São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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PAN - Rio 2007

Arqueologia - São Paulo - 1963

No Pan e na raça

Papagaio viabiliza Jogos de 1963, que fez uso de arenas esportivas já existentes em São Paulo e nasceu sob signo do improviso

EDGARD ALVES
MARIANA BASTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"Precisava de mais uma assinatura e eu, que não tinha um tostão, também assinei com eles." Foi graças a uma canetada de Pedro Barros Silva, 89, um dos dirigentes remanescentes do COE (Comitê Organizador e Executivo do Pan de 1963), que o projeto dos Jogos de São Paulo ganhou corpo e conseguiu sair do papel.
O Pan-Americano realizado na capital paulista, de 20 de abril a 5 de maio de 1963, seguiu à risca o preceito do amadorismo, então vigente.
Estava tudo parado desde 1959, quando o Brasil conquistou o direito de sediar os Jogos. Um "papagaio bancário", como se costumava denominar a tomada de empréstimo em banco, alavancou a empreitada.
As outras assinaturas para levantar a verba saíram dos punhos do major Sylvio de Magalhães Padilha, presidente do COE, e do almirante Paulo Meire, tesoureiro do COB (Comitê Olímpico Brasileiro).
O governador Adhemar de Barros avalizou o empréstimo, e o prefeito Prestes Maia incentivou. As duas esferas de governo financiaram o Pan.
"Além disso, confiamos no apoio do povo", completa Barros Silva, que chefiou a secretaria executiva da Comissão Técnica do Pan. Em 63, São Paulo tinha 4,5 milhões de habitantes (hoje, conta com cerca de 11 milhões). Metade era jovens com menos de 21 anos.
Liberado o dinheiro (é desconhecido registro oficial), foi montado o organograma. O major Padilha (ex-atleta olímpico e, depois do Pan-63, presidente do COB pelos 27 anos seguintes) era o diretor do Defe (Departamento de Educação Física e Esportes), que organizava o setor no Estado.
Padilha acionou integrantes do órgão, cuja rede organizava os Jogos Abertos do Interior.
"Os funcionários recebiam seus salários normais, mas, no Pan, gastava-se do bolso também", afirma Barros Silva.
O relatório do COE após o Pan apontou que havia um ceticismo quanto à organização.
"Assim, os Jogos Pan-Americanos não foram edificados em quatro anos, mas apenas em 150 dias. A Vila Pan-Americana surgiu como que por encanto. Na sua construção e na reforma de praças desportivas, trabalhou-se dia e noite. Nos planos de transportes e na edificação de serviços auxiliares, foi necessário um esforço desdobrado", registra o relatório.
O trabalho da organização foi recompensado, e o Pan rendeu lucros. Com a "sobra de receita" do Pan de 63, o COB montou sua antiga sede, adquirindo salas no prédio 156 da avenida Rio Branco. A rua é uma das principais do centro do Rio.
Parte da sucesso financeiro se deve ao fato de que São Paulo usou arenas já existentes, o que amenizou os custos.
Espaços públicos que já haviam sido erguidos na época abrigaram 60% das competições dos 19 esportes programados. O Complexo Esportivo do Pacaembu foi o local mais utilizado. Lá ocorreram disputas de atletismo, boxe, futebol, judô, lutas, natação e parte das competições de hipismo.
Os clubes privados tiveram um peso muito maior em São Paulo-63 do que terão no Pan do Rio. Arenas particulares ficaram com 30% dos esportes.
Os clubes também foram sede parcial de 10% dos esportes. São Paulo só não teve condição de abrigar o pentatlo moderno, programado na Aman (Academia Militar de Agulhas Negras), em Resende (RJ).
Só a Vila Pan-Americana, o atual Crusp (Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo), teve a sua construção respaldada pelos Jogos.
De acordo com João Roberto Leme Simões, arquiteto e professor livre-docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, o projeto inicial do Crusp é de 1935, mas só tomou corpo em 1962, época em que a cidade se preparava para o Pan.
"Nós tínhamos o projeto e o local. O Pan foi o impulso para a construção do Crusp. O governo bancou, e o projeto saiu do papel. Dinheiro é a mola do mundo. Sem dinheiro não se faz nada. O Pan caiu do céu", afirma Simões, que trabalhou, durante cinco meses, cerca de 16 horas por dia na construção.
O projeto inicial, assinado por Eduardo Kneese de Melo, Joel Ramalho e Sidney de Oliveira, previa que o conjunto residencial deveria ser construído em três anos, mas os engenheiros, comandados por Paulo Camargo, tiveram só cinco meses para finalizá-lo.
Simões diz que, depois de Brasília, inaugurada em 1960, a cidade universitária passou a ser o grande canteiro nacional de obras. "Quando o primeiro atleta entrava na Vila, nós ainda limpávamos as instalações."
A Vila contava com seis blocos, um restaurante e uma unidade de recepção e abrigou 1.665 atletas de 22 países.
São Paulo-63 foi o Pan com melhor performance da equipe brasileira na classificação geral. O país ficou na segunda colocação no quadro de medalhas, somando 14 de ouro, 20 de prata e 18 de bronze.


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