Sonho que estou voando de verdade e, lá embaixo, vejo tudo o que vou concretizar", diz. "É, ela consegue voar", bem define o companheiro, o arquiteto Marcelo de Souza Leão, 36.


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