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Volume de novas produções sinaliza falsa prosperidade
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
A Folha fez um levantamento
dos filmes brasileiros que vêm por
aí e chegou a números surpreendentes: pelo menos 34 longas-metragens nacionais estão em produção, e 19 estão prontos para ser lançados. Outros 40 encontram-se em
fase de captação de recursos ou
pré-produção.
Mas cineastas e produtores alertam que esses números podem dar
uma falsa imagem de prosperidade distante da real situação da indústria cinematográfica no país.
Ao que tudo indica, muitos dos
filmes em produção enfrentarão
graves dificuldades para ser concluídos. Supondo que todos fiquem prontos, dificilmente haverá
espaço para todos no mercado exibidor, ocupado quase totalmente
pela produção estrangeira.
O diretor Guilherme de Almeida
Prado (de "A Hora Mágica") resume a situação numa frase: "O cinema brasileiro sempre flutuou de
acordo com a moeda e a auto-estima do brasileiro, e estou prevendo
uma tremenda queda dos três".
A recente desvalorização do real
agravou situação que já era ruim.
A captação de recursos para o cinema via Lei do Audiovisual caiu
de quase R$ 80 milhões, em 97, para menos de R$ 40 milhões em 98.
Os motivos: a recessão econômica, a privatização das estatais (tradicionalmente, as empresas que
mais investem no cinema) e a pequena visibilidade alcançada pelos
filmes (com poucas exceções, como "Central do Brasil" e "O Quatrilho"), o que provoca desinteresse de patrocinadores em potencial.
O mais importante cineasta do
país, Nelson Pereira dos Santos,
encontra dificuldades para captar
recursos para "Guerra e Liberdade: Castro Alves em São Paulo".
"Refiz o plano do filme, baixando o orçamento de R$ 7 milhões
para R$ 5 milhões, mas mesmo assim não consegui quase nada",
disse o diretor à Folha. "Tenho
participações garantidas da TV
francesa e de uma produtora portuguesa, mas estão condicionadas
a um aporte substancial no Brasil."
Outra vítima da carestia reinante
é o cineasta Sérgio Bianchi, que
não tem recursos para finalizar e
lançar "Cronicamente Inviável".
"As estatais não dão mais dinheiro
para filmes. Preferem investir em
restauração de edifícios tombados,
em construção de espaços culturais etc." Um exemplo disso é o Banespa, que investiu R$ 14,5 milhões em cinema em 97 e apenas
R$ 5,8 milhões em 98.
A produtora Mariza Leão (de
"Guerra de Canudos") diz que a
crise afetou seus dois próximos
projetos, "Amores Possíveis", de
Sandra Werneck, e "Quase Memória", de Ruy Guerra. Ela refez o orçamento dos dois e teve de adiar de
abril para junho o início das filmagens do primeiro. Segundo Mariza, a desvalorização do real ameaça produções porque a principal
matéria-prima -a película cinematográfica- é cotada em dólar,
assim como os equipamentos.
Sylvio Back, que finaliza o longa
"Cruz e Souza - O Poeta do Desterro", está com dois projetos empacados: o documentário "Véu de
Curityba" (do qual já tem 50 minutos montados) e o drama "Lost
Zweig", sobre os últimos dias do
escritor austríaco Stefan Zweig,
que se matou em Petrópolis (RJ)
em 1942. Para Back, um dos problemas mais graves das atuais leis
de incentivo é que elas favorecem a
dispersão de recursos de cada empresa num sem-número de projetos (para multiplicar a visibilidade
de sua marca), o que leva à dificuldade de cada produção completar
seu orçamento.
Outro efeito negativo dos mecanismos de captação -que entregam à iniciativa privada a decisão
sobre onde investir- é, segundo
cineastas e produtores, uma censura velada a determinados temas.
A produtora Sara Silveira dá como exemplo a dificuldade de captar recursos para "Madame Satã",
de Karin Ainouz, "história de um
marginal drogado e homossexual". Sylvio Back diz ter encontrado empresas que não quiseram
dar dinheiro para "Lost Zweig"
por não querer associar sua marca
a "um personagem judeu e, ainda
por cima, suicida".
Também Sergio Bianchi credita
ao caráter polêmico de seu filme
("que vai contra o otimismo oficial") os problemas enfrentados.
Talvez como resultado da necessidade de agradar aos investidores,
entre os novos filmes predominam
as adaptações de obras literárias
clássicas ou as biografias de personagens respeitáveis da história.
Mas a grande questão que inquieta hoje o meio cinematográfico nacional é o gargalo da distribuição e da exibição.
"Nossos filmes ficam confinados
aos Espaços Unibanco", diz Sara
Silveira. "Os três últimos longas
que lancei -"Ação entre Amigos",
"Alô" e "A Hora Mágica'- não tiveram, juntos, mais do que 80 mil espectadores."
Para Nelson Pereira dos Santos,
um modo de atacar o problema seria o Estado adotar políticas indiretas de estímulo à exibição, incentivando a criação de salas e o barateamento do ingresso.
Almeida Prado defende "uma regulamentação que dê início à formação de um mercado" e "acorde
o público em potencial que temos", já que não é cumprida a lei
de obrigatoriedade, que exige que
cada cinema exiba filmes nacionais durante 49 dias do ano.
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