São Paulo, domingo, 16 de setembro de 2001

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SOLIDARIEDADE

Telefonistas ficaram até 20 minutos na linha para acalmar quem procurava parentes

Embratel vira "CVV" de familiares

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

O drama das famílias brasileiras que buscavam desesperadamente por notícias de parentes nos Estados Unidos, depois do ataque terrorista da última terça-feira, emocionou uma categoria que, usualmente, é associada à frieza e ao distanciamento: os telefonistas internacionais.
No dia dos atentados ao Pentágono e ao World Trade Center, 520.344 pessoas tentaram ligar do Brasil para os Estados Unidos, via Embratel, mas só 17% delas tiveram êxito. O tempo de espera para completar uma ligação para o exterior, com auxílio de telefonista, foi de sete horas, um fenômeno nunca visto até então.
Quatro telefonistas internacionais da Embratel relataram à Folha as situações mais dramáticas testemunhadas por eles no dia do atentado. ""Muitos de nós choravam quando conseguíamos colocar os parentes na linha", disse a telefonista Cátia Nascimento.
No atendimento rotineiro, esses funcionários dedicam, em média, dois minutos para cada cliente. No dia do atentado, as normas de procedimento foram para o espaço. Os telefonistas contam que bancaram os psicólogos em muitas situações e que ficavam até 20 minutos na linha acalmando os mais nervosos.
A telefonista Flávia Luiza Máximo, que tem cinco anos de experiência na função, conta que se emocionou quando uma mulher de São Paulo conseguiu localizar a filha que vive em Boston e é comissária da United Airlines.
Por orientação da Embratel, os funcionários não podem revelar os nomes nem os telefones das pessoas citadas.
Flávia diz que a mulher contou que a filha deveria estar na tripulação do avião que foi arremessado contra a torre do World Trade Center. Depois de muitas horas de tentativa, a ligação foi completada e a aeromoça contou que havia escapado da tragédia porque estava com dores nas pernas e foi substituída por uma colega.
""Minha amiga morreu no meu lugar", teria dito ela à mãe, que voltou a ligar para a telefonista para contar que estava tudo bem.

Apreensão
Flávia lembra de uma outra ligação, no dia seguinte ao atentado, que a deixou apreensiva: ""Uma voz com sotaque árabe pediu uma chamada pessoa-a-pessoa para os Estados Unidos. É um tipo de serviço em que a chamada só é completada se a pessoa indicada estiver na linha. Depois de relutar em atender, um homem, também com sotaque árabe, disse algumas palavras e desligou. Não me pareceu uma ligação usual", disse a telefonista.
Ela admite que sua reação pode ter sido influenciada pela suspeita de que o atentado tenha sido praticado por árabes.
Cátia Nascimento, que também tem cinco anos de experiência como telefonista internacional, lembra da ligação desesperada de um homem que suspeitava que o pai pudesse estar soterrado em Manhattan, pois tinha uma reunião marcada no World Trade Center. Depois de muita expectativa, o pai foi localizado, na madrugada de terça-feira, em um hotel no Reino Unido, pois havia adiado a viagem para os Estados Unidos. ""Nós três choramos ao telefone", conta a telefonista.

Convencer
Rafael Russo conta o drama de uma mulher que procurava insistentemente pelo pai em Nova York. ""Como eu conheço bem a cidade, consegui convencê-la de que ele estava seguro", relata.
Houve também a história da família que, em prantos, procurava notícias da mãe, que deveria estar em um hotel em Manhattan. O telefonista conseguiu ligar para um telefone vizinho, mas a pessoa do outro lado recusava-se a cruzar a rua para chamar a brasileira. Depois de muitas tentativas, o contato foi feito.
As ligações para os Estados Unidos só começaram a se normalizar a partir de quarta-feira, quando 55% das 400 mil ligações foram completadas.
Na sexta-feira, o índice já atingia 65% -considerado normal pelas empresas.



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