São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2006

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Maria Teresa Leal

Com artesãs, socióloga tece renda na Rocinha

Cooperativa abastece a alta-costura nacional e a estrangeira

ANDRESSA ROVANI
ENVIADA ESPECIAL AO RIO DE JANEIRO

Do alto de um dos morros cariocas mais conhecidos do país, uma socióloga observa o mundo. Apesar de ter a seus pés uma das mais cobiçadas paisagens brasileiras, é para dentro da favela que ela se volta. E seus olhos, diz ela, "são enormes". "Quando eu tinha seis, sete anos, era freqüente faltar água no Rio. Então eu ia com meu pai a uma fonte próxima da Rocinha. Me encantei com o lugar", conta Maria Teresa Leal, a Tetê, 49. E o lugar se encantou com ela, pois logo a acolheu e lhe deu confiança.
Se foi a deficiência no abastecimento de água da década de 60 que apresentou uma à outra, foi Paulo Freire quem as uniu, literalmente. "Quando li seus textos, vi que o que eu queria fazer teria de ser naquele momento. Era a hora da virada", lembra Tetê, que, já estudante de ciências sociais, trocou as aulas que dava em Ipanema pelo voluntariado na favela.
São 19 anos à frente da Coopa-Roca, cooperativa na qual cem artesãs da favela da Rocinha mostram técnicas artesanais para abastecer a alta-costura nacional e a estrangeira.

Deus e o diabo
"Sou a linha de frente, monto estratégias, busco parceiros e eventos para dar visibilidade para a Coopa-Roca", conta. Se suas tarefas estão bem definidas, a forma como é vista pelas próprias cooperadas é flutuante: "Sou deus e diabo. Se, de um lado, articulo o grupo, do outro, sou eu quem fala: ‘Não está certo, refaça’. Fico transitando no imaginário delas, mas acho saudável", afirma, rindo.
"Quando a artesã entende o sistema de cooperativa como um todo, compreende o papel dela. Sem isso, não conseguimos trabalhar prazos, escala e excelência. Na qualidade dessa relação se constrói o sucesso institucional e produtivo", diz.
Hoje, o maior desafio de Tetê é delegar a aprovação dos protótipos que serão feitos pela cooperativa _que, por serem os grandes desencadeadores do negócio, convencem e conquistam o parceiro.
"Estética não é algo que se constrói de uma hora para outra. É preciso lapidá-la, e não gostaria de ter alguém de fora da Rocinha fazendo isso". Para treinar o olhar, as cooperadas visitam exposições e traçam novas referências. Parte do sucesso Tetê espera ver realizada em breve. "Um sonho meu é que Karen Nicol, do Royal College of Art, a papisa do bordado na Inglaterra, venha para cá. Trará muito conhecimento técnico para as artesãs. Queremos virar um centro de excelência internacional em técnicas artesanais".


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