São Paulo, Quinta-feira, 18 de Março de 1999
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MAL EXIBIDO
Número de ingressos de cinema vendidos no país cai de 212 milhões para 70 milhões em 20 anos
Crise econômica e novas tecnologias achatam mercado

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
da Reportagem Local

O principal mercado de filmes norte-americanos são os Estados Unidos. O de europeus, a Europa. O de brasileiros, o Brasil. Começa aí o primeiro grande gargalo do cinema nacional: a exibição.
Voltemos a 1978. Nesse ano foram vendidos quase 212 milhões de ingressos no país -61,9 milhões para filmes nacionais (29,2%).
Cheia de volúpia, Sônia Braga, em "A Dama do Lotação", de Neville d'Almeida, foi a grande atração da produção brasileira, num mercado que contava com 2.973 salas cadastradas em todo o país.
Em termos absolutos, foi o melhor ano do cinema nacional, mas já se iniciara o declínio do mercado. Em 1975, o país contava com 3.276 salas -foram vendidos 275,4 milhões de ingressos (17,7% para filmes brasileiros).
Em 1998, ano da chegada ao mercado de "Central do Brasil", o número de salas de exibição no país era estimado em 1.300.
Apesar do megassucesso de "Titanic" (visto por 16,4 milhões de pessoas no país), estima-se em apenas 70 milhões o número de ingressos vendidos nesse ano.
Com a desestruturação dos órgãos governamentais do setor, não há dados precisos. As informações hoje em dia ou vêm dos exibidores e distribuidores ou de empresas privadas de assessoria especializadas no setor, como a Filme B, do cineasta Paulo Sérgio de Almeida.
O governo inicia este ano a implantação, associado aos exibidores, de um sistema informatizado, chamado Sicoa (Sistema de Informatização e Controle de Obras Audiovisuais), que deve aprimorar a coleta de informações desse mercado.

TV e vídeo
Como dizem os números, o mercado de filmes sofreu com a crise da dívida externa, no início dos anos 80, se desorganizou com a inflação galopante do governo José Sarney (85-90) e praticamente acabou com o governo Fernando Col- lor de Mello (90-92).
Enquanto o preço do ingresso crescia em termos reais (subindo, já contada a inflação do dólar, de US$ 1,33, em 1971, a US$ 4,23 em 1998), o número de espectadores de cinema, qualquer que fosse a sua origem, caía.
Em 1997, no fundo do poço do mercado, apenas 52 milhões de ingressos foram vendidos -ou seja, menos gente foi ao cinema para assistir a filmes nacionais e estrangeiros nesse ano do que em 78 somente para ver filmes nacionais.
Mas não se pode atribuir esse declínio exclusivamente aos altos e baixos da economia brasileira.
Nos anos 80, houve a disseminação da TV colorida e a chegada do videocassete doméstico.
Aliadas à crise, essas novas tecnologias ajudaram a afastar o público de cinema -e, consequentemente, a provocar um declínio do número de salas de exibição.
O cinema brasileiro que tenta agora se reerguer (e que, em 99, vai especialmente bem, representando 22% dos 12,4 milhões de ingressos vendidos até o fim de fevereiro) tem de enfrentar esse problema -a falta de espaço no seu maior mercado (onde, aliás, já é uma espécie de "sócio minoritário").
Como todo o mercado diminuiu, não bastaria o cumprimento ou a extensão da lei que obriga exibição de filmes nacionais por 49 dias por ano em cada cinema.
O grande problema hoje não se trata tanto de conquistar mercado quanto de criar (ou recriar) um.
Em especial no interior do país: se, no ano mítico de 1975, havia 2.701 salas fora das capitais, desde 1989 esse dado nem sequer é contabilizado.


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