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O município terá de 'exportar' lixo?
Com investimento privado, dois novos aterros ainda poderão absorver resíduos
da cidade por 30 anos; concorrência feita pela prefeitura prevê também construção
de incineradores e educação ambiental
DA REPORTAGEM LOCAL
O futuro das cerca de 14 mil
toneladas de lixo produzidas diariamente em São
Paulo -12 mil delas só de resíduos domésticos- pode estar garantido pelos próximos 30 anos.
Mas, depois disso, mesmo com
40% de redução no que vai para
os aterros, as alternativas de deposição acabam, e a capital terá de
buscar soluções metropolitanas
-acordos com cidades vizinhas- para resolver o problema.
E esse é o cenário otimista. Caso
a concessão dos serviços de limpeza pública atrase ou não saia, o
quadro pode ser mais sombrio.
Isso porque a concessão prevê
desarmar algumas "bombas-relógio" que, se explodirem, podem
trazer o caos para a cidade, alerta
a professora Wanda Maria Risso
Günther, da Faculdade de Saúde
Pública da USP, que desde 1986
estuda a gestão do lixo.
Quem vencer a concorrência
promovida pela prefeitura terá de
implantar dois novos aterros sanitários. Aos atuais Bandeirantes
(zona norte) e São João (zona leste) restam três anos de vida útil,
segundo o secretário de Serviços e
Obras, Osvaldo Misso.
As concessionárias terão ainda
de instalar duas novas usinas de
compostagem, cuja meta é reduzir em 20% o lixo que vai para os
aterros. A única usina em funcionamento hoje, a de Vila Leopoldina (zona oeste), produz um pré-composto que pouca gente quer
comprar, exigiu uma série de investimentos para minimizar o
mau cheiro que afeta os vizinhos e
trata só 1.200 t de lixo por dia.
Caberá também às concessionárias implantar a coleta seletiva
de porta em porta em toda a cidade, o que deverá aumentar o volume de recicláveis que chegam às
centrais de triagem operadas por
ex-catadores. Sem ela, será difícil
reduzir em 10% o que vai para os
aterros -meta conservadora da
prefeitura, já que cerca de 30% do
lixo doméstico é reciclável, e a
percentagem tende a crescer.
Outra contribuição importante
será o investimento de cerca de
R$ 3,6 milhões anuais em educação ambiental. Dos R$ 450 milhões que as empresas receberão
por dez anos de concessão, 8%
deverão ir para essas atividades,
que hoje deixam muito a desejar,
segundo especialistas.
"A abrangência do projeto de
coleta seletiva será determinante.
Ela passa fundamentalmente pela
informação e orientação da população", diz Elisabeth Grimberg,
do Instituto Polis e coordenadora-geral do Fórum Lixo e Cidadania da Cidade de São Paulo.
Outro ponto previsto na concessão é a provável instalação de
equipamentos como incineradores, "fornos" de plasma e de pirólise (tratamentos térmicos a altíssimas temperaturas). Eles seriam
responsáveis pela redução de 10%
no lixo que é aterrado, mas são
polêmicos -embora defendidos
por especialistas como Risso e Pedro Roberto Jacobi, vice-presidente do Procam (Programa de
Pós-Graduação em Ciência Ambiental, da USP), são malvistos
por ambientalistas e Grimberg.
Todas as soluções citadas são
caras e, sem a entrada das concessionárias, a prefeitura não conseguirá tirá-las do papel, diz Misso.
Pós-consumo
Mesmo que a concessão seja liberada pelo Tribunal de Contas
do Município até o fim do mês
(condição para que siga seus prazos originais), ela ainda não atacará um problema básico na gestão
do lixo: a redução na geração.
Isso só se consegue, dizem Risso, Jacobi e Grimberg, com uma
política de responsabilidade pós-consumo, que obrigue a indústria
não só a usar métodos ambientalmente amigáveis de produção e
embalagens recicláveis, mas também a fazer a sua parte na destinação correta dos produtos que põe
no mercado.
Isso depende de lei federal. Todos cobram a Política Nacional de
Resíduos Sólidos, cuja não-votação pelo Congresso dá uma idéia
da força do lobby contra a responsabilização do setor produtivo.
"O lixo sempre foi o "primo pobre" do saneamento básico. Foi o
último a ser visto como importante, inclusive para a saúde pública. Essa visão vem sendo alterada, mas as preocupações ainda
são bastante recentes", resume
Arlindo Philippi Jr., coordenador
científico do Núcleo de Informações em Saúde Ambiental da USP.
(MARIANA VIVEIROS)
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